Jareth: Fiz isso tudo por você! Eu estou exausto de viver para satisfazer suas expectativas.
(Labirinto)
A pizza chegou, interrompendo meus pensamentos. Comi duas fatias, guardei o resto no forno, peguei um copo
de Coca Zero e fui pro meu quarto, antes de meus pais chegarem e descobrirem que eu não tinha ido à festinha da
Juju pra ficar dormindo.
Fiz a cama, tirei a camisola e comecei a catar a minha roupa do chão. Peguei meu vestidinho e estendi na minha
frente. Olhei para ele um pouquinho e aproximei do meu nariz, para ver se estava com cheiro de cigarro. Estava
com cheiro de perfume. Um perfume que não era o meu.
Absorvi o cheiro com mais intensidade, deitei na minha cama abraçada com o vestido e deixei que aquele
perfume me levasse de volta para a noite passada.
A festa, independentemente de eu estar gostando ou não, estava animada. Parecia até que a nossa sala era
superunida, todas as pessoas dos grupinhos que normalmente são fechados e não se misturam estavam sociáveis,
todo mundo conversando com todo mundo, o pessoal da outra sala veio quase todo... realmente ali só faltava o Leo.
E não era só eu que estava sentindo falta, ouvi umas três pessoas comentarem que não o estavam vendo. Eu não
queria contar que ele tinha tomado recuperação e muito menos que estava deprê por causa disso. Isso era coisa
dele, eu não tinha direito de contar pra todo mundo.
A Natália, depois que meu celular acabou a bateria, só faltou me bater. Ela falou que eu faço tudo errado, que eu
tinha que ter dito que se ele não viesse eu iria embora também, ou então que iria lá na casa dele e ficaria parada
na porta até ele resolver vir. Ela falou também que eu devia ter falado o que a Vanessa estava aprontando,
inclusive insistiu pra eu pegar o celular dela e ligar de novo pra ele e falar essas coisas, mas eu falei que de jeito
nenhum, que o fato da minha bateria ter acabado tinha sido um sinal para eu não fazer nada disso!
Ela ficou meio brava. Falou que era por isso que eu não ficava com ninguém, que eu nunca demonstrava o que
eu sentia, que os meninos acabavam me tratando como amiguinha porque era essa a impressão que eu passava pra
eles! Eu disse pra ela que não tinha nada a ver, que eu já tinha ficado com um monte de meninos (ok, não um
monte, mas eu não ia admitir isso pra Natália) e que era pra ela parar com essa bobeira, porque realmente eu era
amiguinha do Leo, nada mais do que isso, e que era exatamente desse jeito que eu queria que ele me visse.
Ela ia falar mais alguma coisa, mas nessa hora o Mateus apareceu. A cor que a Gabi ficou quando viu o Cláudio
não foi nada se comparada à da Natália. Primeiro ela ficou branca, eu achei até que ela fosse desmaiar. Depois
passou pra rosa choque, vermelha, amarela... quando eu achei que fosse ficar meio verde, ela saiu correndo, falou
que precisava ir ao banheiro dar uma olhada na aparência antes que o Mateus a visse.
Resolvi tomar alguma coisa. Fui até o bar que a comissão organizadora tinha improvisado na cozinha da casa e
pedi um refrigerante. A Renata, uma das meninas da comissão que estava tomando conta do bar nesse momento,
me falou que ela estava proibida de servir refrigerante puro. Que só serviria se fosse misturado com vodka!
Eu fiquei meio admirada, comecei a entender a razão da desinibição dos meus colegas e perguntei o que ela
tinha sem álcool. Ela falou que nada, que se eu quisesse água teria que beber da torneira do banheiro. Minha
vontade foi de virar as costas e não tomar nada mesmo, mas eu estava realmente sem graça de ficar andando pela
festa sem rumo, meio sem saber onde colocar as mãos... ter alguma coisa para segurar pelo menos resolveria este
problema e também me daria uma aparência menos antissocial. Aceitei então a Coca com vodka e fui achar um
lugar pra sentar, sem tomar nem um golinho. Depois da festa de bodas de prata dos pais da Gabi, fiquei meio com
trauma de álcool...
Sentei em um banquinho que estava desocupado perto da pista de dança e comecei a prestar atenção nas
pessoas dançando. De repente o DJ deu uma virada e a próxima música foi uma lenta. Algumas pessoas fizeram:
“Uhhhh”, outras: “Ehhhh”, a iluminação ficou mais escura, e a pista esvaziou, mas vários casaizinhos começaram a
dançar. Achei muito engraçado, estava parecendo uma daquelas festinhas de quando a gente tinha 10 anos, que a
hora da música lenta era a hora mais esperada e mais sofrida ao mesmo tempo. Se o menino te chamasse pra
dançar você morria de vergonha de aceitar. Se ninguém chamasse, você se sentia a pessoa mais feia da face da
Terra!
Eu estava vendo o pessoal dançar e de repente ganhei companhia. O Rodrigo e a Priscila vieram sentar do meu
lado. De repente, o Rodrigo falou: “Nossa, essa menina é cara de pau mesmo, né?”.
Eu olhei na direção que ele estava olhando e vi a Vanessa dançando na outra ponta com um menino mais velho,
que com certeza não era do colégio. Devia ser o do tal do filho do amigo do pai dela.
Fiquei pensando em como esse mundo é injusto! A Vanessa tem namorado, não só um namorado qualquer, mas o
Leo, e por um motivo qualquer esse namorado resolve não ir a uma mísera festa e o que ela faz? Ela estala um
dedinho e no mesmo momento já aparece outro cara pra encher a bola dela! E quanto a mim? Não só não tenho
namorado como não tenho ninguém pra ligar para massagear meu ego – e mesmo que eu tivesse, minha timidez
não permitiria – e ainda por cima minhas amigas estão todas arrumando namorados, o que faz de mim uma
encalhada, uma vela, uma chata que atrapalha os programas dos casais e de quem todo mundo quer distância!
De repente, reparei que eu estava encarando a Vanessa e o par dela. Ela viu que eu estava prestando atenção e
começou a fazer uma ceninha, provavelmente com o intuito de provocar ciúmes no Leo, achando que eu fosse
contar tudo para ele depois. Ou então a intenção dela era simplesmente me provocar inveja, o que eu não posso
dizer que não funcionou um pouquinho.
Ela estava dançando realmente agarrada com o menino. Falava alguma bobeira no ouvido dele, ele ria e
segurava a cintura dela mais forte, aí ela passava a mão pelas costas dele, ele apertava ainda mais... uma
indecência, se quer saber a minha opinião!
O Rodrigo, de repente, falou: “Ixe, é agora que a porca torce o rabo!”, e eu fiquei sem entender por meio
segundo, até que vi o Leo chegando, olhando fixamente pra pista de dança.
Nesse momento, a música lenta terminou, e a próxima foi uma popular, bem agitada. A pista começou a ficar
cheia de novo e a Vanessa desgrudou do menino, mas os dois não paravam de sorrir um pro outro, sem perceber o
que estava se passando em volta. Eles começaram a caminhar para um dos sofás, quando o Leo parou na frente
deles.
Não era só eu que estava olhando dessa vez, metade da festa estava querendo ver o que iria acontecer. Eu não
sabia se estava com vergonha pela Vanessa, com pena pelo Leo ou com alegria por mim mesma, por finalmente o
Leo ter visto que aquela menina não prestava!
Como a Vanessa não disse nada, o Leo a cumprimentou, bem sério, e ficou esperando pra ver o que ela tinha a
dizer. Ela ficou mais séria ainda, se virou pro menino do lado e falou: “Rafa, esse é o Leo, um colega da minha
sala”.
O Leo fez uma cara admirada, acho que na verdade todo mundo fez a mesma cara que ele, e aí ele falou,
levantando uma sobrancelha: “Colega?”.
Pela primeira vez na vida eu vi a Vanessa sem graça. Ela se virou de novo pro menino, que estava meio sem
entender o que estava rolando, e perguntou se ele podia pegar uma bebida pra ela, enquanto ela resolvia um
probleminha ali. Ele foi, mas pela cara dava pra ver que não estava muito contente.
A Vanessa, então, sem se preocupar nem um pouco de estar sendo o centro das atenções, falou: “Leo, é o
seguinte, você falou que não ia vir à festa. O que você queria, que eu ficasse em casa também, que nem uma boba
perdedora?”.
O Leo retrucou sem nem piscar: “Ah, é isso que você acha de mim, que eu sou um perdedor? Porque que você
acha que eu sou bobo, eu já tinha reparado...”.
Algumas pessoas em volta fizeram “uh!”, outras sussurraram entre si, mas a música continuava a todo vapor,
então acho que eles nem ouviram, continuaram o diálogo como se não tivesse ninguém em volta.
“Leo, pega leve, tá?”, a Vanessa falou e pegou o braço dele, acho que para ilustrar o que ela tinha acabado de
falar. “Você não queria vir, o Rafael muito gentilmente me ofereceu pra fazer companhia e me levar em casa
depois. Que mal tem nisso?”
Além de traidora, estava mostrando ser uma mentirosa. O Leo deve ter achado a mesma coisa porque tirou a
mão dela do braço dele e falou: “Não tem mal nenhum. Você pode ir pra casa com quem você quiser de agora em
diante. Pode dançar, pode beijar, pode...”. Nesse momento, ele deu uma paradinha, talvez pela cara que a Vanessa
fez. “Você pode fazer o que te der na telha, desde que fique bem longe de mim. Tem muito tempo que eu queria
falar isso, mas estava tendo consideração por você, porque eu sei que você é a pessoa mais preocupada do mundo
com o que os outros pensam a seu respeito. Pois agora eu não estou nem aí com o que os outros vão pensar de
você, não estou nem aí pra nada da sua vida. Quer saber? Tô fora!”
Eu olhei em volta e todo mundo estava de boca aberta. O Leo virou as costas e começou a andar em direção ao
bar. Algumas pessoas aplaudiram quando ele passou, ele nem ligou e continuou a andar. A Vanessa ficou parada
um tempo, uns meninos começaram a rir da cara dela, a gritar “se deu mal!”, ela virou o cabelo de lado, levantou a
cabeça e foi para o banheiro, como se nem fosse com ela.
A Priscila olhou pra mim, com uma expressão meio preocupada: “Será que o Leo vai ficar bem, Fani?”.
Ela não precisou falar mais nada. Eu me levantei e fui direto para o bar.

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Fazendo meu Filme
RomansaFazendo meu filme nos apresenta o fascinante universo de uma menina cheia de expectativas, que vive a dúvida entre continuar sua rotina, com seus amigos, familiares, estudos e seu inesperado novo amor, ou se aventurar em um outro país e mergulhar nu...