capitulo 38

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Jenna: Eu acho que todos nós queremos sentir algo que esquecemos ou que não ligamos porque talvez
não tenhamos percebido o quanto estávamos deixando para trás.
(De repente 30)

Nem preciso falar que eu não consegui estudar nada até bem tarde. Saí do banho e a Natália, a Gabi e o Alberto
estavam sentados em cima da mesa da cozinha tomando sorvete direto do pote.
“Fani, as meninas estavam me contando da festa”, o Alberto falou, entre uma colherada e outra. “Por que você
não me avisou? Em vez de vir pra casa hoje cedo, eu teria vindo ontem à noite pra poder ir também!”.
Ha, ha. Até parece que se eu tivesse avisado ele iria a uma festinha de colégio! Ele só estava falando aquilo pra
fazer bonito na frente das meninas. Eu nem respondi. Virei pra Natália e perguntei do Mateus.
“Ai, Fani, você acredita que ele não chegou em mim ontem?”, ela respondeu. “Ficamos um tempão conversando,
mas toda hora aparecia um daqueles amigos que foram com ele pra interromper! E parece que eles tinham outra
festa pra ir depois, porque ficaram meia hora e foram embora! Eu nem tive mais pique depois disso, entrei num
daqueles quartos desocupados e dormi até a hora do meu pai chegar!”
Eu fiquei meio com pena dela, ia começar a falar algo pra consolar, mas o Alberto fez isso por mim.
“Que isso, gatinha!”, ele falou pegando no cabelo dela. “Perdeu uma festa por causa de um sujeito bobo desses,
que preferiu ir pra outro lugar em vez de ficar com uma gata dessas? Ah, que pena que eu não estava lá, não ia
deixar você dormir de jeito nenhum! Muito pelo contrário!”
Ela riu meio envergonhada, mas eu vi que a expressão dela ficou mais animada depois disso. Virei pra Gabi e
perguntei do Cláudio. Ela falou que estava tudo bem, que ele já tinha ligado hoje e que eles tinham combinado de
ir ao cinema na próxima semana, depois que passasse o vestibular dele. Eu e a Natália olhamos uma pra outra e
começamos a bater palmas recitando um versinho da nossa infância:
“A Gabi tá diferente, tá, tá diferente, tá, tá diferente...
Foi, foi ele sim, foi o Cláudio que deixou a Gabi assim!!
Foi, foi ele sim, foi o Cláudio que deixou a Gabi assim!!”
Nós caímos na gargalhada e aí ela, pra descontar, perguntou: “E o Leo, dona Estefânia? Que história é essa que
estavam contando na festa que você declarou ser namorada dele pra quem quisesse ouvir? Quem é que está
namorando aqui, hein?”.
Os três ficaram me encarando na maior expectativa. Eu comecei a gaguejar, o Alberto então falou: “Xiii, tem
culpa no cartório...”, ao que eu respondi: “Ih, menino, sai fora, você nem estava lá, nem sabe o que está
acontecendo!”.
As meninas ficaram pedindo pra eu contar tudo, e eu comecei a explicar desde o princípio, que o Leo chegou e
pegou a Vanessa no flagra, que o Rafael por pouco não o estraçalhou inteiro e que graças ao fato de eu ter falado
que era namorada dele – nesta hora olhei pra Gabi, pra conferir se ela estava entendendo o motivo da tal
declaração – o Leo tinha saído ileso.
“Pronto, foi só isso. O que tem de mais nessa história?”
“Bom, não tem nada de mais...”, o Alberto começou a falar. “Mas por que você fica vermelha toda hora em que
fala o nome do Leo?”
As meninas começaram a rir, eu não sabia onde escondia a cara, e nessa hora a porta abriu e meus pais
chegaram. Eles não ficaram nada felizes ao ver quatro pessoas sentadas em cima da mesa, e muito menos pelo fato
de duas delas serem a Natália e a Gabi, sendo que eu tinha prometido que ia dar um tempo das amigas até o final
da recuperação.
As meninas não perderam tempo. A Gabi disse que só tinha vindo trazer um caderno pra mim e, enquanto elas
iam andando pra porta, ela foi falando: “Espero que minhas anotações ajudem, Fani, qualquer dúvida é só me
ligar!”.
A minha mãe falou que eu tinha perdido a festa da Juju e que ia passar as fotos para o computador para que eu
pudesse ver como ela tinha ficado linda na minha ex-roupa de Mamãe Noel. O meu pai perguntou se eu tinha
estudado muito, e antes que eu respondesse o Alberto falou: “Nossa, quando eu cheguei estava saindo até
fumacinha da cabeça dela! Por isso que eu falei pra ela fazer um break e tomar um sorvetinho comigo...”.
O meu pai me deu um beijo na testa e um abraço. Aproveitei que eu estava de frente pro Alberto e disse um
“obrigada” silencioso para ele, que deu uma piscadinha pra mim.
Fui pro meu quarto, disposta realmente a começar a estudar, porque eu já tinha perdido um dia inteiro.
Chegando lá, encontrei o caderno da Gabi em cima da minha escrivaninha. E eu que tinha achado que fosse só
desculpa pra ela não ficar mal com os meus pais... abri pra ver se ela tinha alguma anotação que eu não tivesse, e
o que eu encontrei foi uma cartinha pra mim, na primeira página.
Fani,
Espero que agora você entenda o que eu quis dizer sobre a música lenta que você dançou com o Leo nas
bodas de prata dos meus pais. Acho que dessa vez você estava bastante lúcida para sentir o carinho que ele
tem por você...
Mas tenta pensar nisso só depois que a recuperação acabar, viu?
Um beijo!
GABI
Foi só então que eu lembrei que ela tinha me contado que eu havia dançado com o Leo na festa dos pais dela
sem ter a menor consciência disso, já que tinha enchido a cara de champanhe e não estava respondendo pelos
meus atos! Pouco tempo se passou desde então, mas parece que aconteceram coisas suficientes por um ano
durante esse período!
No dia em que a Gabi me contou da tal dança, eu fiquei completamente com o pé atrás em relação ao Leo, com
medo dele estar a fim de mim e com vontade de me distanciar para ele não sofrer se realmente estivesse... mas,
agora, tudo o que eu conseguia pensar era que eu poderia ter sentido tudo aquilo muito antes se não estivesse
bêbada!
“Eu queria tanto dançar com ele de novo...”, falei baixinho, para mim mesma, e mesmo assim me assustei com
as minhas palavras. Eu não podia estar gostando do Leo. Não era possível! O tipo de menino de que eu gosto é
muito diferente!
Peguei uma folha em branco do caderno e comecei a fazer a lista de todos os meninos de quem eu já gostei na
vida.
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Paixões da minha vida (ordem cronológica)
André (sobrenome esquecido) – Meu coleguinha do
pré-primário. As meninas todas da sala gostavam do
Fabrício ou do Luiz Henrique porque eles eram
os mais bonitos. Acho que eu sou do contra desde
os seis anos, porque, no dia em que a professora fez
uma brincadeira na sala e mandou que cada me-
nina escolhesse um “pai” para sua boneca, eu escolhi
o André. Todos as minhas coleguinhas começaram a
rir, falando: “Escolheu o gorducho, escolheu o gordu-
cho!”, e eu nem tinha consciência de que ele era
gordinho... eu o achava tão fofinho!
Gumercindo (não tenho a menor ideia do sobre-
nome) – Quarta série. Ele era da outra sala. Mas
fazia judô no horário da minha ginástica olímpica.
A gente ficava conversando na porta do colégio
enquanto nossas mães não chegavam pra buscar a gente. Minha melhor amiga na época, a Ana Júlia,
era louca por ele. Por isso eu nunca admiti
(nem pra mim mesma) a minha paixão.
Rick Martin – Lindo, lindo, lindo! Apaixonei-me por
ele aos 11 anos e só desisti porque ele não respondeu a
nenhuma das 73 cartas que eu mandei. Mas o acho
lindo até hoje, mesmo que os meus irmãos insistam
em dizer que ele é gay.
Ricardo Tavares – Nono ano. Eu ligava pra casa
dele todo dia para colocar músicas românticas e
desligava depois sem falar nada! Foi por causa dele
a primeira recuperação que eu tomei na vida. Eu
precisava de pouquíssimo ponto pra passar de ano,
mas, como achava que ele ia tomar recuperação, zerei
a prova de propósito! Ele passou. E eu passei a recupe-
ração inteira com raiva dele, mas mais ainda de mim!
Robert Schwartzman – Desde que assisti a “O diário da
princesa”, fiquei completamente apaixonada. Ele é
perfeito! Além de ser bonito num estilo assim meio
“retrô” (acho que ele copiou o corte de cabelo daqueles
caras dos Beatles), ele também canta e toca!
Patrick Silva – A cara do Robert Schwartzman (paixão
de cima). Não acreditei quando o vi na minha frente.
Achei que o Robert tinha vindo de Hollywood
diretamente pra me encontrar! Mas não, o Patrick era
apenas um clone dele. Ele sabia que eu gostava dele,
porque alguém – não sei quem até hoje – contou
pra ele. Ele passou a me esnobar. E beijou uma feiosa
na minha frente numa festa de 15 anos. Desencan-
tei-me no mesmo instante.
Capanema – O nome dele é João, mas todo mundo
o chama de Capanema. É amigo do namorado de uma prima minha de terceiro grau. Moreno.
Olhos azuis. De vez em quando, no clube, ele ficava
me encarando... mas acho que ele encarava todo
mundo porque eu já o vi com umas 17 meninas.
Desisti. Eu gosto de exclusividade.
Adriano Pinto – Do meu colégio antigo. É um ano
mais velho do que eu, eu estava no primeiro ano e
ele no segundo. Ninguém olhava pra ele até eu
resolver olhar. Minha ex-melhor amiga Márcia ficou
com ele no Réveillon do ano passado. Nunca mais
olhei pra ele. Nem pra ela.
Marquinho – Argh! Argh! Argh! Só tenho uma coisa a dizer: como pude?
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Terminei a lista e fiquei olhando. O que esses meninos têm a ver com o Leo? Nada! Todos eles são lindos de
morrer e o Leo é...
O Leo é só o Leo. O Leo que gosta quase tanto de cinema quanto eu. O Leo que tem a mãe mais gente boa do
mundo. O Leo que faz palhaçada para eu rir. O Leo que me protege sem eu nem estar correndo perigo. O Leo com
quem eu gosto de estar junto em qualquer momento...
Comecei a sentir calor de repente. Peguei meu livro de Matemática e passei a revisar as fórmulas das funções
de segundo grau. E jurei para mim mesma que esse era o único pensamento que eu ia ter. Pelo menos naquele dia.

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