° INTRUSA °

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TYRUS  (Regente do planeta Heneida)

— Meu senhor, temos um problema! – Yillaweh entra no meu escritório privado sem pedir permissão e só por isso, já sei que a coisa é séria.

— O que houve capitão?!

— Uma escrava de Alzihah foi encontrada no compartimento de cargas de uma de nossas naves que esteve lá recentemente.

— Leve-a de volta, imediatamente! –

Ordeno, sabendo que com Hámmon não existe meios termos e que ele ficaria feliz se pudesse jogar algum tipo de acusação sobre nós. Aquele macho era uma fera astuta.

— Meu senhor, a humana está ferida, devemos mandá-la nessas condições? Temo que Hámmon nos acuse de ter danificado o que lhe pertence.

E mais essa agora.

— Tens razão! Não podemos dar brecha para que ele nos acuse de violar o pacto. Leve-a para ser cuidada e avise ao imperador que a temos conosco e sob quais condições e que logo a enviaremos de volta.

— Sábia decisão, majestade! Irei notificá-lo antes que ele descubra a fuga da fêmea e nos acuse  de raptores.

Éramos uma raça guerreira, com sabedoria milenar para estratégias de guerra, além de muito fortes, o que nos assemelha aos habitantes de Alzihah, por isso nos temiam como oponentes e o imperador optou por fazer uma aliança conosco, aliança essa, que tínhamos o maior interesse em manter por questões óbvias: eles nos temiam, nós os temiamos.
Eu só não contava que a partir de hoje essa aliança estaria em risco.

Sim, mais tarde Yillaweh veio ter comigo de novo e as notícias que me trouxe me deixou desconcertado.
De uma hora para a outra, a humana passou de escrava do imperador para minha neta, sangue do meu sangue. Não posso acreditar que o universo conspirara ao meu favor. Eu a havia procurado por vários ciclos e jamais encontrei qualquer pista de seu paradeiro. E agora, ela estava aqui.

— Preciso vê-la!

Eu precisava atestar isso com meus próprios olhos. A última vez que a vi ela era só um bebê, mas se mil ciclos se passassem, eu ainda a reconheceria.
Segui meu capitão à passos largos até chegarmos na ala de tratamento.

— Aí está ela, meu senhor!

— Haaliyah?

Não tenho qualquer dúvida, é minha neta.
O cuidado dos curandeiros para com ela revelou nossa mistura de DNA. Pelos deuses, ela tão linda.
Seu sono é tranquilo e não resisti e acabo afagando seus cabelos.

— Senhor, o que faremos em relação ao imperador?

— Abra um canal de comunicação.
Falarei com ele pessoalmente.

— E quanto a ela?

— Ora, não lhe parece óbvio? Acomode-a num dos aposentos reais.

— Assim será feito.

Mais tarde, quando o novo canal de comunicação foi aberto com a casa real de Alzihah, o imperador pareceu bem surpreso ao se deparar comigo e só o fato de me ter nessa conversa já lhe revelava a razão.

— Saudações, majestade! A que devo a honra do seu contato? – ele se adianta com semblante imutável, como sempre.

— Há a necessidade de uma explicação entre nós. Como minha descendente foi parar nos seus domínios?– vou direto ao ponto.

— Majestade, o planeta Terra não é domínio de Heneida e o senhor sabe que há séculos buscamos escravos naquele lugar. –

Sinto a soberba dele ao me falar isso e é fato que ele tem um bom ponto.

— Sim, de fato! Mas pelo seu semblante percebo que meu segredo não era encoberto, então por que a reteve em seu poder?!

— Oras, do que está me acusando? Acaso violei nossa aliança? Até onde me lembro, não há subscrito em nosso acordo uma linha sequer que me proíba de colher escravos naquele planeta, ainda que sejam híbridos, aliás a esse respeito, não há nada que conste no pacto.

— Tens razão! Mas estou falando de bom senso. Por acaso não lhe ocorreu que a humana em questão sendo minha descendente, eu reclamaria poder sobre ela?

— Não presumi que ela era tão importante para vossa majestade! Isso, porém, nos põe em outro impasse...

— Impasse? Acidentalmente, a humana veio parar em Heneida, então, há de imaginar que devido às novas circunstâncias, não a enviarei de volta. Não vejo impasse nisso. – digo decidido.

— A fêmea tornou-se minha imperatriz, acaso isto não me dá o direito de reclamar poder sobre ela também?– ele revela como se desse sua última cartada e eu sabia que ele estava jogando comigo.

Fiquei sem palavras. Eu não esperava por isso. Eu precisava de um escape e subitamente uma ideia clareou em minha mente.

— Se o que diz é verdade, não negarei o seu direito, porém, já não cabe a mim dar o veredito e sim a minha neta. Ela decidirá!

Agora, nem mesmo, ele pôde contestar esse ponto e terá de se conformar com isso, ao menos por enquanto.
Por outro lado, ganhei tempo para resolver esse problema, porque eu jamais a entregaria a ele, ainda mais sabendo tudo sobre aquele macho.
Minha neta não seria usada da mesma forma que aquele povo costumava usar as fêmeas de outra raças e se eu tivesse que entrar em guerra por conta disso, eu o faria com prazer.
Hámmon sabia que ela era minha descendente e mesmo assim a manteve para si; aquele maldito pagaria por essa afronta.

Contudo, no momento eu precisava comprovar se o que ele dizia era verdade, porque se Haaliyah fosse imperatriz de Alzihah a situação ficaria muito delicada e eu não sei se conseguiria resolver isso com diplomacia.
Para todos os efeitos, ela também era princesa de Heneida e ele não poderia tratá-la como uma mera humana ou híbrida.
Mas eu tinha que ser rápido e oficializar isso e então fiz um anúncio real aos ministros e conselheiros e mandei que o povo fosse noticiado.
Eu iria tornar as coisas bem difíceis para o imperador.

A parte mais difícil disso tudo foi contar para  Kailyn, minha filha, mãe dela. Mas eu não podia esconder nada, nem mesmo os pormenores e foi como imaginei, ela só escutou o que lhe interessava e correu para ala de recuperação.
Eu a segui, tentando pôr um pouco de juízo nela.

— Vai com calma, minha filha! Ela ainda não sabe de nada, não sabe quem somos...

— Não me peça paciência, papai! Não agora...

Nisso, Haaliyah começa a se mover e abre os olhos. Ela olha para a mãe e sorri.

— Oi!

— Olá, querida! Como se sente?

— Bem, eu acho... Onde estou? Quem é você?

— Sou a princesa Kailyn! Quando se sentires melhor, conversaremos. Por enquanto, basta saber que estás segura conosco.

— Segura? Ahhhh... isso é música para os meus ouvidos...

A voz dela era só um sussurro agora. Ela estava caindo em sono profundo devido a medicação de cura e a sedação que haviam lhe aplicado para a viagem de volta a Alzihah, coisa que nunca aconteceria.
Não enquanto eu vivesse.

Outro Mundo: Contos AlienígenasOnde histórias criam vida. Descubra agora