8.2 | Flashback 2.0

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E N Z O

25 de janeiro de 2016, 6 anos atrás.

Quando o sinal fica vermelho, me concentro em observar a imagem da garota ao meu lado, que dorme tranquilamente com a boca aberta.

Seu rosto angelical não combinava em nada com os sons altos e engraçados de seus roncos, que irrompiam em meus ouvidos sem pedir licença.

— Ei, acorda!

Cutuco seu ombro, falhando miseravelmente na missão de despertá-la.

Ela suspira profundamente e se ajeita pelo banco, virando o rosto para o lado oposto e voltando a roncar segundos depois.

— Droga. — murmuro, sem saber que atitude tomar em uma situação como essa.

O sinal fica amarelo. Mordo meus lábios nervosamente e continuo sem resposta quando a cutuco novamente.

O sinal fica verde e meus pés continuam sob o freio, indecisos.

— Alice! — cutuco seu corpo um pouco mais forte, impaciente.

A garota abre os olhos, assustada, parecendo perdida e confusa.

Suspiro, aliviado. Finalmente estava acordada.

— Onde você mora? — indago.

Ela me olha rapidamente antes de encarar as luzes dos postes pela janela entreaberta.

— Não sei. — responde, parecendo sincera em suas palavras.

O quê?

— Como assim? Não sabe? — incrédulo, não me esforço muito em esconder minha inquietação. — Eu preciso te deixar em algum lugar.

— Qualquer lugar serve. — dá de ombros, suas pálpebras pesadas piscando com uma frequência lenta e duvidosa. Logo pegaria no sono novamente e me deixaria falando com as paredes.

Respiro fundo e solto o freio, deixando o carro entrar em movimento novamente. O sinal ainda estava verde quando decido seguir meu caminho rotineiro, torcendo para não me arrepender da minha escolha mais tarde.

Durante o caminho, me convenço de que no dia seguinte daria um jeito de levá-la para casa, quando estivesse sóbria o suficiente para me dar um endereço. Afinal, seria imprudência minha deixá-la em qualquer lugar.

Confesso que quando chegamos ao destino não foi nada fácil acordá-la e levá-la até a cobertura. Precisei cutucá-la cerca de três vezes para despertá-la e mais algumas tentativas para finalmente conseguirmos sair do estacionamento e entrar dentro do elevador.

Quando chegamos, depois de longos e dificultosos minutos, a primeira coisa que ela me pergunta é onde fica o banheiro. Sem questionar, a levo até o cômodo enquanto ela diz:

— Eu preciso escovar meus dentes. Minha boca tem gosto de morte.

Bocejando, ela abre o armário do meu banheiro e pega a minha escova. Desenrosca a pasta de dente em movimentos lentos e tranquilos.

No segundo seguinte, ela está escovando os dentes como se estivesse em sua própria casa. Seus movimentos são letárgicos e engraçados, típicos de uma pessoa bêbada que quer transparecer sobriedade.

Eu não pude fazer nada a não ser observar a cena, conformado. Quando ela finalmente dediciu que tinha acabado, guardou tudo no lugar e se virou de frente para mim, que estava encostado no batente da porta encarando-a, completamente surpreso.

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