62 - Cerimônia

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Meu pai faleceu às 22:37 do mesmo dia. O visitei na UTI mais duas vezes. Mesmo tendo a oportunidade de me despedir três vezes, sinto que havia muita coisa a dizer. Apesar de tudo, eu estou bem, na medida do possível. Tenho minutos de crise, mas consigo voltar ao normal depois de um tempo.

Voltei para a casa do Zica, mas só até eu me sentir bem o suficiente para conseguir ficar em casa sozinha. A Dona Fátima está sendo perfeita para mim, uma verdadeira mãe, nunca senti tanta falta de uma figura materna, ou até mesmo paterna, como estou sentindo agora. É louco pensar que eu sou a única pessoa da minha família, não tenho nenhum laço de sangue, só sou eu e eu mesma.

Os meninos estão fazendo de tudo para me agradar, e as meninas também, mas consigo ver o quão perdidos eles estão, afinal, nenhum deles passaram por isso, ninguém sabe como agir, nem eu mesma sei. Tem horas que quero gritar para eles pararem de serem legais ou apenas parar de me olhar com pena, mas tem horas que eu quero o carinho e a afeição deles. Por tanto, só fico calada e agradeço, porque sei que eles estão fazendo o melhor que eles podem.

Nunca fiquei tão perdida nos meus pensamentos como nos últimos dias, pensei até em pedir pro Rick um trabalho, sem necessidade de salário, só para eu ter algo para fazer que não envolva pensar nos meus problemas.

Mas hoje ... hoje preciso se mais forte, hoje é a cerimônia de despedida. Honrando seu pedido, ele gostaria de uma cerimônia intimista ao máximo. Ele será cremado e quer suas cinzas jogadas no Lago Ládoga, na Rússia, seu lugar favorito. Ele me deixou ficar com uma pequena parte das cinzas.

Quem organizou todo o funeral foi o Carlos, Frederico e a Rosa, além de eu estar sem cabeça para isso, eles conhecem meu pai melhor do que eu. Tenho certeza que eles fizeram tudo do jeito que ele gostaria.

Eles conseguiram uma casa, que é como se fosse uma casa de eventos, mas para funerais, bem clássica, a cara do meu pai. A casa é pequena, o que a torna intimista por si só. A entrada é uma espécie de recepção, tem umas cadeiras e uma mesa com comes e bebes, meu pai se encontra na segunda sala, onde seu caixão está posicionado no meio do salão.

Ele está muito bonito, não está parecendo doente, está pleno. Seu bigode está em perfeito estado, assim como o seu cabelo ... ele está lindo.

— Ele está muito elegante, você não achou? — diz a Rosa, com um tom de orgulho.

— Está perfeito, essa roupa está a cara dele. — Digo junto com um abraço.

Ela que escolheu a roupa.,

— Obrigada, Rosa! — agradeço, esses dias, devo ter agradecido ela umas mil vezes.

— É um prazer poder ajudar você e seu pai. — Ela sai do abraço. — Bom, vou voltar para a recepção, quero garantir que esteja tudo impecável.

O ruim de parecer fisicamente com o meu pai é que todo mundo sabe que sou sua filha e vem me cumprimentar. Essa definitivamente é a pior parte, ouvir pessoas que eu não conheço me oferecendo seus pêsames, histórias, dicas e abraços. Sei que é na melhor das intenções, mas não quero falar com ninguém, só queria ficar olhando o meu pai até a hora que ele for velado, sem precisar falar ou cumprimentar ninguém.

Depois de quase uma hora de cumprimento, consigo paz. Volto a focar só no meu pai e em como ele está bonito. Porém o que eu queria mesmo é chorar, meu rosto está doendo de segurar o choro, mas tenho medo de começar a chorar e mil pessoas aparecerem para me consolar.

— Giovanna. — Ouço me chamarem.

É o Alex. Está ficando mais difícil segurar o choro.

Ficamos calados, ele me observando e tento de tudo para não desmoronar.

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