40 - Colo de mãe

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É estranho como em um dia, uma relação pode mudar drasticamente. Desde que cheguei no quarto do meu pai, eu não senti remorso, ou raiva, ou angustia, senti compaixão e carinho. Ele está com um semblante feliz, mesmo com todos os aparelhos grudados nele, sua voz não é mais contínua, tem sentimento e intensidade nela. Por um minuto, esqueço que ele está com câncer terminal e fico feliz por estar presenciando essa mudança nele.

Pensando bem, estou alegre desde que entrei aqui, isso é certo? Eu deveria estar triste e não alegre, mas ele também está. Como ele consegue estar alegre sabendo que os dias dele estão contados? Se bem que, ele deve aproveitar o restante de tempo que ele tem, no caso, eu também.

— Pai, queria te apresentar aos meus amigos, quer dizer, reapresentar, você aceita? — pergunto um pouco recuada.

Quero que meus amigos vejam como ele mudou, quero que meu pai goste deles e que eles dele. Sei que será impossível eles terem uma relação igual tenho com os pais deles, mas eu amaria ver eles juntos e conversando, ver o meu pai rindo com eles, okay, rindo já é demais, me contento com um sorriso.

— O que você tem em mente? — ele pergunta, diminuindo o som da televisão e me encarando da sua cama.

Eu me ajeito no sofá, tento conter a empolgação.

— Nada de mais, só trazê-los aqui para você conhecê-los de verdade, eles são minha família também.

— Se eles não se incomodarem com um quarto de hospital, eu ficarei contente de conhecê-los. — Ele diz com um sorriso genuíno.

Como sonhei com um momento desse, com o meu pai se interessando pela minha vida e pelo meus amigos, isso é um sonho!

— Obrigada! — não consigo conter minha empolgação, levanto do sofá e me sento na ponta da sua cama — Eles são maravilhosos, você vai amar, não sei se você se lembra deles, são três: José Ricardo, Gabriel e Renan, mas o José todo mundo chama de Carioca, o Gabriel de Gabs e o Renan de Zica. Os pais do Carioca são médicos, eles já me ajudaram algumas vezes. O pai do Gabs mora no Mato Grosso, ele é agrônomo, e a mãe dele trabalha na área infantil do Gaya. A mãe do Zica também trabalha do Gaya, mas ela é a chef da cantina, a comida dela é maravilhosa, o pai dele mora no Pará. O Gabs e o Zica moram no mesmo prédio, eu moro com o Zica, tinha um quarto vago lá e eles me chamaram para morar com eles. Claro, eu ajudo na despesa da casa, a Dona Fátima não quis aceitar, mas eu fiz questão, ela é um amor, uma verdadeira mãe ... — eu me empolguei tanto que comecei a falar muito rápido, ele provavelmente não deve ter entendido nada. — Desculpa, fiquei muito empolgada. — Falo sem graça, ainda falta intimidade na nossa relação.

— Por que você não convida a Dona Fátima também? Eu adoraria a conhecer e agradecê-la por cuidar de você.

É sério isso? Ele quer conhecer a mãe do Zica?

Como uma frase tão simples pode iluminar um dia inteiro?

*

— O que vocês acham? — pergunto, com o sorriso mais largo que consigo, se o Zica e a Dona Fátima topam conhecer meu pai.

— Será um prazer, minha querida! — Dona Fátima fala e em seguida me abraça.

— Obrigada! — agradeço-a abraçando mais forte.

— Eu também estou dentro, hospital de rico deve ter comida boa, né? — Zica fala e sua mãe dá um tapa em sua cabeça.

— O Renan tem que ir mesmo? — ela pergunta brincando.

— Pensando bem, melhor ele ficar aqui, né? — brinco também.

— Sai fora vocês, vou no Gabs contar, vamos Gigi!

Segunda ChanceOnde histórias criam vida. Descubra agora