Matias Fonseca
Não tendo nada mais para fazer pelo resto do dia, resolvo passar o tempo com meus lápis de cores e papéis A3. Comecei a desenhar desde muito novo, mas percebi ter talento para isso quando já tinha uns quatorze anos. Os desenhos me ajudam a expressar muitas coisas que não consigo dizer em palavras, são um pequeno refúgio. E quase ninguém sabe sobre minha paixão por eles, muito menos meu pai.
Passo as horas seguintes deitado sobre o chão frio do meu quarto, manchando meus dedos enquanto dou vida aos traços no papel. E me surpreendendo quando o desenho fica pronto, vendo seu resultado final. Os traços humanos remetem a uma pessoa... o garoto que vem perturbando meus pensamentos há semanas e fazendo meu coração cada vez mais confuso.
Solto um suspiro pesado e largo o lápis sobre o desenho, me virando de costas no chão. Meus olhos fitam o teto imaculado do meu quarto e seguro as lágrimas que querem vir à tona. O que eu não daria para ser um adolescente vivendo sua vida normalmente? Sorrindo, brincando, fazendo amizades... amando. Fecho meus olhos e limpo a única lágrima que escorre por minha face, sentindo meu coração doer em meu peito. É tudo tão difícil.
O toque do meu celular interrompe meu momento silencioso e de tristeza, me fazendo bufar impaciente. Mas toda a irritação vai embora quando vejo o número de Dylan na tela.
- Ei! - falo ao atender.
- Má, vamos ao cinema. - É a voz de Uriel que me responde.
- Sabe que não posso, Uri - respondo, melancólico.
- Podemos inventar algo, minha mãe ajuda... diz que sim. - Sua voz sai suplicante e sei que ele usa de sua fofura para me convencer.
- Não sei se é uma boa ideia, de verdade - falo, sendo sincero e ele não diz mais nada por um tempo.
Penso que a ligação possa ter caído, mas a voz a seguir me faz confirmar que não.
- Ícaro, vamos ao cinema. Quer ir? - A pergunta é feita por Uriel.
- Segurar vela? Não, obrigado! - ouço ele responder rapidamente.
- Nem se Matias for? - dessa vez é Dylan quem tenta e eu suspiro audivelmente.
Eles se esqueceram que eu estou aqui? Do outro lado da linha?
- Não mesmo, seu amigo já deixou claro que não somos absolutamente nada, então não me interessa sua companhia. - A resposta de Ícaro me pega desprevenido e sinto meu peito se apertar. Mas eu queria o quê? A culpa é minha afinal.
- Matias é mais complicado do que parece, falo por experiência própria. As vezes falamos coisas que nem sempre são verdades apenas para nos proteger. Se você realmente gosta dele, não desista agora. Uriel demorou para desfazer a barreira que estava ao meu redor, e ele não fez isso desistindo na primeira oportunidade em que o afastei - Dylan diz, tentando ao meu favor, e me sinto grato por isso.
- Eu não sou o Uriel e não estou a fim de correr atrás de uma pessoa que apenas me ignora e pisa nos meus sentimentos. - Ele diz, me fazendo sentir a pior pessoa do mundo. Pois foi exatamente isso que fiz com ele.
- Cadê o garoto que estava defendendo Matias de todos há alguns dias atrás? - Uriel pergunta.
- Ele levou um fora. Porra, parem de me encher o saco. Matias não quer nada comigo, nem mesmo minha amizade, e eu não vou mais tentar. Cansei!
Sinto as lágrimas voltarem aos meus olhos e tento impedir o choro, mas é impossível. Isso dói. O pior é saber que não posso nem ficar bravo por ele desistir de mim, eu mesmo já fiz isso.
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Vogelfrei | Livro 02 - Trilogia Destinos
RomanceQual é o preço de ser livre? Tecnicamente deveríamos ser livres de graça, não? Mas, infelizmente, muitos vivem em prisões impostas pelos outros ou por si mesmos. E Matias é uma dessas pessoas, ele se encontra preso pela pessoa que mais ama e odeia...