Matias Fonseca
Meus olhos estão fixos na porta de madeira do quarto hospitalar enquanto minha mão está na maçaneta, mas eu não consigo me mover, muito menos abrir a porta e entrar. Já se passaram dois dias desde que fui resgatado e ainda não pude ver meu pai. Bem, tenho essa oportunidade agora, mas não sei como agir. Estou ansiosa para vê-lo, poder olhar para ele e constatar que está tudo bem, ele está vivo e vai voltar comigo para casa. Mas por que eu não consigo dar o próximo passo? Por que parece tão difícil?
- Está tudo bem, Matias? - ouço a voz de Sandro ao meu lado e um breve arrepio perpassa por meu corpo.
Solto um suspiro e apenas balanço a cabeça em negação. Sou extremamente grato por ter tido Sandro ao meu lado durante esses dias. Ele não tem nenhuma obrigação comigo, mas esteve junto de mim desde que eu acordei, como se fosse ele o meu pai. E sendo sincero, eu me sinto bem com ele perto de mim. Conversar com ele, ouvir suas palavras de conforto me deixa em paz em meio ao caos. E confesso que foi sua presença que não me deixou pirar, pois ele esteve ao meu lado em cada pequena crise que tive desde que saí daquele inferno.
- Quer ir para casa e vir vê-lo depois? - Ele propõe, mas nego.
- Não, eu preciso ver meu pai - respondo e fecho meus olhos por um breve momento, respirando fundo.
Tomando coragem, giro a maçaneta e abro a porta do quarto, sentindo o frio me atingir. Por que hospitais são tão frios e mórbidos? Penso em como Ícaro está aguentando todo esse tempo preso aqui. Eu fiquei por dois dias e senti que poderia enlouquecer. Não só pelo fato de ser um lugar assustador, mas também pelas lembranças que esse lugar me traz.
Meus olhos vagueiam pelo quarto e então o encontro... meu pai. Ele está deitado, imóvel, na cama hospitalar e o que me diz que ele está vivo é sua respiração que faz seu peito subir e descer. Também observo o aparelho ao lado da cama que mostra seus batimentos cardíacos e me sinto aliviado. O vendo agora, ele não se parece nenhum um pouco o homem sério e imponente que eu conheço. Ele só me parece indefeso, tendo o rosto pálido, curativos no lugar das operações e os olhos fechados como se estivesse em um sono profundo.
Sinto meus olhos arderem e as lágrimas novamente veem à tona. Me aproximo em passos lentos da cama e um pouco hesitante toco na mão gelada do meu pai. A imagem dele caindo em minha frente, baleado, ainda me assombra. E eu não sei o que faria se perdesse a única família que ainda me resta. Podemos não ter tido a melhor relação nos últimos anos, mas ele ainda continua sendo a única pessoa que me resta. A pessoa que eu mais amo no mundo, a pessoa que eu não suportaria perder definitivamente.
- Obrigado, pai - sussurro e me inclino sobre ele, deixando um beijo em sua bochecha coberta pela barba por fazer.
- Seu pai te ama, querido... ele faria de tudo por você, mesmo que do jeito errado. Pude ver como ele esteve a ponto de enlouquecer quando te levaram - ouço Sandro dizer com calma e absorvo suas palavras.
Eu me afasto do meu pai e seco meu rosto, me virando para Sandro em seguida. O analiso por um momento e vejo seu olhar fixo em meu pai. Há algo aqui.
- Você realmente já conhecia ele - falo e não é uma pergunta.
Sandro desvia seus olhos do meu pai e então olha para mim. Ele não diz nada por alguns segundos, até que se aproxima de mim e sorri minimamente.
- Sim, nos conhecemos há muito tempo. Um dia ele pode te contar - Sandro responde e me lembro da reação deles se vendo há meses atrás.
- Por que não você? - pergunto, curioso.
- Porque não é só sobre mim. Agora vamos? A enfermeira vem nos expulsar em breve. - Ele diz por fim e me dou por vencido, não estendendo o assunto.
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Vogelfrei | Livro 02 - Trilogia Destinos
Storie d'amoreQual é o preço de ser livre? Tecnicamente deveríamos ser livres de graça, não? Mas, infelizmente, muitos vivem em prisões impostas pelos outros ou por si mesmos. E Matias é uma dessas pessoas, ele se encontra preso pela pessoa que mais ama e odeia...