O último dia.

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Passou-se um tempo, meu trabalho ficou pronto e recebi a nota 9,8. A Brenda recebeu um 9,9 e eu fui motivo de chacota por vários dias. Eu estava sentada em uma das mesas da biblioteca da faculdade, mandando milhares de emails, para milhares de impressas de publicidade, na intenção de ser chamada para um estágio. O clima estava quente, o sol estava cada dias mais forte e isso era sinal de que o verão já estava chegando. Eu acordei com uma sensação ruim, mas não sabia o por quê.

- Solange, posso falar com você? - Me assustei quando vi que era o Lorenzo - Me desculpa, não queria te assustar.

- O que deseja, professor?

- Você continua me tratando assim, como professor?

- É o que você é, não é mesmo?

- Eu sou o seu pai, não se esqueça disso. - Lorenzo se sentou na cadeira da frente.

- Estamos em uma biblioteca, as pessoas podem te ouvir. - Guardei o meu notebook dentro da bolsa.

- Para de me tratar assim, você me magoa muito com essa atitude - Vendo que eu não respondi, ele continuou - Eu vim até aqui porque eu estou pensando em colocar você naquele programa de intercâmbio.

- Eu não quero. - Dei de ombros.

- E por que não? É uma oportunidade única e vai enriquecer o seu currículo.

- Por que você está fazendo isso? - Arqueei a sobrancelha.

- Solange, eu quero o seu bem. Quero ver você sendo uma mulher de sucesso e ficar aqui com aquele seu namorado trombadinha, não vai ajudar em nada. Pelo menos lá você vai ter uma chance...

- Ter uma chance de que?

- De encontrar alguém muito melhor do que ele.

- Você só pode estar brincando comigo. - Me levantei.

- Solange, você merece ser alguém na vida. Não deixa ele estragar a sua vida! Eu soube que ele está pensando em abrir uma boate, que tipo de futuro ele tem pra te oferecer? - Lorenzo também se levantou.

- Aposto que vai ser um futuro muito melhor do que você quis dar para mim, a anos atrás, quando eu era ainda uma criança. - Encarei ele com uma chama nos olhos.

- Você ainda não me perdoou, não é mesmo?

Me virei de costas e ele puxou o meu braço.

- Me larga! - Gritei e todos ao nosso redor olharam a cena.

- Espera, Solange. Não faça assim, eu só quero o seu bem.

- Você não é o meu pai! Tira a mão de mim e me deixa viver em paz!

- Eu não vou deixar ninguém te afastar de mim, não vou. - Lorenzo tentou passar a mão em meu rosto, mas eu não permiti.

- Você que me afastou, a anos atrás. E o pior de tudo, você tenta agir como se fosse o meu pai, mas eu nem se quer te conheço mais. Até sua família fica estranha quando você está por perto - Coloquei o dedo na cara dele - Se a sua família que te conhece bem tem medo de você, por que eu deixaria você se aproximar de mim? Fica longe de mim!

- Você não era assim, Solange. Você só está agindo desse jeito por causa daquele moleque!

Sem pensar, dei um tapa na cara dele e o barulho ecoou por toda a biblioteca. Todos ficaram em silêncio e presenciaram a cena.

- Não vou permitir que você fique tocando no nome do meu namorado assim. Você não tem o direito e não tem a mínima moral para falar da conduta de vida dele! - Meu coração disparou e minha pele ficou ardendo, como se tivessem colocado fogo em mim - Afinal, ex presidiário e ex cracudo! Lorenzo, me poupe!

- Você vai se arrepender do que fez, Solange. - Lorenzo serrou os punhos.

- Vai se foder! - Sai de lá pisando em brasa.

Eu estava pouco me importando com o showzinho público que demos ali. Mas não podia deixar que o Lorenzo continuasse a insultar o Rick, que nem estava ali para se defender. No restante do dia, eu me isolei no meu dormitório e continuei mandando emails, sem me preocupar com as consequências dos meus atos.

Mais a noite, acordei assustada. Parece que eu ouvi um grito no meu ouvido, enquanto eu cochilava. Mas parecia um sonho, nada demais, então me levantei, tomei um banho e voltei para a cama. Fiquei vendo alguns animes antes de dar a hora de dormir, o meu celular vibrou e não parou mais. Mas eu ignorei todas as insistências, aumentei o volume do fone de ouvido e continuei vendo meus animes no computador. O tempo passou e eu cochilei novamente, dessa vez eu acordei com um estrondo na porta. Brenda entrou no quarto, assustada, com o olho arregalado e suada:

- Que inferno, garota! Por que diabos você não me atendeu? Mandei milhares de mensagens, fiz mais de duzentas ligações e nada!

- Caramba, eu só queria um pouco de paz. O que está acontecendo? - Me levantei com raiva.

- Sol, o Rick foi baleado na saída da academia!

- O que??? - Meu coração disparou.

- Faz mais de meia hora, ele foi levado para o hospital em estado grave!

- Você está mentindo pra mim! Para de brincadeira, não é hora disso! - Me desesperei.

- Você acha que eu estou brincando? - Brenda pegou o celular dela e me mostrou um vídeo.

Nesse vídeo eu pude ver o Rick no chão, com os olhos fechados e uma poça de sangue em volta da sua cabeça. Nesse momento, minha vista se escureceu e eu fiquei tonta, mas o desespero me acordou pra realidade e me fez sair correndo dali, sem dizer uma só palavra. Corri até o hospital, que não ficava muito longe do campus, mas o suficiente pra me deixar cansada. Eu não tinha nem trocado de roupa, estava de pijama e descalça. Eu só conseguia pensar nele, no meu Rick! O que fizeram com ele? Por que? Eu não conseguia entender.

Assim que eu cheguei no hospital, entrei correndo e vi o Michel, uns amigos do Rick e um policial, que provavelmente estava recolhendo informações. Fui direto no Michel, grudei da gola da camiseta dele e comecei a chacoalhar ele:

- Me diz o que aconteceu com ele! O que você fez com ele? Me fala seu desgraçado!

- Ei, eu não fiz nada! Eu estava com ele quando tudo aconteceu, Sol, se acalma! - Michel tentou me segurar pelos braços, mas eu o empurrei.

- Não vou me acalmar! Você estava lá, me diz o que aconteceu? - Gritei.

- Senhorita, se acalme. Estamos em um hospital. - O policial se aproximou de mim.

- Vou me acalmar é o caralho! Onde ele está? - Fui em direção a ala de consultórios do hospital, mas uma enfermeira me barrou.

- Você não pode entrar aqui!

- Meu namorado foi baleado, eu quero ver ele!

- Eu sinto muito, mas ele não pode receber visitas agora. Ele está muito mal, você vai ter que esperar, mocinha. - A enfermeira me segurou.

Nesse momento vi uma figura conhecida, era o meu tio, Renato.

- Tio! - Corri até ele e a enfermeira não conseguiu me acompanhar - Me diz que você atendeu ele, me diz que ele está bem, me diz que ele acordou!

- Sol, eu... - Meu tio Renato fez uma cara nada agradável.

- Tio, por favor! - O agarrei pelo jaleco e comecei a chorar sem parar.

Me ajoelhei no chão, gritei, chorei e nada parecia arrancar aquele desespero de dentro de mim.

- Sol, o seu namorado... Ele... - Renato gaguejou - Fizemos tudo o possível, mas ele teve morte cerebral. A bala acertou o cérebro dele, sinto muito.

- Não, não, não..... - minhas vistas se escureceram e eu desmaiei.

(Continua)

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