seis: caça

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"Uma criança queimada ama o fogo", Oscar Wilde, O retrato de Dorian Gray.


Taehyung jogou-se no banco de trás do carro enquanto o advogado da família sentava-se ao seu lado, em silêncio. O carro começou a se mover para longe do prédio do tribunal para menores infratores, e o adolescente imediatamente abriu a janela, sentindo o vento arrebatar seu cabelo e chicotear seu rosto. O advogado se mexeu, desconfortável, mas Taehyung não fez menção a fechar a janela. Ele podia sentir o corpo do homem ao seu lado se tensionar, e não por causa do vento.

Ele sabia que o advogado gostaria de lhe dizer algo, talvez inúmeras coisas, um sermão interminável para um garoto inconsequente e idiota de quinze anos, mas não diria nada, assim como não o fizera em todas as outras vezes que Taehyung havia precisado de sua ajuda, porque as conversas importantes eram reservadas para seu pai, Kim Sungwoong, e acabavam nunca chegando ao adolescente. Taehyung tinha certeza de que o advogado estava cansado de tirá-lo das recentes e crescentes encrencas em que se metia. Aquele homem costumava cuidar de coisas realmente importantes nas empresas de Kim Sungwoong e Kim Minsi, mas agora talvez se considerasse babá de um rebelde sem causa. Talvez odiasse Kim Taehyung e desejasse que ele fosse deserdado ou esquecido pela família. Quem sabe mandado para fora do país, onde tivesse de se virar sozinho sem criar problemas que precisavam ser escondidos para não virar escândalos públicos que prejudicassem a imagem das empresas. Era bem provável que nenhum cliente ou parceiro comercial visse com bons olhos uma empresa cujo herdeiro se envolvia em problemas violentos, um após o outro. Embora até sentisse um pouco de pena daquele advogado, a vontade de rir se sobrepunha em Taehyung quando pensava nele se considerando, frustradamente, uma mera babá cuidando de um garoto rico, mimado e problemático. Um filhinho de papai que havia nascido com colheres de prata na boca.

Taehyung passou a olhar para o borrão que se formava na janela conforme o carro avançava, sem muito interesse na paisagem da cidade, mas entediado com o silêncio do motorista e do advogado.

Naquela tarde, havia ganhado uma sentença de condicional no tribunal da vara de menores infratores pelo acumulado de pequenos roubos em lojas de conveniência; fumo, baderna na rua, longo histórico de faltas na escola e alguns casos de brigas em que se envolvia, todas como autor de violências exageradas para alguém de sua idade. Havia ferido gravemente dois garotos no ano anterior e sido expulso da escola pela recorrência de seu comportamento agressivo. Desta vez, tinha sido encaminhado para o conselho tutelar porque machucara um colega de classe com socos e um taco de basebol. Em dois anos, havia estocado um saldo considerável de ossos quebrados para sua conta, o que provavelmente lhe renderia uma sentença dura se viesse de uma família pobre. No entanto, sendo rico, Taehyung se divertia observando quantas infrações podia cometer e continuar saindo impune.

Taehyung não considerava que não existisse moral ou empatia dentro de si, porém, quando fora perguntado sobre o motivo de ter feito aquilo, ele permanecera em silêncio, como se não soubesse o que tinha feito nem as consequências de seus atos. Apenas sabia que estava errado e que nada justificaria tamanha reação, então preferira simplesmente não justificá-la. Ele não podia dizer que tinha gostado de colocar o taco de basebol sobre um dos ombros e encarar o garoto encolhido desajeitadamente sob seu pé, vendo-o chorar como um covarde. Não podia dizer que lhe tinha sido espantosamente eletrizante e satisfatoriamente bom; que gostara de observar o sangue escorrendo do nariz alheio, rasgando a bochecha em direção ao chão, que havia adorado apertar o pé com mais força contra o peito daquele menino e vê-lo murmurar algo rapidamente, mais alto daquela vez. Não diria também o que ele tinha feito, nem o quanto lhe dissera "desculpe" desesperadamente, em prantos, e que era óbvio que havia pedido desculpas apenas por medo de ter a cabeça explodida com um taco de basebol.

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