doze: dilaceramento

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este capítulo é mais curto e focado inteiramente no passado~~

"Ainda estou lá, na frente daquelas crianças possessas, à mesma distância do mistério. Jamais escrevi, acreditando escrever, jamais amei, acreditando amar, jamais fiz coisa alguma que não fosse esperar diante da porta fechada", Marguerite Duras, O Amante.



Taehyung acordou no meio da noite, perdido. Seus olhos se abriram e seu cérebro simplesmente acordou, sem pesadelos ou sustos. Ficou encarando o teto levemente iluminado pela claridade da noite que atravessava as cortinas leves. Foi preciso alguns segundos para se lembrar de que estava na casa de campo, de férias com a família, e que não precisava ir à escola na manhã seguinte. Fechou os olhos e se aninhou de lado, tentando dormir outra vez, mas não conseguiu. Tinha perdido o sono.

Saiu da cama, então.

Passou pela porta fechada do quarto de seu irmão mais velho, sem se deter nela, e caminhou direto para o quarto dos pais, esperando encontrá-los, mas deparou-se com a cama vazia. Voltou, desta vez parando em frente ao quarto onde Jihyun estava hospedada. A porta também estava fechada, e Taehyung pensou em abri-la e espiar a moça, mas acabou recuando e percorrendo o corredor até o quarto da irmãzinha, cuja porta estava aberta.

Uma luz amarela e aconchegante vinha de uma pequena lâmpada conectada à tomada. Não iluminava o quarto o suficiente para ler livros, mas era o bastante para espantar o medo que Lisa tinha do escuro. A luz alcançava fracamente o corredor, porque a tomada era longe da porta, estando mais próxima à cama. Quando finalmente entrou, Taehyung viu a mãe dormindo profundamente ao lado da irmãzinha.

Ele andou até elas, em completo silêncio, e ficou parado ao lado da cama, encarando Lisa por longos segundos, prestando atenção ao seu rostinho com traços de neném e seu cabelo preto e curto. Quando Taehyung a olhava bem, percebia que ela não se parecia em nada com seus pais, mas já não se lembrava mais de que a irmã era adotada, e sua família não falava mais sobre isso.

Durante o dia, não eram poucas as vezes em que Taehyung tinha forte vontade de beliscá-la e vê-la chorar, principalmente quando ela o seguia para cima e para baixo. Ela era irritante, tão irritante que sua vontade era empurrá-la e gritar para que fosse embora, vendo-a fugir dele com medo como os pássaros faziam nas caçadas, mas desde a última vez que havia machucado alguém, seu pai o havia repreendido de forma tão assustadora que Taehyung tinha escolhido ficar em silêncio e ignorar Lisa sempre que ela o seguisse como um animalzinho domesticado. Embora quisesse muito ficar sozinho, tinha que suportá-la pacientemente para não ter que ouvir seu pai outra vez.

Taehyung saiu do quarto e desceu as escadas. Os abajures da sala estavam acesos, assim como a luz da cozinha, mas ao chegar lá esperando encontrar o pai, deparou-se com o cômodo vazio. Lembrou-se do escritório onde Sungwoong passava a maior parte do dia, mesmo nas férias, e resolveu procurá-lo lá.

Antes mesmo de chegar, pôde ver o facho de luz que passava pela pequena fresta da porta. Ele se aproximou, colocando as mãos na batente da porta, e encaixou os olhos na abertura, curioso. Talvez o pai tivesse caído no sono sentado à mesa, como já tinha feito antes, e precisasse que alguém o acordasse e o lembrasse de ir para a cama.

A cadeira e a mesa estavam vazias. Taehyung espiou melhor e franziu a testa quando seus olhos encontraram a figura de Jihyun.

Ela estava encostada à parede, e conforme a cabeça do garoto se virou para vê-la melhor, o corpo de seu pai também entrou na cena. Sungwoong pressionava a jovem contra a parede, segurando-a com força, apertando-a nos braços, sobre as mangas compridas de seu vestido preto.

Taehyung percebeu que Jihyun exibia uma expressão de dor e entendeu que seu pai a estava machucando ao apertá-la. Ele não entendeu o que estava acontecendo e não soube como agir. Sentiu uma vontade atroz de continuar ali, escondido em silêncio, para ver o que seu pai ia fazer com Jihyun. Estava realmente a machucando? O que estava acontecendo? Ele se perguntou por que seu pai estava fazendo aquilo depois de dizer tantas vezes que Taehyung não devia machucar os outros.

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