As estrelas
Capitulo 69
As estrelas brilham para todas às criaturas de Deus.
Basta levantar os olhos para o céu nas noites escuras sem o luar prateado, lá estarão elas!
Cintilando e louvaminhando o criador supremo.
Na estrada...
A noite cai de mansinho e o machado do negro Leôncio para sua batida quando o ultimo galho seco esta picado e amontoado. O garoto que lhe trouxe o prato de comida se aproxima com outra refeição para o negro.
- Minha mãe disse que você é um negro trabalhador, se fosse outro negro teria saído de fininho logo após comer.
- Não duvido disso, porém sou um homem de palavra.
O garoto branquinho de olhos azuis feito o mar em dia ensolarado, sorri alto.
- Porque você está rindo, garoto?
- Você disse que é um homem!
- Ora, sou homem! Veja, tenho barba, voz grossa, tenho força, uso calças.
Garanto que isso faz de mim um homem.
- Não é o que meu pai diz.
- O que seu pai diz?
- Diz que você é negro, não homem.
- Sou um homem negro. A cor da minha pele não difere meu sexo.
- O que é isso?
- Isso o que, garoto?
- Sexo?!
- Sexo, sexo é ... bom, é a palavra que dá a diferença entre um homem e uma mulher...
O garoto que está assentado sobre um tora de lenha, olha para o alto e coloca sua mão no queixo e medita por alguns instantes:
- Não sei de nada disso.
A mamãe disse pra você comer e que pode dormir no coberto do cavalo.
Logo após dizer isso,
sai andando vagarosamente para os lados da porta da cozinha.Leôncio vai até o poço, joga a corda com um balde dentro do buraco escuro e mal coberto.
O sarilho desce rápido desenrolando toda a corda, após o balde encher com agua é puxado para cima, vem balançando e derrubando água por todos os lados.
Despeja a água em uma velha bacia de madeira que está sobre uma tarimba.O negro lava o rosto, joga agua em seu corpo, lava os braços, se assenta no mesmo troco em que o menino havia se assentado. Logo após terminar de comer, caminha para o lado onde se encontra o coberto para o cavalo.
Deita-se sobre uns sacos de estopa grossa, olha para o céu totalmente estrelado e lagrimas quentes descem de seus olhos.
Vem à lembrança os tempos de escravidão, seus dias no pelourinho e no foço.
Recorda de seus filhos e de sua amada Ayana, vem lhe à memória o rosto de Samuel...
Seu coração bate acelerado. O homem pacato tem pensamentos de ódio e vingança, não existe no universo inteiro algo ou alguém que provoque esse sentimento tão sombrio em Leôncio.
As estrelas estão tão belas...
_ Sei que em minha pátria vocês brilham igualmente aqui, queria tanto sair desse pais, desse maldito império! Viver com minha amada e meu filho longe desse inferno!
Meu Deus, perdoe-me, mas não consigo deixar de odiar aquele monstro assassino...
Não consigo.
E adormece, pois o cansaço tomou conta de seu corpo.
No sitio...
A noite está chegando de mansinho e na imensidão da mata os sapos coaxam, os grilos cricrilam. Ayana chega à porteira a abre e entra segurando as rédeas do cavalo, antes de fechar a porteira vê um cavaleiro se aproximando; ela teme, porém após o cavaleiro pedir para que deixe a porteira aberta para que possa passar, Ayana o reconhece.
- Ayana, por favor na feche a porteira.
- Senhor, Damião?
- Sim, fui à vila e estou chegando agora.
- Confesso que fiquei amedrontada. Sinto-me insegura nessa escuridão, depois do que ocorreu com o negro Mané.
- Deveras, é realmente impossível não temer essa escuridão.
Da porteira até a casa é um curto caminho, isso faz com que eles caminhem puxando os animais.
- Conseguistes descobrir algo sobre seu marido?
- Creio que ele foi para à capital, o Senhor Samuel tem absoluta certeza, por isso, seguiu para lá.
- Ayana, antes que cheguemos à casa quero te dizer algo e peço que não conte a ninguém, pelo menos por enquanto. Posso contar com sua discrição?
- Claro que sim! sou-lhe grata por tudo quanto fazes por mim e por Gabriel...
- Tirei o menino do orfanato e o deixei com uma família para cuida-lo.
- Fico muito feliz! O menino merece uma chance.
- Não diga nada, vamos ver como será daqui para frente.
- Não direi, jamais.
Senhor Damião pega às rédeas do cavalo de Ayana e leva os dois animais para solta-los no pasto.
Ayana chega e conta tudo o que ocorreu durante o jantar.
Conta sobre o dinheiro e a viagem que fará até à capital.
Catarina fica triste, vai para seu quarto e chora.
Ayana vem conversar com ela e consegue acalma-la.
Na Capital...
José Jerônimo vai até a estação de trem e parte para a fazenda da baronesa Octaviana.
Ele resolve os problemas e consegue um gerente e um amigo advogado para que possam fazer a divisa das terras para os negros que quiserem trabalhar e constituir família.
Quando está na cidade onde a fazenda se localiza, fica sabendo de um quilombo onde ouve várias mortes de negros, mulheres e crianças.
Doutor José se interessa em conhecer os irmãos ex: escravos e quem sabe, dividir as muitas terras da fazenda da baronesa entre os negros sofridos do quilombo Lyding.
Lyding em africano quer dizer: _ Sofrimento.
- Aonde fica esse quilombo?
- Creio que fica a algumas léguas da cidade. Após a libertação, os negros foram se reunindo e aglomerando onde desse, os que quiseram se manter nas cidades se amontoam pelas ruas, outros preferem o campo para plantar seus alimentos, outros se misturam aos bons e praticam toda sorte de crimes...
- Gostaria de incluir esses negros do quilombo para o recebimento das terras, pois eles já cultivam terras que não são suas e se as possuírem, creio que cuidarão e zelarão por ela.
- Eu também acredito que esses que já trabalham com a terra em vez de ficarem nas cidades, conseguirão sobreviver muito bem em suas próprias terras.
Digo mais, essa bondade da baronesa tirará muitas pessoas da mais profunda indigência.
- É claro, estenderemos para os que vivem na cidade também!
- Claro! Está certo, creio que muito em breve faremos as inscrições e a distribuição. Tudo dará certo e amenizara o sofrimento de muitos.
- Não podemos fazer muito, porém, o pouco feito com amor e respeito vale bem mais.
Quero conhecer esse quilombo. Irei amanhã e peço que o senhor me acompanhe.
- Farei melhor, convidarei o gerente e o funcionário da baronesa, assim, ficaremos cientes da quantia de pessoas e também o que poderemos fazer para agilizarmos o quanto antes a divisão das terres.
- Ótimo! Amanhã de manhãzinha partiremos.
Maria Boaventura.
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Espinhos da Liberdade
Ficção HistóricaApós a abolição da escravidão, muitos escravos libertos se viram sem rumo, sem perspectiva. Saíram sem nada, a não ser, suas vidas errantes pelos caminhos desconhecidos do destino. A liberdade tão sonhada, transformou-se em espinhos. Uma nova, velha...