Festa no paraíso

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O leão, quando ainda é um filhote, está sob o conforto do pai e da mãe. Tem neles o apoio para iniciar a sua trajetória: os primeiros passos, a solução dos primeiros medos, o rompimento das fronteiras iniciais, o desafio aos limites.

O pequeno leão que corria animado, os pés descalços voltando da creche, segurava o papel com a nota boa, a mais alta da escolinha, estava louco para mostrar o resultado à sua mãe. O assunto que ele aprendera na escola deu resultado: a nota boa. Sua mãe dizia sempre: podia estar de pés descalços, mas deveria estudar e ser um homem bom e honesto.

Quando o filhotinho se aproximou do pequeno lar onde ele vivia com a leoa, encontrou a sua mãe precisando de um pouco de atenção e de carinho. Ela estava cansada, muito cansada. Trabalhava demais, recebia de menos, o mundo parecia pesar sobre suas vidas, e por muitas vezes, ela queria desistir.

- Mamãe! Tirei nota boa em matemática!

A vozinha do filhotinhodizendo "mamãe" era o que a salvava. Todo o cansaço, a dor,a desilusão de uma vida que parecia cruel a chicoteando todos os dias, sedissipava quando ela ouvia a voz de seu filho. Sentada no estrado de madeira quefazia as vezes de sofá, ouvindo música no rádio de pilha, a única coisa quemudava o seu humor para algo feliz era a voz de seu filho.


Leon Santiago visitou mais uma vez o Bairro da Paz, onde passou algumas horas conversando com a diretora da escola estadual no bairro. Ele tinha uma proposta vinda do setor de Responsabilidade Social do Conglomerado Manfredi (uma posição que ele acumulava dentro da organização), que envolvia uma parceria entre a empresa e a escola na criação de laboratórios para atividades ligadas a engenharia e construção civil - tentando juntar a relação que Leon tinha com o conglomerado com o futuro daqueles jovens.

- Antes, obviamente, vamos conversar com a Secretaria de Educação para reforçar essa PPP. Sei que demora bastante por causa de licitações, mas com o projeto em mãos e ajustado, podemos insistir para que a assinatura seja realizada em tempo. Odeio essas coisas... – resmungou, coçando a barba – Mas terei de colocar meu sobrenome na roda.

Ele e a diretora caminhavam pelas instalações da escola, silenciosa àquela hora do dia. O motivo era porque os alunos se encontravam em aula.

- A ideia é reformar aquele galpão e fazer um laboratório, completando as aulas que eles já têm em sala de aula. Posso conversar com os professores, negociar como podemos inserir cursos de jovem aprendiz, fazer um link com a Manfredi...

- Essa é uma boa ideia, Leon. – sorriu. - Eu fico feliz e muito satisfeita que você saiu do bairro, mas o Bairro da Paz não saiu de você. Só fico triste que não seguiu a carreira de professor. Ainda me lembro de você com 14 anos, em sala de aula, gritando pra todo mundo que ia dar aula.

- Eu não queria ser professor de matemática. Eu odeio matemática.

- Mas seria um excelente professor do mesmo jeito. Enquanto você conversa com a secretaria, vou tentar falar com gente de lá também e me reunir com os professores. Os meninos vão amar!

O objetivo do projeto desenvolvido por Leon era levar aos adolescentes que ainda tivessem dúvidas sobre sua profissão a possibilidade de, através do projeto, das atividades extras de engenharia e construção, conhecer uma área bacana e incentivá-los para ingressar em uma faculdade. Todos tinham direito a realizar seus sonhos, e ele era um grande exemplo disso. Leon só não queria dizer àqueles meninos que, para ter o diploma que ele possuía, ele acabou estudando durante o Ensino Médio em um dos melhores colégios de Salvador.

Eles só precisavam saber que um moleque nascido na Invasão das Malvinas tinha conseguido chegar lá.

Leon continuou conversando com a diretora e trocando ideias sobre como seria o projeto, até que eles perceberam a movimentação na rua. Pessoas corriam de um lado a outro, tensas, e conversas em voz alta e tom de revolta.

O Leão e a OvelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora