Capítulo 43

1.6K 186 4
                                    

Douglas foi mais rápido do que pensei. Em menos de uma semana ele me levou para uma nova casa, e nesse tempo em que tive que ficar trancada, Lucas esteve comigo o tempo inteiro, exceto quando era levado para ver a avó.

Não só eu, como ele também percebeu alguns homens circulando a casa, e isso nos fez ficar em alerta, porque ainda pairava a ameaça chamada Rocha, e também policiais corruptos que segundo ele, queriam sequestrar integrantes do bando ou até mesmo familiares, a fim de obterem uma parte da grana.

Dinheiro maldito que nunca trará paz. Mesmo vendo o esquema deles como algo perfeito na teoria, sempre haverá uma falha, e eu temo por ser eu, essa felizarda.

Não ousei pôr a cara na rua, ali mesmo recuperei a saudade que estava do meu bebê, e pude colocar meus pensamentos em dia. Quando tudo isso passar, quero tentar um novo futuro, quando toda essa ameaça não estiver sobre mim, quero ser alguém em minha vida. Infelizmente agora eu dependo de toda a influência que Douglas tem neste mundo para poder respirar.

Muitos podem até achar que eu tenho alternativas, mas quais? Quando eu me criei em uma favela, tenho ligações pessoais com bandidos influentes, mesmo que eu nunca me vangloriasse disso. Se eu me apresentasse e os denunciasse, correria o risco de ser exonerada por parecer uma infiltrada do crime, isso, se a sorte me sorrisse e eles próprios não me entregassem para a família. Se eu permanecesse no crime a retaliação que Rocha está me infligindo não ia ser nada comparada ao que viria.

Eu pensei em mim, eu pensei em meu filho que não merecia crescer sem mãe, quando já foi negligenciado uma vez. Estava me auto anulando sim, para que ele tivesse uma oportunidade, e para mim, nunca seria tarde, porque se eu tive garra para me reerguer duas vezes, eu completo a terceira, quarta, quantas vezes forem necessárias. O que eu não posso é desistir de mim, do meu filho.

**********

— É linda – disse, observando o quintal da casa.

— Com o tempo você muda o que quiser, é tua e do meu filho.

— É temporário, Douglas.

— Não é, Mariana. Assim como eu não vou permitir meu filho sair da minha vida, não vou permitir você também.

Sim, admito apenas para mim mesma que estava balançada por ele, e que essa proteção que nunca recebi tem me confundido, e que agora neste momento, o que eu queria era respirar em paz. Se para isso,eu precisasse evitar discursões entre nós, eu faria.

Fui olhar a casa e era de dois andares, não foi surpresa quando descobri ser na mesma rua da Adriana. Ela não falou comigo desde que voltei, também não recebi ameaças de sua parte, o que já deve ser um avanço.

Em partes, eu até a entendo, porque a repulsa que tenho por cafetões, ela tem por policiais. Na mesma proporção que eu sofri, vendo esses homens levarem a minha mãe para a prostituição, a fim de sustentar seu vício e destruir a sua vida, ela viu seu filho e seu marido serem torturados de maneira brutal. E o que eu me tornaria, representava isso na vida dela.

Não me vanglorio também do que fiz por Douglas, fiz o que meu coração achava certo, mas se isso a fez ver que eu sou diferente, agradeço.

Ela é o tipo de mulher em quem eu queria muito me inspirar, por sua garra, determinação, força para se sobressair quando um problema fodido bater à sua porta. A maneira amorosa como ela trata os filhos, porque agora Lucas ocupa esse cargo. Seria o tipo de mãe que eu queria ter em minha vida, já que nunca soube o que é isso.

Explorei o máximo que pude da casa e amei cada canto. Era tudo muito privado e sei que era afastado da favela. A rua era monitorada por câmeras e havia sempre dois homens que mantinham a guarda.

Os únicos pedidos de Douglas foram para que eu não saísse desarmada ou desacompanhada. Como eu amo minha vida e agora não tinha nada o que fazer, seguia obediente.

Lucas amou o quintal que era bem espaçoso e aqui dava para jogar bola livremente, algo que fizemos naquela tarde mesmo. Foi divertido poder estar presenciando estes momentos em sua vida e saber que Douglas fazia questão de vivenciar cada segundo conosco.

**********

— Sim eu sei mãe, eu vou falar com ela, e ela decide o que fazer — disse Douglas à mãe.

Eu estava arrumando a janta, enquanto ele estava em seu celular resolvendo seus assuntos e Lucas estava no tablet que ganhou da avó. Até que Adriana ligou, ele me mostrou o nome dela na tela do celular e sorriu.

Já disse que as portas da minha casa estarão sempre abertas, cabe a ela entender que o que passou, passou, e nada pode ser desfeito. Ele não precisa me falar sobre qual assunto porque eu até sei.

— A senhora que é teimosa, poderia falar isso a senhora mesma.bom,bom, dona Adriana. Já te ligo.

Ele não desligou, colocou o celular na bancada e me encarou.

— Eu nunca faço festa, prefiro eu e ele sair e comer algo que goste bastante, claro que dentro do seu limite e vamos fazer algo diferente.

— Porque você nunca fez festa? — Fez uma cara de indignado.

— Porque eu não era amiga de ninguém, e não ia convidar as pessoas, só pra elas virem comer e sair falando mal. Preferi pegar o dinheiro e sair só nós dois pra fazer algo legal. Já fomos até num parque de diversão gigante no interior, não é filho?

— Nós vamos no parque de novo?

— Você quem vai decidir.

Olhei para Douglas com cara de "viu?", criança ainda não entende essas coisas e eu estava em uma fase que deveria me preservar e preservar meu filho.

— Vou falar com dona Adriana para chamar os filhos da rapaziada e fazer um negócio aqui mesmo, pode ter muita exposição não.

Se era algo pequeno, eu concordava,até porque os meninos do bando são gente boa.

VIDA REALOnde histórias criam vida. Descubra agora