Capítulo dois

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Seis meses depois

Eu estava em casa, na casa que cresci e vivi toda a minha infância.

Eu não fazia ideia de como aquilo era possível, onde estava o porão de Nico?

Caminhei pelos corredores e escutei uma voz infantil.

A minha voz de quando eu tinha oito anos. Notei que a voz vinha do quarto de Marina, então entrei silenciosamente, mas eu sabia que a Anna do passado não me veria.

Eu sempre fui invisível.

— Entendo que você seja muito fofinha. — A Anna de oito anos falou com um longo suspiro, naquele dia os meus cabelos ruivos estavam presos em duas tranças que Valentina havia feito em mim e eu estava banguela de um dos meus dentes da frente. — Você é muito fofinha. — Ela falou enquanto brincava com a mãozinha de Marina. — E também muito parecida comigo, mas isso não é motivo para a Valentina não querer brincar quando eu a chamo.

Notei que os olhos da Anna criança estavam cheios de lágrimas.

— Você se tornou a princesinha do papai. — Algumas lágrimas escorriam por sua bochecha gordinha. — E agora ele não tem mais tempo para andar comigo nos seus ombros.

A Anna criança deu um longo suspiro e a Marina bebê fez um barulhinho, eram risadas. Aquilo fez a Anna parar de chorar e ficar presa naquela risada.

Lembro-me que eu nunca havia ouvido um bebê rir e a primeira vez que isso aconteceu foi com Marina.

— Você está rindo do meu sofrimento?

A minha risada infantil tomou conta do quarto, e meus dedos pequenos e magros tocaram no braço de Marina, contudo, minha irmãzinha se assustou com um barulho do lado de fora e começou a chorar. Lembro-me que entrei em desespero, acreditei que eu pudesse ter feito mal a ela, mas antes que eu pudesse fazê-la parar de chorar, minha mãe saiu do banheiro e olhou a cena com os olhos brilhando de raiva.

Eu nunca compreendi o porquê dela sentir tanta raiva de mim.

— Você a está machucando, sua peste?

A Anna criança deu um salto com o grito da minha mãe e nesse momento o choro de Marina se fortaleceu. A mesma sensação de culpa tomou conta do meu peito, porque eu acreditava ter realmente machucado ela, mas, na verdade, minha irmã só assustou, e com o grito da minha mãe Marina ficou mais agitada.

As unhas da minha mãe se cravaram no braço da Anna criança e olhos idênticos aos meus a encararam de volta.

Observei a cena atônita, completamente agoniada.

— Se eu contar para o seu pai que você é perigosa, ele te joga num manicômio, então suma daqui, sua imprestável. — Ela soltou a pequena Anna que saiu correndo porta afora.

Aproximei-me da minha mãe, que pegava Marina no colo e tentava fazê-la parar de chorar.

— Por que você me odeia tanto? — Perguntei baixinho. — Mesmo você sendo má comigo, eu não pensei duas vezes em matar o papai quando mentiram para mim que ele a violentou, a matou. — Sequei minha bochecha. — Pensei que você me odiasse pelo que ele fez, hoje eu não acredito mais nisso.

Um barulho de correntes e portas batendo me fez dar um pulo.

E então eu acordei.

* * *

Acordei com uma terrível dor de cabeça.

Não era sempre que eu conseguia lutar contra a vontade de dormir, então quando isso acontecia eu acabava tendo pesadelos envolvendo o meu passado, normalmente com a minha mãe.

A Traidora da 'Ndrangheta - Os Mafiosos, 4Onde histórias criam vida. Descubra agora