Me perdoe

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Uma semana depois

O retorno de Kepa à rotina com o time não foi tão fácil quanto pareceu inicialmente. O goleiro precisou recuperar a forma física com treinos mais extensos por ter perdido vários dias da pré-temporada. Mesmo com o esforço adicional, sentiu-se feliz por voltar a fazer o que amava.

Ele ficou motivado com o apoio dos amigos mais próximos no time, mas sabia ainda faltavam muitas coisas — inclusive alguém que mexia com o coração dele. O espanhol tentou ignorar a saudade que sentia de conviver com Jorginho, mas volta e meia lembrava o quanto o outro fazia com que ele se sentisse seguro e capaz de qualquer coisa.

Sem o brasileiro, Kepa precisou reaprender a ficar sozinho, a cozinhar para um só, a tatear a outra metade da cama e a encontrar o colchão frio com um ou outro travesseiro fora do lugar. Então ele decidiu dormir na sala. Talvez em outro ambiente não lembraria tanto das noites difíceis em que teve um abraço e uma companhia para acalmá-lo.

Mas cada canto da casa lembrava Jorginho. Cada detalhe. Cada lugar. Então Kepa começou a sentir que estava desmoronando novamente.

Para piorar a situação, a viagem para Belfast seria na manhã seguinte. Ele não estava preparado para a Supercopa. Não queria ver os olhares de piedade vindos dos outros, mas não teria outro jeito. Simplesmente não havia escolha.

A possibilidade de conquistar mais um título o deixou levemente animado, mas o sorriso se desfez quando lembrou que era o goleiro reserva e dificilmente jogaria.

Restavam duas coisas que o espanhol não havia perdido ou estragado por conta do luto: a família e a carreira. Só que ele sentia o trabalho por um fio a cada janela de transferência, quando tentava se preparar para outro desafio caso o time decidisse um empréstimo ou aceitasse uma proposta definitiva de venda.

Kepa pensava nas incertezas sobre o futuro dele no futebol. Toda vez que o período de transferências fechava ele se sentia aliviado porque gostava do time e das amizades que construiu ao longo do tempo, mas nunca era o suficiente. O simples fato de permanecer em Londres não dizia nada e não garantiria a vaga entre os titulares. Nenhum jogador gostava do banco de reservas. Era como ver a vida e o melhor dela passando e acontecendo bem à frente dos olhos — e o pior também, já que uma derrota ou eliminação costumava gerar o sentimento de que poderia ter feito mais pela equipe.

Para o bem ou para o mal, ninguém gostava de ser uma alternativa. Nem mesmo ele, que aceitou e entendeu as decisões pois queria o melhor para o time. E se o espanhol não estava no melhor momento da vida e da carreira, o ideal era ficar entre os reservas — mesmo que doesse um pouco.

Tudo bem. Seria temporário. Mas então Mendy assumiu a posição muito bem. Para uma torcida e para parte de uma comissão técnica que viu Kepa como o principal responsável pelos resultados ruins — quando o sistema defensivo como um todo não estava 100% — o novo goleiro fez com que todos se esquecessem da breve inconsistência do espanhol.

A esperança de voltar a ser titular com frequência diminuiu pouco a pouco, mas ele procurou dar o melhor de si nos treinos. Por algum tempo teve a sensação de que nada daria certo, já que tentou, de inúmeras formas, mostrar que estava pronto. Em um dia triste, o goleiro decidiu que não se esforçaria por algo que não era visto ou reconhecido. Além da traição descoberta nas semanas anteriores, ele também teve que lidar com o possível fato de ser um dos jogadores mais fracassados na história recente do futebol.

Cartas | Kepa ArrizabalagaOnde histórias criam vida. Descubra agora