Não faça isso

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No outro dia

Kepa não se sentiu suficientemente corajoso para sair de casa e sequer pisou fora do quarto. Levantou, foi ao banheiro, lavou o rosto e voltou para a cama, onde ficou sentado por vários minutos. Na cozinha desde o meio da manhã, Jorginho já havia preparado o almoço e subiu as escadas para chamá-lo mais uma vez.

— Coma alguma coisa — ele se sentou ao lado do espanhol. — Amore mio... você não pode ficar aqui para sempre.

— Não estou com fome.

Os dois se mantiveram em silêncio e observaram a chuva que caía do lado de fora. 

— Passei quase três horas preparando o assado de carne que você gosta — ele estendeu a mão para o goleiro, que abaixou a cabeça. — Venha. Preparei torradas com ervas e molho de tomate com pedaços... é tudo que você gosta.

— Jorgi, comida não vai trazê-la de volta.

— Eu sei, mas hoje nós temos que cumprir uma das vontades da Isa e preciso que você coma antes de fazermos isso. Nem mesmo o cheiro do almoço te deixou com fome?

— Não. Me perdoe — Kepa ficou desapontado e olhou para o chão.

— Tudo bem, eu guardo para o jantar — Jorginho forçou um sorriso. — Quando você vai a Bilbao para jogar as cinzas da Isabel no mar?

— Ainda não sei. Talvez amanhã...

O brasileiro o abraçou. Não quis fazer mais perguntas e decidiu deixá-lo em paz.

— Bom, eu vou guardar o almoço na geladeira e esperar por você na sala. Use o tempo que precisar para se arrumar, mas lembre-se que precisamos ir ao Tâmisa.

Jorginho saiu do quarto e voltou ao primeiro andar da casa. A campainha foi tocada e Jorginho abriu a porta. Kovačić entrou agitado.

— Está tudo bem, Kova?

— Acho que preciso de...

— Um abraço — o brasileiro completou a frase. — Vamos lá, Mateo... ninguém aqui precisa esconder que está triste.

Os amigos se abraçaram enquanto o croata engoliu o choro. Ele havia se afeiçoado muito a Isabel nos meses anteriores e ficou decepcionado com a partida dela.

— Imagino que o Kepa esteja isolado.

— Sim. Até preparei o almoço, mas ele sequer saiu do quarto — Jorginho mordeu os lábios, chateado com a situação. — Não sei o que posso fazer.

— Já disse que não precisa se preocupar tanto. Onde está a comida? — o goleiro apareceu na sala vestido para sair, mesmo desanimado. — Ah, oi Kova.

— E ai, cara? — o croata o cumprimentou com um aceno de mão.

— Vamos para a cozinha. Sorte sua que eu ainda não guardei — Jorginho disse ao espanhol e foi até o forno. Ele foi seguido por Kepa e Mateo.

Os três comeram e saíram no meio da tarde. As ruas já estavam secas, mas as nuvens pesadas denunciavam que mais chuva poderia cair a qualquer momento. A brisa quase gelou o rosto deles, que revezaram ao transportar a urna com as cinzas de Isabel até o rio que a deixava encantava nos poucos dias ensolarados da capital inglesa.

Cartas | Kepa ArrizabalagaOnde histórias criam vida. Descubra agora