34 - Ele voltou

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Julian

—O quê? Eu ouvi direito? Como assim voltar pra Colômbia?

Juanito respirou fundo, como se o que ele estivesse prestes a dizer fosse uma dor absurda pra ele.

—Desde la briga com o Renan, venho recibiendo muchas ameaças. No sé si lo sabes, hermanito, pero el padre de Renan es policía.

—E o que tem haver o pai dele ser policial? —perguntei confuso.

—Soy un extranjero ilegal en Brasil, hermanito.Toda mi familia es ilegal, Estamos en risco de ser deportados.

—Juanito isso é muito sério. Tem certeza do que está falando?

Juanito me mostrou um áudio do pai do Renan.

—"Tô com todos os seus dados em mãos colombiano safado, já descobri que vocês estão de forma ilegal do Brasil, você vai pagar por tudo que fez ao meu filho, delinquente."

Foi como um soco no peito.

—Todavía ainda não disse nada a mis padres, nem para Rosita. Tengo miedo de que me denuncie, y mi familia pague por mi erro.

—Por isso estava com tanto medo quando acabou batendo muito no Renan... —eu disse me lembrando de cada detalhe daquele dia.

—Estava com miedo de ser levado a policía y ser descoberto, mas no sirvió de nada, terminé teniendo la desgracia de brigar com hijo de un policía. Mis padres siempre me ensinaram a caminhar derecho, hermanito...Se sentirán decepcionados.

—Mas eu não entendo, vocês estão aqui há quase 3 anos e ainda não tem o visto permanente? Por que nunca me contou?

—Quando chegamos aquí, tínhamos 90 días para legalizarnos, pero no podíamos pagar, Raices Colombianas tardó mucho en começar a trabajar, nosso prazo ya había pasado, Se tentássemos fora do prazo, poderia acontecer uma deportação... E os anos se passaram e esse assunto foi esquecido.

—Calma manito, nós vamos achar uma solução pra isso.

—Estoy pensando en dizer tudo a mis padres y volver a Colombia o mais rápido possível.

—Você não pode voltar, manito. Sua vida é aqui agora, você lembra como era difícil se manter no seu país, você mesmo disse que ama o Brasil. Nós vamos dar um jeito, acredita em mim, na verdade, eu já pensei na solução.

—Espero que de certo, hermanito. Seja lá o que for que tenha pensado.

Eu também espero.

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Kira

Só há uma coisa capaz de acabar com qualquer tipo de pensamento racional que possa existir na minha mente, minha família.

Enquanto eu me arrumava pra ir pro raices no fim do treino, o meu celular tocou, imaginei que fosse o Juliano me apressando, mas era minha mãe.

Atendi imediatamente.

Não deu tempo de falar a primeira frase, pelo respirar e tom de voz da minha mãe eu sabia que ela estava em completo desespero.

—Filha, ele voltou. —ela dizia arfando, como se estivesse correndo há alguns segundos.

Meu coração acelerou.

Ele.

A minha mente só pensava em um nome. Eu só não conseguia dizer devido ao filme da minha infância que passava pela minha cabeça, mas a confirmação veio logo em seguida.

—Fernando. O pai do seu irmão. Ele está aqui. —ela dizia com voz de choro.

O meu ex-padrasto causou em mim muitos traumas. Aquele homem quase destruiu a minha família.

Quando eu o vi pela primeira vez, lembro que senti que ele não era confiável, mesmo trazendo briquedos e doces com um sorriso estampado no rosto, eu sabia que o "tio" que minha mãe estava me apresentando seria um problema, e foi.

Ele bebia muito, chegava em casa se rastejando mas ainda tinha força pra bater na minha mãe. Era ciumento e certamente doente, ele inventava situações na cabeça dele e acreditava fielmente nelas, certa vez aquele ser desprezível disse que eu o roubei, ele havia perdido 50 reais na rua e a culpa disso tudo caiu sobre mim, foram minutos apanhando por algo que não fiz, minha mãe tentava me defender em vão. Eu era apenas uma criança.

Esse verme abandonou o tom e felizmente nós conseguimos nos livrar dele, não fez falta alguma, eu só queria que ele estivesse morto.

Me recompus, apesar de estar abalada com aquela informação.

—Onde você está? —perguntei engolindo seco.

—Estou longe dele, escondida em uma loja de conveniências. Fui buscar o Tomás nas escola e avistei ele de longe rondando a nossa casa, eu voltei o mais rápido que pude com o Tom.

—Cadê o Tom, ele percebeu algo?

—Está entretido olhando os brinquedos, não sei ao certo se percebeu, acho que sabe que não estou bem, mas não sabe do pai. Filha, eu estou em desespero, não posso voltar pra casa.

—Respira, eu vou dar um jeito nisso, eu vou trazer vocês pra perto, eu só preciso que ache um lugar pra ficar hoje, um hotel, pousada, qualquer coisa, só por essa noite, eu vou te mandar o dinheiro necessário.

—Eu estou com muito medo. —ela confessou em lágrimas.

—Ei, eu vou te tirar dessa, eu prometo. —afirmei. 

Ouvir o choro abafado da minha mãe ao telefone era como um tipo de tortura.

Ouvir a voz do tom de fundo perguntado o motivo dela estar chorando, era pior ainda.

—Me deixa falar com o Tom. —pedi.

—Oi Kira. Sou eu, o Tom. A mamãe está chorando, mas eu não sei o que é. —ele disse partindo meu coração em vários pedacinhos.

—A mamãe está emocionada porque eu dei uma boa notícia pra ela. —eu disse evitando chorar.

—Que notícia? —sua voz se animou.

—Que eu vou trazer vocês pra perto de mim. —eu disse sentindo um nó na garganta.

—Iupiii!!! Eu estou tão feliz! Eu mal posso esperar pra te ver de novo!

A empolgação dele me fez sorrir por alguns instantes.

Mas o sorriso logo deu lugar a minha cara de preocupação assim que desliguei, eu precisava de dinheiro pra trazê-los pra cá no dia seguinte o mais rápido possível.

Eu fui até quem eu sabia que era o único que poderia me ajudar naquele momento, o mestre.

—Mestre, diga ao Tiago que estou interessada na proposta do contrato dele. —eu disse sem hesitar, de uma só vez, deixando o mestre de queixo caído.

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