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MATEO
𓆟 𓆞 𓆝 𓆟 𓆞 𓆝 𓆟 𓆞 𓆝


Era uma regra de ética para mim não me envolver com a vida pessoal dos meus alunos, isso me fazia manter a cabeça centrada no profissionalismo e me concentrar no que importava, meu emprego. Mas quando encontro uma menina de apenas dezoito anos largada em uma rua qualquer, com roupas rasgadas, hematomas e mais vulnerável que o comum, toda essa regra evaporava. Como se não fosse ruim o bastante eu ainda tinha uma richa com essa garota, mas como recusar ajuda aqueles olhos tão apavorados?

Faziam três dias. Exatos três dias que Morgana havia sumido sem explicação nenhuma e eu não podia simplesmente ignorar, pois, até os segundos eu estava contando desde seu desaparecimento.

Eu tinha esperado ela no lugar combinado, passei a madrugada inteira dentro do meu carro e quando o sol começou a surgir no céu eu soube que algo estava errado, minha teoria se confirmou logo após eu ter ido a sua casa e notar que estava vazia. Poderia simplesmente chamar a polícia ou algum tipo de ajuda, mas quebrar a confiança de Morgana parecia algo irreversível.


Enquanto o sinal tocava feito uma marreta no ouvido de todos, os alunos iam trocando de sala e eu mudava meu percurso habitual. Não aguentaria mais um minuto naquela escola sem notícias dela. Assim que acordei pela manhã eu tinha um plano exato em minha cabeça, encontrar a única amiga da Morgana e tentar tirar o máximo de informações que eu conseguisse, mas para minha desgraça a garota havia faltado.

Passei pelo corredor e desviei de todas as pestes que andavam sem atenção, aqueles malditos celulares pareciam desconectar a mente desses jovens imaturos que faziam qualquer coisa para sair de suas vidas vazias.


Tinha um barulho perceptível em minha mente, um barulho do qual eu estava familiarizado a muitos anos, mas nesse momento em específico ele gritava um único nome e eu sabia que já estava consumido de mais por esse assunto para simplesmente ignorar.

Tentei virar minha rota, mas quando estava prestes a entrar em outro corredor uma voz feminina me chamou. Minha atenção foi para a loira que parecia ter um brilho diferente nos olhos, eu estava pronto para dispensar ela.

Havíamos tido um pequeno momento de tensão sexual, um momento que garantiu sua calcinha jogada no chão da minha casa. Mas não estava com cabeça para isso, pelo menos não hoje.

— Mateo! Por favor espera um pouco.

— Paula desculpa, mas agora eu tô ocupado.

— A diretora quer falar com você.

— Infelizmente tenho que ir embora, algumas coisas aconteceram e...

— Acabamos de receber uma notícia urgente Mateo — Meu coração acelerou com aquelas palavras.

— O que aconteceu? — A loira me olhou com receio.

Cada parte do meu corpo gritou de dúvida e derrepente eu tive medo do que sairia da boca da mulher. O qual perturbada estava minha mente para pensar em tanta tragédia?


MORGANA
𓆟 𓆞 𓆝 𓆟 𓆞 𓆝 𓆟 𓆞 𓆝

Desde muito nova nunca gostei de contato físico e eu não sabia muito bem quando essa repudia teve início, mas quando minha pele encostava em outra era como beber em um copo quebrado. Angustiante e doloroso.

Por isso festividades nunca foi o meu forte, a vontade das outras pessoas de estarem unidas era o motivo do meu colapso, em qualquer oportunidade as pessoas arranjava motivos para se tocar e isso não era diferente em um velório. Por alguma razão tinha gente que acreditava que um abraço poderia prender toda sua dor.

Ou talvez o problemas estava unicamente em mim por detestar um ato simples de carinho.

Todas as pessoas que me circulava sequer sabiam o que havia acontecido, elas não se importavam, apenas olhavam com dó e tirava suas próprias conclusões. Eu não odiava todos os meus parentes distantes em geral, mas com certeza não os amava, acho que nem sequer tinha algum tipo de relevância em minha vida.

Minha mente era uma bomba, um relógio que a qualquer momento poderia parar ou começar a dá voltas ligeiras e incansáveis e todas aquelas pessoas, aquelas palavras de "meus pêsames", os abraços forçados, os murmurinhos de especulações e até os olhares piedosos era uma chave para que eu explodisse, para que eu não controlasse minhas emoções e acabasse me perdendo na minha própria melancolia. Todos alí pareciam difíceis demais de lidar.

Minha mente nunca foi um bocado de vozes gritando, ela era silenciosa, fria e quase impiedosa. Tão morta quanto os corpos que dormiam debaixo dessa terra. Mas hoje em específico ela estava mais bagunçada do que o comum e tudo isso piorava em grande porcentagem quando ficava diante daqueles dois caixões, cada um com uma altura diferente.

Lesão cerebral, esse era o motivo que levou a minha mãe a ficar dentro daquela grande caixa de madeira. Morta dolorosamente e de uma forma tão brutal que a tampa se manteve fechada durante todo o discurso do padre.

Já no outro o homem que havia tido seu pescoço degolado graças a cabeça presa no vidro do carro, esse também havia sido mantido fechado e foi motivo de muito agradecimento meu.

Eu ainda escutava os pedidos de socorro, sentia o cheiro da gasolina e a dolorosa sensação que me acompanhava enquanto eu via meu irmão sufocado pelo próprio cinto. Saber que possivelmente teria uma daquelas caixas pequena com o corpo dele dentro era angustiante. Mas ele não estava lá e como castigo algo que parecia tão pior quanto aquilo havia acontecido.

O choro da família de Gael era verdadeiro, a mãe dele que sempre acreditou que seu filho era um anjo chorava desesperada diante do seu caixão, os familiares dele pareciam mesmo desesperados e eu não os podia culpar por isso, a verdade não era revelada a todos, mas uma pergunta surgia em minha mente. Se eles soubessem de todos acontecimentos, cada pedacinho da história, será que ainda chorariam diante o nome em sua lápide?

O pensamento evaporou em instantes quando notei que não aguentaria mais um segundo dessa tortura e precisei de um único empurrão dos meus pés para sair do local sem que ninguém notasse.

Ficar um segundo a mais naquele lugar era como passar uma década trancafiada no inferno. Precisava me afastar daquilo.

Passei por todas as lápides cada uma com um toque diferente e aos poucos os ruídos de conversa foi desaparecendo, fui até a pequena área de lazer do lado de fora que mais parecia um cenário de filme de terror do que um espaço relaxante e me sentei em um banco feito de um tipo de pedra branca. Fechei os olhos respirando o ar fresco acompanhado de uma brisa gostosa.

Talvez fosse irônico o fato de o dia está bem mais ensolarado do que o restante da semana, chuvas e tempo nublado estava sendo cada vez mais comum por Long Beach, talvez minhas preces tinha sido atendida, mas o alívio que pensei que sentiria quando esse momento chegasse não estava me atingido. O que havia acontecido com minha mente?

Senti uma sensação de olhos me observando e assim que foquei minha atenção para a realidade me deparei com os pelos pretos do felino ao meu lado. O gato de olhos laranja me olhou de forma estranha.

— Boa tarde, amiguinho — Ofereci um sorriso sem dentes ao gato e a resposta foi um miado vindo dele, como se o animal entendesse minhas palavras.

Levei minha mão até o topo da sua cabeça e ele se entregou ao toque com facilidade. Seu ronronado foi a resposta que precisei para saber que ele gostava disso.

— O que leva um ser como você a está aqui?

— Falar com animais não é um hábito muito comum, senhorita Carter — E derrepente meus pelos inteiro se arrepiaram.

A única pessoa que eu com certeza não queria vê no momento sentou ao meu lado e assim que meus olhos se encontraram com o azul profundo dele senti como se o mundo parasse ao meu redor.

Mateo me ofereceu um sorriso.

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