V - A marca.

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O dia amanheceu nublado, frio e deprimente. Mal haviam dado 04 da manhã e eu já estava de pé, em um bom sábado. Eu não reclamaria, não poderia fazer isso, não depois de tudo que passei, minha avó é e será minha salvadora, junto com tia Cris.

– Pronta, querida? – minha avó aparece, segurando um casaco preto e de couro.

– Sim, vó. Eu não tenho muito o que levar, a senhora sabe. – sorrio sem graça.

– Sim, não se preocupe com isso, iremos comprar roupas novas para você e... – me estende o casaco, o seguro – Isso é para você, um presente, sei que nunca teve uma oportunidade de ter um casaco de coura, então comprei esse para você. Bem, não sei se a cor lhe agrada, você sempre gostou de rosa...

– Eu amei! – digo, animada.

Lembro de quando tia... minha ex madrasta Eliz, comprou casacos de couro para Daniel e Daniella e me deixou de fora, dizendo que eu era muito jovem para usar. Completamente sem razão, já que Daniel e Daniella eram 10 anos mais novos que eu.

– Vamos?

Saímos da casa, minha avó deixa uma chave com um senhor desconhecido por mim. Seus olhos chamaram minha atenção, eram tão azuis quanto o céu em um dia ensolarado. Sorrio para ele, simpática, mas o mesmo parece não gostar, eu vi quando ele revirou os olhos.

Não se preocupe, Amauri consegue ser um pouco ranzinza, entende? – minha vó sussurra, me fazendo rir da sua careta.

▪️▪️▪️

Olhando para o relógio de pulso da minha avó, eu via que já passavam das 14 da tarde e ainda estávamos bem longe do nosso destino. Já havíamos passado em uma loja de roupas e comprado bastante roupas para mim, minha avó me fez comprar bastante calças jeans, leggins e botas. Eu não entendi o motivo mas logo ela me explicou que iríamos morar em um lugar com bastante mosquitos e as coisas poderiam me ajudar a não ser picada. Também comprei vestido, saia e short fino mas esses, eu poderia contar em uma mão cada peça, no caso, uma peça de cada, roupas íntimas foram muitas. Estive na ginecologista, pois nunca havia ido em uma consulta, mesmo tendo 18 anos e nunca ter menstruado, vovó disse que isso não era normal e que sangrar também significava saúde feminina. Eu não queria fazer nada disso, muitas perguntas me deixam nervosa e assustada, eu queria ficar quieta e sozinha mas entendia que isso era para o meu bem.

Lembre-se querida, saúde em primeiro lugar.

Concordei sozinha, ao lembrar das sábias palavras da minha avó. Ela tinha razão, eu deveria me cuidar, estava enfrentando uma desnutrição grave para a minha idade e altura, isso não poderia ficar assim, eu iria me transformar em outra pessoa, eu prometi para ela e irei cumprir.

– Quanto tempo iremos demorar, vó? – perguntei, ao me sentar novamente ao seu lado, já havia ido ao banheiro mais de 03 vezes de tão ansiosa.

– Talvez cheguemos apenas amanhã, por volta das dez da manhã. Iremos para outro país...

– Outro país!? – exclamo, assustada, chamando atenção de algumas pessoas dentro do ônibus. Minha bochecha esquenta por causa da vergonha recente.

– Sim. Tenho uma casa boa e confortável para ficarmos, você gosta de sítios? Campo? – sorriu, alegre.

– Nunca vi um sítio, vó...

– Claro que já viu, você já esteve em meu sítio. Quando pequena, você se perdeu na floresta, sabia? – riu, fraco – Quando te encontramos, você estava machucada e muito assustada, dizia que foi salva por um...

– Um o que? – perguntei, curiosa, eu não lembrava disso.

– Não consigo me lembrar o nome que você disse, era um nome esquisito, tipo, licantropo. Nós não sabíamos o que era e o médico que lhe atendeu naquele dia garantiu que você estava delirando por causa da febre. – sorriu, triste – Você até hoje tem a marca no ombro...

Toco meu ombro esquerdo, sentindo o mesmo arder levemente. Ainda consigo senti-lo vibrar a cada toque, o que era estranho.

– Então essa marca aconteceu nesse dia? – indaguei, curiosa.

– Sim, essa e mais algumas em suas costas. Algo te atacou e quase te matou, então, eu ainda acredito que esse licantropo tenha lhe salvo. E eu gostaria de encontrá-lo e agradecer, você tinha apenas cinco anos, eu ainda me culpo por ter permitido que você fosse brincar no quintal...

– Vovó, está tudo bem. A culpa não é sua...

– Ah, minha querida. Se eu fosse um pouquinho mais rígida, eu sei que nada teria acontecido com você. Mas você entende? – chorou – Sou tão sensível e ninguém me respeita, nem meus próprios filhos fizeram isso, muito menos seu pai ao aceitar se casar com aquela mulher ordinária.

Abraço seu corpo levemente, sorrindo para a mesma, tentando causar conforto, ela sorrir de volta, limpando o canto dos olhos. Uma moça nos interrompe, carregando dois pratos com macarrão, purê de inhame, feijão e um filé de frango. O cheiro é maravilhoso, paro para saborear cada colherada, realmente, uma delícia! Espero engordar bastante, pois estou comendo tão bem!

Dois CompanheirosOnde histórias criam vida. Descubra agora