𝐒𝐎𝐁 𝐎 𝐒𝐎𝐋 (𝑭𝒐𝒓𝒂 𝒅𝒐 𝒍𝒖𝒈𝒂𝒓)

O bálsamo necessário das conversas na madrugada

Foi uma coisa boa que Kalli havia demorado um pouco mais para ir dormir, já que quando acabou acordando se debatendo por causa do mesmo pesadelo dos últimos meses, não foi obrigada a ter que se explicar para ninguém. Felizmente, todos estavam dormindo profundamente – foi uma sorte que não acordara gritando.

Esse assunto preferia ter que lidar sozinha e em seu próprio tempo.

Era além de exaustivo, entretanto. Não conseguir dormir de verdade por causa dos pesadelos, estar em constante alerta e nunca conseguindo relaxar... Era exaustivo.

“Foi uma escolha minha e eu estou bem com isso. Portanto, você deveria ficar também, certo? Pode me prometer isso? De irmã mais velha para irmã mais velha.”

Kalli gostaria que fosse tão fácil assim. Quer dizer, como poderia simplesmente “ficar bem” quando viu Bianca morrer diante de seus olhos?

Suspirando, Kalli abraçou seus joelhos e permaneceu ali, olhando para o nada.

— Você... — Uma súbita voz a fez pular no lugar. Seu coração acelerando dolorosamente em sua caixa torácica. Virando-se rapidamente, fica ainda mais surpresa ao ver ali, parado diante dela e ocultado pelas sombras, Nico Di Angelo.

Então foi como se seu coração fosse parar na garganta dela, batendo com ainda mais força – se é que isso fosse possível – e mesmo tomada pela ansiedade, Kalli esperou pacientemente, por longos minutos, mas Nico não havia dito mais nada. Ele, que ainda era tão pequeno e magrinho, tinha uma expressão angustiada em seu rosto, uma que não deveria estar no rosto de uma criança com 11 anos de idade.

— Eu...? — Kalli perguntou, em uma voz tão baixa e suave quanto a que Nico usara.

Nico respirou fundo, claramente tomando coragem.

— Você realmente tentou ajudar minha irmã? Você realmente estava com ela?

Kalli olhava de olhos arregalados para Nico. Respirando fundo, tomou seu próprio tempo para criar coragem. Falaria o que fosse possível para ele, afinal, era seu direito. Qualquer coisa que ajudasse um garoto tão jovem a lidar com o luto.

— É claro que tentei. Não só por causa da promessa que fiz para você, mas porque era a atitude óbvia a se tomar. — As suas mãos estavam cerradas com força, as unhas cortando a carne; talvez não devesse ter tirado as luvas de arquearia. — Ela... Ela queria ajudar, estávamos em uma situação bem complicada, sabe? Mas acontece que aquela era a primeira missão dela, a primeira missão de uma garota praticamente crua para a vida de um semideus, então é claro que não a deixaria sozinha.

Nico ficou em silêncio, olhando para seus próprios pés. Parecia cada vez em mais conflito, certamente indeciso entre a raiva e a tristeza. Indeciso sobre qual sentimento deveria deixar prevalecer.

— Você... Falou com ela? Ela te falou o porquê se juntou às Caçadoras?

Kalli esboçou um sorriso.

— Falei. Claro que sim. Agora, o motivo ela não foi explícita, mas pude entender o que fez, o porquê. Bianca fez isso com o melhor em mente.

— O melhor para ela você quis dizer.

Kalli o olhou por um momento.

— Também. Sei que queria ficar o tempo todo com a sua irmã, afinal é sua família e você a ama muito, mas assim que ela ficou sabendo do Acampamento, de um lugar seguro, cheio de crianças, fazia sentido pensar que era uma boa ideia te deixar lá. — Imediatamente Kalli pensou em seu irmãozinho, no Leo. Até poderia não ter vontade alguma de deixá-lo para se juntar à Caçada, todavia, sempre fez questão de o deixar no escuro sobre o mundo Mágico o máximo possível, não o deixando explorar sua capacidade de ver através da Névoa; ela podia entender bem como Bianca se sentia. — Vocês estiveram sozinhos desde que perderam a mãe, no Acampamento, Bianca deve ter pensado que era um bom lugar para que agisse como a criança que é, enquanto ela faria que quisesse. De conhecer a si mesma.