Sem olhar para trás

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As três Parcas em pessoa levaram o corpo de Luke.

Percy não via as velhas senhoras há anos, não desde que testemunhara cortarem um fio da vida em uma barraca de frutas do outro lado da rua, quando tinha doze anos. Elas o assustaram naquela época, e elas o assustam agora – três avós fantasmagóricas com bolsas com fios de lã e agulhas de tricô.

Uma delas olhou para ele, e mesmo que não tenha dito nada, a vida dele passou literalmente por seus olhos. De repente, tinha vinte anos. Então, era um homem de meia idade. Em seguida, velho e murcho. Toda a força deixara seu corpo, e vira sua própria lápide e uma cova aberta, um caixão sendo baixado para dentro da terra. Tudo isso aconteceu em menos de um segundo.

Está feito, ela disse.

A Parca levantou um pedaço de fio azul – e Percy sabia que era o mesmo que tinha visto quatro anos atrás, o fio da vida que as viu cortar. Na ocasião, pensara que era a sua vida. Agora, percebia que era a de Luke. Elas o mostraram a vida que teria que ser sacrificada para consertar as coisas.

Elas recolheram o corpo de Luke, agora enrolado em uma mortalha branca e verde, e começaram a levá-lo para fora do salão do trono.

— Espere. — Hermes disse.

O deus mensageiro estava vestido em sua típica túnica grega branca, sandálias e elmo. As asas de seu capacete se agitavam conforme ele andava. As cobras George e Marta se enroscaram em volta do seu caduceu, murmurando, Luke, pobre Luke.

Percy pensou em May Castellan, sozinha em sua cozinha, assando biscoitos e fazendo sanduíches para um filho que nunca voltaria para casa.

Hermes desembrulhou o rosto de Luke e beijou sua testa. Murmurando algumas palavras em grego antigo – uma bênção final.

Adeus, — ele sussurrou e então acenou com a cabeça, permitindo que as Parcas levassem o corpo de seu filho.

Enquanto elas saíam, Percy mais uma vez pensou na Grande Profecia. As linhas agora faziam sentido para ele. A alma do herói, a Lâmina Maldita ceifará. O herói era Luke. A Lâmina Maldita era a faca que havia dado a Annabeth anos antes – maldita porque Luke havia quebrado sua promessa e traído seus amigos. Seus dias uma única escolha irá encerrar. A escolha de Percy, de dar a ele a faca, e acreditar, assim como Annabeth, que Luke ainda era capaz de consertar as coisas. O Olimpo preservar ou aniquilar. Ao se sacrificar, ele havia salvado o Olimpo. Rachel estava certa. No fim, Percy não era mesmo o herói. Luke era.

Ou melhor, como Kalliope dissera, Percy não era o único herói. O que o fazia lembrar... Como ela descobrira isso? Percy não se lembrara de ter falado sobre isso com ela, quer dizer, estava com tanta coisa na cabeça, que acabou esquecendo, então como...?

De qualquer forma, Percy descobriu outra coisa: Quando Luke mergulhou no Rio Estige, ele tivera que focar em algo importante que o mantivesse preso a sua vida mortal. De outra forma, teria dissolvido. Na ocasião, vira Kalliope, em uma mistura de algo que de fato aconteceu com algo inventado, pois para ele, ela lhe era importante, afinal. Luke deve ter visto algo similar, mas que obviamente envolvesse Annabeth e Thalia. Por alguma razão, Percy lembrou daquela cena que Héstia o mostrou – de Luke em seus bons e velhos tempos na companhia das duas, quando prometeu que eles seriam uma família. Machucar Annabeth na batalha de certo o chocou e o fez se lembrar da promessa. Tinha permitido a sua consciência mortal tomar o controle novamente, e vencer Cronos. Seu ponto fraco – seu calcanhar de Aquiles – salvou a todos eles.

Ao lado de Percy, de repente Kalliope tombou enquanto segurava sua barriga. Sem pensar muito, ele passou o braço pela cintura dela e a manteve de pé, mas isso pareceu ter sido o movimento errado, pois a amiga gritou de dor. Só então ele percebeu que sua mão estava apertando diretamente o ferimento da facada, a mão dele acabou manchada de vermelho.

𝐒𝐎𝐁 𝐎 𝐒𝐎𝐋 (𝑭𝒐𝒓𝒂 𝒅𝒐 𝒍𝒖𝒈𝒂𝒓)Onde histórias criam vida. Descubra agora