Capítulo 24

84 14 136
                                    

Pesadelo diurno.

Dias atuais.

Diferentemente da última competição, o circuito deste mês ocorrerá pela manhã, tanto a apresentação quanto o resultado, sendo o primeiro em Ulsan e o segundo em Busan.

Faltam uns 20 minutos para chegarmos no parque ecológico Taehwagang, uma floresta com belos bambus que me lembra a grama da praça pública quando não era cortada.

- Nervosa Ella? - O Sr. Hong está sensato ao meu lado resolvendo uma revista com palavras cruzadas, ele está na página 105.

- Ah, não... Só ansiosa. Nunca estive desse lado antes - ele dá um sorriso sem levantar os olhos da revista.

- Calma, é igual a Seoul - ele levanta a cabeça - vai conhecer o país todo antes de viajar de volta. Poderá mostrar fotos suas nos jornais coreanos para seus amigos italianos. Será ótimo para a sua formação - ele volta a tentar responder a linha 4 " cinco letras, mamãe ".

- É... - volto a encarar a janela.

Ele passa o braço em volta dos meu ombros de forma a apertar o que está contra a janela. Coreanos não tem esse costume, talvez ele esteja fazendo isso para me trazer uma sensação de familiarização, mas eu odeio abraços.

- Obrigada. Professor, com licença, vou pedir para a minha mãe ajeitar minha trança - digo me levantando.

- Ah, claro querida - ele move as pernas para o corredor e eu passo mas não sem antes perceber que ele colou a resposta errada.

A resposta correta era latim e ele pôs nação. Talvez não tenha prestado atenção na dica adjunta que dizia " linguagem ", ou talvez ele não perceba nada já que não estou de trança.

***

Os bambus são mais escuros do que eu esperava, sempre achei que eles eram verdes como folhas recém nascidas, mas são escuros como as centenárias.

O parque tem vários corredores de cimento que separam os bambus uns dos outros, se chegar ao final da propriedade e olhar com precisão, pode-se ver o parque nacional Taehwagang e o rio Taehwa.

Todos os quadros já estão dispostos, os alunos ao lado deles, seus uniformes reluzindo ao sol quente, que não nos atinge graças aos bambus, que nos encara de um céu sem nuvens. Ulsan é a potência industrial da Coreia, por isso, as pessoas que andam em grandes grupos pela área verde não reservada e alguns pequeninos indícios de fumaça no céu ao longe não me surpreendem. O que realmente me surpreende é o quão " verde " este lugar é. É um equilíbrio perfeito entre a natureza e o uso dela.

Sempre que pensava na Ásia, imaginava dragões voando no céu, pessoas amarelas iguais aos Simpsons, chapéus engraçados e uma língua maluca. Ver com os meus próprios olhos que a visão e gestão deles está muito afrente, me deixa muito envergonhada por essa minha visão arcaica e xenofóbica.

Olhando ao redor, nada mudou no último mês, só o número de competidores que diminuiu, mas fora isso todos continuam iguais. Tae-Hwa continua com o mesmo corte " baixo " e os óculos redondos de aros pretos, as meninas que vem do mesmo distrito mas de escolas diferentes continuam olhando e comparando os uniformes dos outros, os fiscais continuam com suas grandes pranchetas, o menino com dentes de coelho continua reclamando do calor...

Até A Próxima PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora