Capítulo 01

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A cidade que nunca dorme.

Há um ano atrás

618.

Vou ficar exatamente 618 dias dentro da escola e 112 dias fora dela.

Não sei como vou me adaptar a um ritmo totalmente diferente do que eu levava e não faço a menor ideia de como fazer essa tinta parecer natural.

Mas cedo, minha mãe me entregou o formulário com as regras da nova escola e, olha só, aqui na Coreia não se é permitido ter estudantes nas escolas de cabelo colorido, não que o meu cabelo seja colorido, mas ele não é preto como o da maioria dos asiáticos e como eu não vou a uma escola internacional, pintar é a melhor opção.

Outro ponto: meus olhos claros, já ouvi relatos de asiático que nascem com olhos claros e são tratados como alhiens, não sei se é real ou não, mas o que eu menos quero é chamar a atenção então acho que vou usar lentes.

Meu coreano até que é compreensível mas meu nome não é escrito em caracteres então eu vou ter que escolher um apelido, tem que ser algo para: a) não chamar a atenção, b) ser facilmente compreensível e que eu possa lembrar e falar e c) que não seja exótico tipo os nomes que as celebridades ás vezes adotam, tem que ser algo delicado e ao mesmo tempo que não chame a atenção.

Minha mãe fez uma lista pra mim, então eu sento na cama e observo.

1 - Yoo-na (유 나 ) - pomba;
2 - Mi-nah ( 민아 ) - beleza e amor;

3 - Ji-soo ( 지수 ) - pura e limpa;
4 - Hyun-jin ( 현진 ) - brilhante e inteligente;
5- Yeh-bin ( 예빈 ) - amável e gentil;
6 - Na-bi ( 나비 ) - borboleta;
7 - Ji-min ( 지민 ) - sabedoria;

Todos são nomes comuns, em geral as crianças recebem os nomes a partir dos caracteres dos nomes de seus pais, mas meus pais não são asiáticos; minha mãe é espanhola e meu pai brasileiro, então eu não tenho muita opção.

Acontece que a maioria desses, são nomes de celebridades e eu não quero parecer aquelas pessoas malucas que imigram confiando 100% que os coreanos são seres evoluídos e bla bla bla; eu não sei pelo qual me decido, talvez só decida na hora...

Saio da cama e vou para a janela, meu apartamento fica próximo a um desses lugares temáticos, após olhar por algum tempo, saio e fico uns segundos parada no meio da calçada.

Seoul é um lugar totalmente diferente, o ritmo é bem acelerado, parece que a cidade nunca dorme, os prédios são tão altos que me fazem sentir mal, mas as calçadas pintadas, os idosos gentis e os locais coloridos causam uma explosão em mim; cheguei na cidade ontem e ainda não conheço nada, passei os últimos meses tentando entender alguma mínima palavra nessa língua e me comunicar decentemente, algo que eu até consigo fazer, mas não é tão simples se comunicar em uma língua a quão não é a sua e que tem uma forma diferente de interpretação.

Por exemplo se você por no tradutor " é delicado como uma flor " ele traduzirá " delicado como uma flor ", parece algo minúsculo mas talvez não seja.

Começo a caminhar lentamente pela rua, são 18:50 da tarde e Hongdae tem muitas pessoas cansadas atravessando-a. Meu pai disse que Mapo-gu seria um ótimo lugar devido aos cafés, as atrações, a quantidade de coisas artísticas, mas a verdade é que qualquer lugar novo é aterrorizante, pois mudanças nunca são muito bem-vindas.

Os cafés têm letreiros em uma língua que eu ainda estranho, as pessoas comversão em um idioma que não é o meu, e vejos vários rostos os quais nunca chegarei a me parecer, fico me perguntando se eles me acham normal devido a globalização ou sentem curiosidade só por sentir.

***

Acho que andei pelo bairro inteiro, e embora seja lindo, aqui não é o meu lar.

O meu lar é Palermo, a língua que eu quero ouvir é o italiano, eu quero comer ravioli e não kimchi e eu queria estar andando de bicicleta perto da biblioteca e não subindo as escadas para o apartamento 564 do edifício Eunkop no centro de Mapo-gu.

- E então? Gostou da cidade? Linda não é? - pergunta o meu pai.

Ele está realmente feliz com a nossa vinda, lá em Palermo ele era um simplis concertador de celular que tinha que usar um inglês de dicionário com turistas mal educados, aqui ele é funcionário da Samsung efetivado, e foi por isso que a gente veio; ele se inscreveu em uma seleção online sem se importar realmente, então em um belo dia a alguns messes atrás eu recebi a notícia que aquele seria meu último ano da Flozenda Scuola Per Ragazze e que eu teria de trocar a cidade histórica pela apressada cidade que nunca dorme.

- Não é Palermo - falo me jogando no sofá.

- Você se acostuma - diz a minha mãe dando um sorriso e colocando uma panela na mesa.

Desde o momento em que soube da promoção, ela vem se especializando em estilo de vida, culinária e seu sonho é fazer parte de um daqueles grupos de senhoras que se reúnem para conversar entre vizinhos como nos doramas; ela está mais empolgada do que eu jamais poderia estar.

- huumruummm - gemo me mexendo no sofá.

- A vamos pare com isso - papai - você nem é italiana.

- Mas minha casa é lá - digo me sentando a mesa.

Depois do jantar eu vou para a cama, só tenho alguns dias para me acostumar com o horário, e a sonoridade da língua, e a aparência das pessoas.

Mas não vai ser tão fácil chamar esse lugar de lar, embora bonita a cidade tem várias restrições como: 1) a biblioteca nacional só pode ser usada por maiores de idade, 2) nada de bebida alcoólica, nem mesmo vinho para menores, e ainda tem o porém de talvez por ser menor não puder entrar em locais específicos por causa das " no kids zone ".

Mas não é para sempre, são só 730 dias, depois disso eu vou voltar para onde meu coração está.

Até A Próxima PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora