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- 𝐐𝐔𝐀𝐂𝐊𝐈𝐓𝐘-
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O mundo ao meu redor é um borrão, como se estivesse preso em um pesadelo sem fim. 

Há vozes que gritam, sons de armas sendo disparadas, e em algum lugar distante, o eco constante de uma sirene de ambulância. Sinto o frio de gotas de água gelada caindo na minha cabeça, me arrancando de algum lugar escuro da minha mente. Tento mover os braços, mas eles estão estranhos, pesados, como se não fossem meus. A dor queima na minha perna esquerda, arrancando lágrimas involuntárias dos meus olhos. Talvez eu tenha perdido a perna inteira. Não consigo me lembrar.

Imagens da capitã atirando na minha mãe ficam girando na minha cabeça, repetidas vezes, como um filme que não consigo desligar. Ela está lá, parada, imóvel, como se o tempo tivesse congelado. Tento gritar para que se mova, faça algo, qualquer coisa, mas ela não responde. Fica ali, estática, até a bala encontrá-la, e então... ela cai, seu rosto virado para mim. Não consigo aceitar que isso aconteceu, que de alguma forma, tudo isso é minha culpa.

Quanto tempo passou? Dias? Semanas? Talvez até meses? Perdi a noção do tempo. 

Quando finalmente consigo abrir os olhos, me dou conta de que estou numa sala pequena, sem janelas. As paredes são brancas, mas parecem ser de aço, e dois soldados estão parados ao lado de uma porta pesada, como a de um cofre. Faço uma careta enquanto a dor na minha perna explode, irradiando por todo o meu corpo. Minha língua está seca, rachada, e sinto o gosto amargo do sangue nos lábios.

Minhas mãos estão presas firmemente às costas de uma cadeira. Meu cabelo cai no meu rosto, colado de suor e sangue. Meus olhos se arregalam quando percebo: meu boné sumiu. Estou exposto.

Demoro pra perceber que não irei precisar mais. Não precisarei mais de usar o boné por um bom tempo.

— Merda... — murmuro, ofegante, enquanto a dor na perna se intensifica, pior do que qualquer coisa que já senti antes. Tento olhar para baixo, e vejo uma atadura meia boca encharcada de sangue em volta da minha coxa. A visão me faz quase desmaiar. Onde está Wilbur?, penso desesperadamente. Eu preciso de você...

Um dos soldados percebe que estou acordado e leva a mão ao ouvido.

— Ele está consciente, senhor — diz ele com uma voz fria e distante.

Minutos depois, a porta se abre com um rangido metálico, e ele entra. O comandante que ordenou a morte da minha mãe. Cada passo que ele dá ecoa nas paredes de aço. Ele está vestindo seu uniforme completo, com insígnias brilhando sob a luz fluorescente. Ah, eletricidade. Tudo aqui é tão branco, tão limpo. Parece um hospital ou um manicômio, mas é pior.

Cada luz acima de mim me dá uma ânsia insuportável. Não estou acostumado com eletricidade, e essa sensação para mim é considerado como tortura.

— Então, finalmente acordou, meu caro garotinho — ele diz, sua voz carregada de sarcasmo. — Fiquei ansioso para vê-lo, e muito feliz quando soube que você acordou! Eu queria te ver pessoalmente. Você teve sorte, sabia? Os médicos me informaram que você não está infectado. Mesmo depois de ter passado tanto tempo com aquela escória infectada que você chama de família.

Minha garganta arde de raiva e dor. Eu me movo bruscamente, tentando recuar na cadeira, e antes que perceba, cuspo nele. O cuspe mal atinge o ombro dele, mas a raiva é o que importa. Só o ato de cuspir faz minha perna latejar de dor intensa, um aviso claro de que qualquer movimento vai ser punido pelo meu corpo.

Ele para por um segundo, limpa o cuspe com um gesto lento e calculado, o sorriso venenoso nunca saindo de seus lábios. Fecho os olhos por um segundo, respirando fundo.

Cat and Mouse - Chaosduo QSMPOnde histórias criam vida. Descubra agora