Capítulo 29

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Não sei quando começou, mas Carlos se transformou.

Ele saía de manhã e só voltava no dia seguinte, não olhava mais para Yuri, ignorando totalmente o garoto. Muitas vezes, ele tentava entrar no meu quarto, mas sempre encontrava a porta trancada. Talvez não ter correspondido às suas investidas tenha o feito mudar. E isso estava me deixando com medo.

Quando ele passou a semana toda fora e decidi sair para ir ao mercado, descobri que a porta estava trancada e minha chave tinha desaparecido. Meu desespero foi pegar o celular e tentar ligar para Carlos, mas ele não atendia de forma nenhuma. Queria ligar para a minha mãe, mas não tinha o número dela mais, ou o número de outra pessoa.

Em prantos, tentei falar com o porteiro do condomínio, mas ele disse que não poderia fazer nada. Tentei ligar para a polícia ou qualquer contato, mas a linha sempre caia. Tentei esconder meu pânico de Yuri, mas era impossível.

Carlos voltou naquela noite, e foi a primeira noite que dormi chorando de medo, desespero e dor.

O que tinha feito para merecer tudo aquilo?

Carlos comprou um videogame para Yuri e agora o menino só queria jogar, tão pequeno e agora viciado em jogos eletrônicos, mas no fundo, não reclamei porque tudo o que fazia era sentar na frente da tv e o observa-lo crescer cada dia mais focado na tela. Não precisava fazer mais nada. Os planos de colocá-lo na escola foram embora quando fomos proibidos de sair do apartamento.

Eu estava em êxtase. Fora da realidade. Tudo que passava na cabeça era como tinha arruinado a vida de Yuri com as minhas decisões e azar.

Ele não merecia uma mãe como eu.

— Vá tomar um banho! — Carlos disse como nojo quando me viu naquela noite. Percebi que usava a mesma roupa fazia uma semana.

— Não estou com vontade. — respondi com desdém.

— Pelo amor, Heloisa. — Ele jogou a toalha em minha direção. — Vamos sair para comprar roupas novas para vocês, a minha família quer ver você e não podem te ver desse jeito.

— A sua família?

— Pois é, agora vá logo.

Faz tanto tempo que quando a água morna tocou a minha nuca que eu tremi. Enquanto esfregava os braços percebi que alguns roxos ainda estavam ali. Fraquinho, mas visíveis. Teria que esconder aquilo.

Estava calor, mas o moletom era a única coisa que poderia usar e não mostrar nada. Yuri já estava dentro do carro, parecendo animado por finalmente sair para passear depois de tanto tempo, mas eu não estava.

— Você lembra do que conversamos? — Carlos me pressionou no carro antes que eu pudesse entrar.

— Lembro. — Infelizmente lembrava muito bem, aquela noite foi uma das piores da minha vida.

— Ótimo. Se pensar em fugir, pedir ajuda ou qualquer coisa, sabe quem sofrerá.

— Eu sei. Não farei nada.

Carlos segurou forte em meu pulso e me guiou pelas lojas. Yuri apesar de animado de sair, ficou acuado ao nosso lado. Não saiu correndo como faria normalmente e nem pediu nada. Era simplesmente robótico. Será que Carlos o tinha ameaçado também? Não. Ele não tocaria em Yuri. Foi o nosso combinado.

— Aqui, vá experimentar essa roupa. Vou te esperar bem aqui. — Ele sorriu brincalhão para a moça do provador que sorriu em resposta.

Fechei a cortina e coloquei o vestido vermelho, olhei-me no espelho e tomei um susto ao ver a pessoa que tinha me tornado. Círculos roxos cobriam meus olhos, parecia que não dormia há séculos, meu cabelo não tinha mais brilho e um vestido que serviria perfeitamente antigamente agora parecia um lençol em um corpo magro.

— É você, né?

A voz feminina soou baixa do provador ao lado me fazendo saltar assustada. Procurei por todos os lados, mas não havia ninguém ali.

— É, só pode ser você.

— Eu não sei quem você pensa que sou, mas não sou ninguém.

Uma garota de aparência juvenil olhou para mim por baixo do provador. Ela olhou para o próximo celular e depois para mim.

— É, seu nome é Heloísa, não é? — Como ela saberia meu nome?

— Não, não é.

— Impossível, você tem a mesma marca de nascença que nessa foto. — Ela apontou para a foto que brilhava na tela do telefone. Era uma foto antiga, mas era possível ver a marca vermelha clara em meu pescoço. Quando olhei no espelho, percebi que tinha esquecido de apagá-la com maquiagem.

— Não conheço essa garota. — Insisti.

— Está tudo bem, mas você pode assistir isso aqui, por favor?

Ela entregou o seu aparelho com fone de ouvido e peguei.

— Por que está demorando tanto? — Ouvi Carlos gritar do lado de fora. Deixei o aparelho de lado e apareci na cortina.

— Ficou muito grande, acha que pode trazer um número menor? E trazer o azul escuro? — Ele me encarou e pediu para que a moça do provador fosse buscar. Sorri nervosa.

— Vou distraí-lo por você, depois pode passar o telefone por debaixo de novo.

A garota sumiu e fiquei confusa sobre o que ela queria que eu visse.

Dei play no vídeo e coloquei os fones.

A imagem abatida de Taemin surgiu. Tive que me segurar para não cair para trás. Sentei devagar no banco e mesmo com a visão turva, consegui ouvir a sua voz perfeitamente.

"A minha noiva e o meu filho estão desaparecidos há cinco meses, e mesmo com a ajuda da polícia e da embaixada, não foi possível encontrá-los, aparentemente o seu ex marido está com os dois e desaparecem antes que possamos chegar até eles. Não sei mais o que podemos fazer, por isso, eu estou aqui, para implorar para os meus fãs do mundo todo, se os virem, entrar em contato nesse número da tela. Eu imploro. Eu imploro para vocês me ajudem."

A garota apareceu novamente e puxou a minha perna. Tirei os fones e o devolvi.

— Rápido, ele está querendo entrar. É você, não é? — Eu concordei e ela sorriu.

— Obrigada por me mostrar isso. - Tentei controlar as lágrimas, mas estava sendo impossível.

Ela desapareceu e ouvi os passos de Carlos, sabia que era ele, tinha me curvado várias vezes na cama ao escutar aqueles passos pesados e os rangidos dos seus sapatos de marca. Ele abriu as cortinas e me encarou.

— Por que está chorando?

— Estou magra demais, estou horrível.

— Tanto faz, a moça não conseguia achar seu número, então vai ser esse ai mesmo.

— Mas está muito largo.

— Você sabe se virar. Vamos logo, já ficamos tempo demais.

— Está bem. — Abaixei a cabeça e fiz o que ele ordenou. Enquanto ele pagava as compras, fiquei em silêncio ouvindo repetidamente a voz de Taemin. Ele falou para todos. Por que? Por que ele se importaria tanto? E noiva? Ele ainda me aceitava como sua?

Meu coração se encheu de esperanças por um segundo. 

Shine - TaeminOnde histórias criam vida. Descubra agora