Capítulo 27

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- Bom dia. - Desejo ao me sentar. A sala de jantar meio iluminada pela claridade do lado de fora, o céu parcialmente fechado, as nuvens cinzas, mas não escuras completamente carregadas, os raios solares lutando para aparecer nesse fim de inverno.

- Bom dia. - As duas mulheres dizem em uníssono, Ayla retira os dois pratos sujos da mesa, levando-os para cozinha, onde está os outros dois?

- Onde estão Lucien e Jurian? - Pego um cacho de uva, colocando uma na boca.

- Foram fazer uma ronda perto da fronteira. - Diz bebericando seu chá, em alguns momentos eu esqueço que o trio tem seus deveres e obrigações, esqueço que eles não são só um trio de amigos morando juntos e aproveitando a vida como bem entendem. Não, eles são os protetores ou algo do tipo, do território humano, a linha de frente se alguma ameaça aparecer. Vassa, ainda é uma rainha, Jurian, um general, e Lucien, emissário da corte noturna, a linha que une as terras mortais a Prynthian. Eles junto com um número de humanos, se aliaram para proteger a pequena porção de terra humana. Foi confiado a Jurian o comando de um pequeno exército que foi juntado por senhores influentes e de classe, que possuem boas condições de vida.

- Aconteceu algo? - Pego um pedaço de fruta e dou para o filhote de baixo da mesa, que mastiga rapidamente, seu rabo balançando de uma lado para o outro, depois de engolir me olha esperando o próximo pedaço.

- Ronda de rotina. - Abana a mão em descaso. Em todo esse quase um mês que temos ficado aqui, nunca vi os dois saírem para fazer uma ronda, ainda mais nessa distância, leva um dia e meio, sem parar, até a fronteira com a primaveril, que é a fronteira mais próxima. Geralmente é Jurian quem sai para fazer as rondas, algumas vezes acompanhado com alguns homens, outras vezes sozinho.

Deslizo a faca suja de geleia de framboesa pelo pão e dou uma mordida generosa.

- Filha. - Olho para ela esperando que continue, ela demora a falar, seu rosto aflito. - Me escute primeiro, sem me interromper. - Assinto, apreensiva com que vai sair de sua boca. - Nós duas estávamos conversando, o começo da reconstrução da cabana teve início como bem sabe. - Confirmo, pelo que ela mesma disse a reconstrução começou na semana passada, os homens que Vassa conseguiu reunir estão primeiro limpando o lugar para depois ver o que conseguem salvar e consertar. - Pois bem, Vassa me fez uma proposta e eu quero saber o que você pensa antes de aceitar. - Largo os talheres e fico olhando para as duas, esperando, ergo uma sombrancelha loira, ela suspira e diz finalmente: - O que você acha sobre morarmos aqui?

Acho que deixei transparecer meu choque e confusão pelo modo que me olham, morar aqui? Não que não seja bom, porém...

- Por que? - Tento entender o motivo. É Vassa quem diz:

- Bom, a mansão é enorme, tem espaço de sobra, e aprecio a companhia de vocês, sua casa vocês podem alugar quando ficar pronta ou dá o fim que quiserem. Como eu disse anteriormente, é cansativo competir com tanta, masculinidade, por assim dizer. Aqui é confortável, não que a casa de vocês não seja...

- Nós entendemos o que quer dizer, sim, morar aqui seria bom, todavia está certa de sua decisão? Quer dizer, são mais duas pessoas na casa, menos privacidade, tanto para vocês quando para dois duas. - Minha mãe que está ao meu lado segura minha mão gentilmente antes de dizer:

- O que ela quer dizer é que estamos acostumadas a ser apenas nós duas a vida inteira, é uma mudança súbita e acho que precisamos de um tempo para decidir. Não queremos atrapalhar a vida de vocês e dá mais gastos.

- Se o motivo da hesitação de vocês for esta, não se preocupem. Vocês morarem aqui não nos atrapalharia em nada. - Diz convicta, depois disso não dissemos mais nada, a ruiva com a refeição terminada pede licença e se retira.

- O que acha disso? - Pergunto com o rosto em cima da mão que está apoiada na mesa, olhando para mais velha, ela balança os ombros comendo sua salada de fruta.

- Sabe que sempre quisemos viver no conforto e bem estar, que lugar melhor para morar do que aqui? - Nesse quesito sempre fui parecida com minha mãe, querendo uma vida melhor, mais confortável, sem preocupações. Na verdade, a única preocupação que quero é a de pensar no que vou comer no lanche da tarde, não por não ter, e sim pela variedades de opções de alimentos. Ou que roupa escolher no meu imenso armário, pode parecer frívolo, mas, só quero uma vida tranquila e melhor do que a temos. - Além do mais, com a cabana podemos fazer a escola que sempre quis abrir para ajudar as crianças da aldeia.

A escola que sempre quis abrir, mas nunca tive o lugar, nem condições. Muitas pessoas, para não dizer todas, não recebem educação quando crianças, não sabem ler, escrever, já que não temos uma escola em todo território humano, os filhos de lordes recebem educação em casa pelos professores que vêm do continente, os mais pobres estão abandonados, a mercê da própria sorte, assim dificultando as chances de crescerem e terem uma vida melhor. O resultado, é que quando atingem a puberdade elas tem que trabalhar para se sustentar e ajudar as famílias nas obrigações em casa. E esses trabalhos não dão nada mais do que uns trocados, não sendo o suficiente para se manter, ou você se veste, ou come. Alguns dão sorte de conseguir uma oportunidade melhor de emprego. Aqui na aldeia existe poucas opções para quem não possui estudos, sendo a maioria dos moradores. Alguns conseguem uma vaga no açougue, outros como auxiliar de padeiros, ajudante de obras, e muitas mulheres vendem seu corpo, mas até algumas mulheres dos prostíbulos detém de estudos, sendo as que são mais requisitadas frequentemente, assim como as acompanhantes de senhores da nobreza. As que não tem estudos e são escolhidas apenas pela beleza, conseguem alguns trocados, porém não é nem de perto o que as acompanhantes ganham. Por esse motivo quero fazer diferente e ensinar quem quiser aprender, não só crianças, mesmo que já seja difícil que os pais deixem seus filhos frequentarem a escola.

É claro que não vai ser fácil construir uma academia, vai levar tempo, recursos, dinheiro, que é algo que não tenho. Mas eu farei acontecer.

Vejo o filhote bernese vir correndo em minha direção com a bola pequena na boca, ele deixa no chão e me olha com seus olhinhos brilhantes, esperando que eu a joque novamente. Pego a bola babada e jogo de novo, uma brisa fresca balança meus fios levemente, os últimos raios solares sumindo, cobertos pelas nuvens. O céu está na mistura de azul claro e laranja, denunciando o fim de tarde. Eu diria que meu dia não foi muito produtivo, depois do café fui para a biblioteca da casa e fiquei lá, entre livros e mais livros, aconchegada na poltrona de couro e gozando do leve calor que a lareira oferecia. Só sai de lá para almoçar, voltando logo em seguida, até que resolvi vir aqui fora. Não sinto quase mais nenhuma dor, tirando um leve desconforto na lombar, sem isso estou praticamente recuperada.

Tentei voltar ao trabalho mas minha mãe junto de Vassa me proibiram, dizendo que só voltaria quando estivesse totalmente recuperada. Elas duas juntas são o caos, se sozinhas são difíceis de lidar, juntas são pior ainda.

Tenho pena daquele que se quer ousar entrar em seus caminhos, porque dele, só vai sobrar as cinzas para contar história.





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