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Quando Lúcifer acordou, Ylwa ainda estava sentada em frente ao sofá ronronando, apesar de já passar da sua hora de ir. Ele ficou constrangido com o desabafo anterior, mas ela não disse mais nada, apenas perguntou se estava com fome. Depois de um lanche, eles se deram boa noite e a pecadora partiu.

Naquela noite, Lúcifer passou horas olhando para sua aliança. Ele a usava desde que as alianças se tornaram uma coisa e seria estranho ficar sem, mesmo que já não fosse mais casado. Revirando o pensamento em sua mente, ele caiu no sono quando já era quase de manhã e por isso acabou se atrasando. Ao ver o horário ao acordar, o diabo saltou da cama e saiu correndo com seus pijamas de pato, deslizando pelo corrimão da escadaria, nem se lembrando de seus portais, mas ao pousar no saguão foi confrontado com Ylwa. A pecadora estava parada ao pé da escada, rabo se contraindo:

— Ah! — exclamou ela ao vê-lo, antes de sorrir sem graça e dizer. — Fiquei um pouco preocupada. É a primeira vez que se atrasa tanto. Queria conferir, mas não sabia até onde podia atravessar os limites.

Lúcifer ficou tocado com o pensamento, mas mais constrangido que antes. Felizmente ela logo acrescentou:

— Já que está bem, vou esperar na biblioteca.

Ela deu a volta com um sorriso e só então Lúcifer notou seu estado de vestimenta, soltando um guincho que a fez rir. Com um estalo, ele substituiu as roupas e foi atrás da gata.

O resto do dia passou como de costume, com Ylwa não tocando em nenhum assunto tenso e Lúcifer, ainda envergonhado, feliz por isso. E assim continuaram, nos próximos dias a rotina se manteve, mas mais uma vez uma mudança ocorreu. Onde ambos se mantinham bastante conscientes do espaço pessoal, agora essa fronteira afrouxou. Tornou-se normal Ylwa se inclinar sobre o ombro de Lúcifer para ler algo, e o diabo se encostar na pecadora para compartilharem lanches ou papéis. Um dia, Lúcifer ficou encarando o rabo da gata se mover e sem notar estendeu a mão e agarrou, assustando a pecadora e fazendo-a se arrepiar inteira. O pelo ficou tão alto que ela parecia ter o dobro de largura e o rei mal conseguia pedir desculpas em meio às suas risadas.

Foi em meio a essa sensação de camaradagem que o extermínio chegou. Antes de perceberem, faltavam apenas dois dias e Ylwa precisou pedir licença para organizar suas almas. Ela prometeu passar pelo Palácio na noite anterior e assim Lúcifer a dispensou.

Durante todo o ano, a maior parte do salário que Ylwa recebeu de Lúcifer foi para a construção de abrigos seguros. Na maior parte, suas almas tinham onde se esconder, com apenas algumas precisando se abrigar nas sombras. Com o aumento de poder ao longo do ano, Ylwa não esperava problemas, mas testou assim mesmo, e tal como no último ano, foi capaz de segurar todas as almas sob sua posse, por tempo suficiente.

Na noite antes do extermínio, ela brindou com os regulares do bar, suas primeiras almas, antes de se transportar ao Palácio. Ela seguiu a sensação do sol na pele e estrelas distantes até uma sacada com vista da cidade, onde encontrou Lúcifer com uma taça de vinho. Sua súbita manifestação ao seu lado fez o diabo tremer, antes de reconhecê-la com um sorriso apertado:

— Tudo resolvido? — questionou o rei.

— Sim. Os abrigos estão prontos, e aqueles que não cabem vão ficar dentro das sombras. Tudo preparado.

— Bom. — Ele tomou um gole do vinho, considerando, e perguntou. — Você precisa estar nas sombras para abrigar as almas?

Ylwa encostou o quadril na beira da sacada, virando o corpo para sua companhia:

— Na verdade não. Era mais fácil puxá-los comigo no início, mas agora não faz diferença em termos de gasto ou dificuldade. Por quê?

Lúcifer hesitou, mas juntando coragem, continuou:

Hell Greatest Secretary!Onde histórias criam vida. Descubra agora