Capitulo 32

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Parei na berma da estrada com o polegar levantado. Tinham passado apenas cinco veículos, quando um carro travou de repente, ligando os quatro piscas de segguida. Nos bancos da frente, duas senhoras idosas travaram entre si um pequeno diálogo antes de abrirem a janela. Contei-lhes a história lamechas de uma discussão com o meu namorado e de ele me ter deixado abandonada no meio do campo sem dinheiro nenhum. Elas palravam e davam estalos com a língua, acompanhadas pelo frufru dos seus vestidos, enquanto eu me sentia horrível por estar a enganá-las. Recusaram-se em absoluto a deixar-me no centro da cidade, desviando-se antes do seu percurso para me levarem até à porta de casa. 

Era uma sensação estranha regressar a casa. Ela parecia-me extremamente familiar, e, contudo, muito distante de mim. A mãe abriu-me a porta passados segundos e olhou fixamente para mim como seu eu fosse uma desconhecida. De súbito, perguntei a mim mesma se tinha sido sempre assim que ela me fazia sentir. 

- Tens mais alguma novidade do teu irmão? - questionou-me. 

Em vez de me enfurecer com ele, senti apenas uma tristeza incrível. Dirigi-me à sala de estar e sentei-me no sofá. Era um daqueles modelos de espaldar alto que obriga as pessoas a sentarem-se de costas direitas, tão confortável como se estivessem sob interrogatório. Como de costume, a sala estava imaculada. 

A mãe seguira-me e continuava à espera da resposta. Respondi-lhe com uma pergunta.

- Não te preocupaste quando deixei de te telefonar?

Ela gesticulou com a mão como se estivesse a matar uma mosca. 

- Voltaste lá à procura do Harry?

- Voltei - pela sua expressão exasperada, parecia que os meus esforços não lhe bastavam. - Acho que posso ter descoberto a... hum... solução para chegar até ele, mas... há uma coisa que tenho de te perguntar primeiro.

As sobrancelhas delineadas da minha mãe ergueram-se drasticamente. Passei a língua pelos lábios, com nervosismo.

- Queria perguntar-te o que querias dizer quando disseste que eu era... perversa. É muito importante sabê-lo. 

Ela suspirou.

- A que propósito é que vem isso agora? O mal já está feito. 

- Que mal?

- O mal que fizeste ao teu irmão, Jessy,o mal que fizeste ao Harry. 

- Não compreendo - repliquei, abanando a cabeça. - Em que é que eu prejudiquei o Harry?

A minha mãe esfregou a nuca com uma expressão pesarosa. 

- Queres mesmo saber isso?

Semicerrei os olhos.

- Quero mesmo saber.

Ela cruzou os braços.

- Se não tivesses tanta necessidade de chamar as atenções, talvez a vida do Harry tivesse sido diferente. 

- Necessidade de chamar as atenções? - aquilo que ouvia deixava-me atónita. - Eu era invisível para ti. Passaste anos a ignorar-me... tu tapavas-me com um cobertor!

Tinha regressado a casa para esclarecer as coisas, desejosa de pôr as nossas diferenças de lado. em vez disso, continuava a ser o bode expiatório, só que havia alguma coisa de diferente; detetava um novo ressentimento na voz dela.

- Mãe, não vamos discutir - disse-lhe com ar contrito. - Isto é dificl de explicar. eu sei que não costumas preocupar-te comigo, mas têm acontecido umas coisas estranhas...

- Acontecido umas coisas estranhas - arremendou-me ela numa voz horrivelmente esganiçada. - Foste sempre assim, mesmo quando eras mais pequena, a inventar histórias, a tentares dar-te ares de importância. É por isso...

Não olhes para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora