Capitulo 9 - parte I

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Aqui está mais um capitulo. Espero que gostem. Amanhã vou postar mais e no fim de semana, talvez só no domingo. 

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-Não vale a pena irmos no meu carro – disse Louis, seguindo-me pelas escadas ingremes da capela. – O sistema de sentido único vai obrigar-nos a andar quilómetros às voltas e não há sítio para estacionar.

- Podemos chegar lá a pé em quinze minutos – alvitrei, acompanhando-o na sua passada larga. – Abrimos caminho pela Victoria Street, depois descemos pela Cross Keys, cortamos pela universidade, passamos ao lado do centro comercial e estamos lá.

- Acelera – disse Louis a gozar, enquanto eu ficava ofegante à medida que subíamos.

- Não fiques para trás, Louis – disse-lhe em tom de retaliação e desatei a correr. Ele não teve outro remédio senão vir atrás de mim.

Chegamos à Brick Lane esbaforidos e cheios de cãibras. Tive de me sentar num muro a recuperar a respiração. Louis estava vermelho como um tomate e tinha o cabelo todo suado. Penteei-me com os dedos e recompus-me, enquanto Louis tentava arrefecer-se. Dei uma olhadela aos edifícios antigo à nossa volta, com os tijolos corroídos e escurecidos pelo tempo. Na pequena rua havia três contentores. Todos cheios de material de construção, e lembrei-me que a zona estava em fase de reabilitação. Uma placa anunciava o aluguer de apartamentos, havia um pequeno restaurante inaugurado há pouco tempo, uma loja de antiguidades com algumas cadeiras cá fora e espécie qualquer de loja de arte temática. O Centro de Tratamento ficava num edifício de um só piso. Era independente dos outros e dispunha de um pátio próprio, mas tinha barras de metal nas janelas.

- Vais à frente? – Pedi, ansiosa.

Louis pareceu ficar admirado.

- Não estiveste já aqui?

Abanei a cabeça.

- Estes lugares fazem-me sentir um bocado esquisita… e não muito confortável.

Louis ergueu o sobrolho.

- Nesse caso, devo ir sozinho, Jessy, uma vez que aquilo é demasiado desconfortável para ti?

Não lhe respondi, sentindo-me envergonhada e reconhecendo que merecia o sarcasmo. Endireitei as costas e dei a mão a Louis. Juntos, transpusemos as portas duplas. Estas davam diretamente para um salão com duas grandes mesas de refeitório colocadas lado a lado, e um balcão aonde eram servidas as refeições. As paredes estavam repletas de cartazes com conselhos sobre tudo, desde habitação e segurança social, a reabilitação do álcool e das drogas. Todos os lugares estavam ocupados. Havia um cheiro a refeitório de escola misturado com suor e roupa suja. A sala não estava muito arejada e fiquei logo agoniada.

Encaminhei-me para a primeira que vi com um distintivo de identificação. Era uma jovem de cabelo castanho curto, vestida de forma prática com umas calças de ganga desbotadas e camisa aos quadrados.

- Ando à procura do meu irmão… ele não contacta com a família há mais de duas semanas – tirei o telemóvel e mostrei-lhe a fotografia de Harry.

Ela não me pareceu muito admirada e eu imaginei quantas pessoas teriam vindo ali à procura de um familiar que deixara de dar sinais de vida. Isso deixou-me enervada e ainda mais ansiosa.

- Há quanto tempo recorre ele aos nossos serviços? – Inquiriu ela.

Senti-me compelida a falar em voz baixa.

- Ele não é… quero dizer… ele não vem aqui muitas vezes.

- A cara dele não me é estranha – comentou ela num tom discreto – mas temos muita gente a passar por aqui. Talvez seja melhor falar com as pessoas que vêm cá habitualmente.

- Falar com…

Ela deve ter percebido a minha relutância. Os seus olhos claros fitaram-me, enquanto eu me retraia de forma visível. Pus os lhos no chão, e na altura em que tive a coragem de os levantar, ela tinha-se afastado.

Louis não tinha perdido uma palavra e estava embasbacado.

- Eu pensava que já tinhas feito voluntariado num hospital.

Dei um gemido

- Fiz, mas apenas na área médica. Não tenho vocação para assistente social.

- Eu dou uma ajuda – ofereceu-se ele.

Passei a língua pelos lábios secos e dei um passo em frente, despertando a atenção de uma mulher com um olhar ausente. Ela tinha o rosto chupado e os olhos completamente encovados. Os braços eram uma massa esburacada de várias manchas e as pernas nuas estavam inflamadas de feridas purulentas. Qualquer coisa nela fez-me paralisar e precisei apenas de uns segundos para perceber porquê; era o mesmo que ver o Inferno na terra. Não conseguia fazê-lo.

- Não me sinto bem – murmurei por entre dentes.

Dirigi-me para a porta num passo pouco firma, saindo para o sol abrasador, e apoiei-me ao pilar do portão. Eu não estava a ser justa. Aquelas pessoas não eram Harry e eu não fazia ideia sobre as circunstâncias que tinham feito a vida delas acabar daquela maneira, mas não me conseguia desligar da raiva decalcada que sentia pelo meu irmão e pelo que ele tinha feito à nossa família. Louis proferiu uma palavra e o seu silêncio era mais agressivo do que a crítica anterior.

Estremeci.

 - Desculpa, não tenho grandes reservas de compaixão… gastei-a toda com o Harry.

- Eles não precisam da tua compaixão, Jessy, tens apenas de lidar com eles como seres humanos.

- Só que isto… deixa-me aniquilada – tentei explicar.

- A maior parte deles é marginalizada por toda a agente… mas nunca esperei isso de ti.

Olhei de relance para as pessoas a deambular por ali, desfrutando da luz do sol, e senti o desejo de estar em toda a parte menos naquele sítio. Tentei defender-me debilmente.

- Quando os vejo, só consigo pensar no Harry e em todas as vezes que ele disse que mudava, em todas as promessas que não cumpriu e em como nos magoou a todos… vejo-o daqui a dez ou vinte anos, e isso é assustador.

- Volta comigo para dentro – pediu Louis, com a voz ligeiramente mais suava. Puxou-me pela T-shirt e conseguiu arrastar-me para o interior do edifício sem mais protestos.

Louis dirigiu-se a outra empregada, tirando-me o telemóvel e mostrando-lhe a fotografia de Harry.

Ela nem precisou de refletir.

- Sei quem ele é. Deixe-me ver nos nossos registos, mas… tem de compreender que as pessoas nem sempre dão o nome verdadeiro.

A mulher levou-nos para um pequeno gabinete. Disse-lhe o nome completo de Harry e que ele era meu irmão, e vi-a folhear uma espécie de livro de registos.

- Cá está ele… Harry Styles. Saiu daqui há dezoito dias.

Sorri-lhe, reconhecida.

- Gostava de saber… reparou em alguma coisa… estranha nele?

A expressão dela era pesarosa.

- Nós tratamos pessoas no nível mais baixo de decadência, na sua maior parte, pessoas que não têm mais nenhum lado para onde ir. Aqui, todos agem de uma forma um pouco estranha.

- Não se lembra por acaso onde ele dormia? – Perguntei-lhe, certa de que Harry devia ter deixado alguma coisa para mim.

A mulher voltou a consultar o livro. 

Não olhes para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora