Capítulo 20 - parte I

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Na manhã seguinte, deram-me o privilégio de limpar o escritório escuro e sombrio. A minha disposição não tinha melhorado e a irmã parecia ter o dom de me enfurecer. Era impossível que ela soubesse das minhas visões assustadoras, mas os seus modos tinham como objetivo deixar-me intimidada. Eu estava empenhada a mostrar-lhe que não ia consegui-lo.

- Não existe nada neste lugar que me assuste. E hei de ultrapassar todas as provas de resistência que me apresentar, ou qualquer outra dessas coisas esquisitas que acontecem por aqui. Não vou desistir até saber onde está o Harry.

- Não existe nada aqui que a vá magoar, Jessy. Fico contente por saber que não está assustada. A única coisa a temer é o próprio medo.

- Muito profundo. - disse por ente dentes.

- Preferia que lhe dissesse para enfrentar os seus demonios? Que era este o momento?

Lancei-lhe um olhar furioso para lhe dar a perceber o quanto ela me irritava, mas uma expressão breve do que quase parecia afeto surgiu-lhe no rosto desaparecendo de seguida.

- Vou deixá-la com o seu trabalho - disse ela secamente.

Passei os olhos pelo escritório. Na parede, havia uma coleção melancólica de quadros a óleo em molduras douradas. Um representava uma cena de caça, com inúmeros vultos de casaco vermelho a cavalo, a perseguir uma raposa, e o diretor da caçada a soprar numa corneta. Um quadro mais pequeno mostrava um cão com um faisão morto na boca e uma lebre no chão, coberta de feridas frescas.

Trabalhei a manhã inteira, ansiosa com a perspectiva de ver Liam de novo, mas as horas foram-se arrastando sem ele aparecer. Senti-me magoada por ele não me procurar, ele parecia-me tão interessado em ajudar, se bem que isso tinha sido antes de eu me atirar a ele.

No intervalo para o almoço, desanimada, segui em direçao ao templo, pois era o último sítio onde estava certa de que Harry tinha estado.

A princípio tinha medo de me perder mas depois apercebi-me de que o terreno descrevia um círculo e em caso de apuros bastava procurar a muralha verde. Enquanto avançava memorizava locais de referência, lembrando-me de que Liam me tinha dado a mão ali à apenas 2 dias.

Parei de repente, quando vi um vulto estendido na relva, imóvel. Era Liam e eu fiquei em estado de choque, aproximando-me. Relaxei quando vi os seus olhos abertos e que o seu peito subia e descia ao ritmo da respiração.

- Liam, pregaste-me um susto de morte!

- Ah sim?

Ele tinha um ar deprimido, os seus olhos parados e uma expressão de desânimo estampada na sua cara.

- O que é que se passa?

- Não compreendes? ... é este lugar. Há qualquer coisa a abafar-lhe toda a beleza.

As suas palavras apanharam-me de surpresa mas compreendi o que significavam assim que me sentei ao seu lado e olhei em volta: à superfície havia uma rede de árvores a protegere-nos, tudo tinha vida, mas por baixo haviam montes de ervas daninhas, a destruir tudo pela calada à sua passagem.

- Ocorreu-me um coisa, Jessy. Apercebi-me de como a propriedade pode ser mortífera - estendeu as mãos e em cada uma delas havia um cogumelo cor de azeitona. - Um é comestível, um cogumelo do campo vulgar, o outro é um chapéu da morte, um dos cogumelos mais venenosos mais mortais. A morte pode ocorrer em menos de 24 horas.

- Não podes ter assim tanta certeza.

- Posso - insistiu ele. - É fácil confundi-los, só que o venenoso tem um cheiro característico, quase como pétalas de rosa.

Não olhes para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora