Capitulo 6 - parte II

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AHAH aqui fica mais um capitulo. Só porque gosto mt de vocês. Hope you like it xx

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Arrastei-me para o piso de baixo, começando a pensar que aquela atividade não ia produzir nada que valesse a pena. Não obtive resposta no segundo apartamento. Na altura em que cheguei ao terceiro, bati mais ao de leve, como se estivesse determinada a que ninguém me ouvisse. Preparava-me para sair dali, quando surgiu um vulto no limiar com um olhar surpreendido de quem nunca tem alguém a bater-lhe à porta. Respirei fundo e engasguei-me numa nuvem de perfume pesado e enjoativo. Era uma senhora a rondar a meia-idade, de aspeto gordo e flácido, com um penteado à Barbie e vestida com um conjunto de duas peças florido. Passou por mim num passo deslizante, espantosamente leve para alguém tão corpulento. Espreitou para o patamar, viu que este estava vazio à exceção da minha pessoa, e pareceu ficar desapontada. Iniciei de novo o mesmo discurso e mais uma vez menti em relação ao meu laço com Harry. Apesar dos remorsos, aquilo saiu-me sem dificuldade.

 - Eu trabalho o dia inteiro; não tenho tempo para conviver – disse ela com ar atrevido.

 - Bom, o que eu tinha em mente não era propriamente a convivência… o Harry anda mais ou menos… desaparecido, e a família dele está preocupada.

- Isso é muito desconcertante – proferiu ele, parecendo tudo menos isso. – Já contactou o patrão dele?

 -Ele não trabalha – murmurei por entre dentes, distanciando-me fisicamente das perguntas e do perfume dela.

 -Talvez a universidade onde ele anda?

 - Ele não… quero dizer… sim, vou fazer isso. Obrigada pelo conselho.

O seu sorriso gracioso não me enganou nem um segundo. Fiz um esforço para não me deixar dominar pela raiva, sentindo pena de Harry por ter de viver ao lado daquelas pessoas. Elas não precisavam de me dizer o que pensavam dele; eu lera-o nos seus olhos e tinha desperdiçado doze minutos naquela atividade inútil.

Já quase tinha perdido a coragem para bater à última porta. A televisão estava ligada com o som bastante alto e senti um arrastar de pés e movimentos no interior, mas foram precisos uns dois minutos até uma senhora idosa colocar cautelosamente a cabeça de fora. Era a primeira habitante com um aspeto amigável, e descontrai-me ligeiramente. Mal tinha referido apenas o nome de Harry e dito que era uma amiga, quando ele me interrompeu.

- Tem a boca dele.

Ela tinha-me apanhado, pelo que interrompi o que ia a dizer.

- É meu irmão – confessei.

A senhora anuiu, com um leve aceno de cabeça.

- Quer entrar?

A porta abriu-se mais e eu transpus a ombreira. O interior era o mais diferente possível do apartamento minimalista de Harry, a barrotar de móveis pesados e antiquados, e estofos opulentos. Contei dois sofás, três poltronas, uma cadeira forrada a cabedal junto de uma escrivaninha e uma chaise-longue forrada por um tecido de riscas verdes. As paredes mal tinham espaço livre à vista, com a abundância de quadro de motivos e tamanhos diferentes. Este apartamento era maior do que o de Harry, mas parecia mais pequeno e muito mais escuro. A senhora dirigiu-me um sinal, convidando-me a sentar-me na chaise-longue de aspeto desconfortável. As pernas estavam esculpidas em forma de garras de animais com um ar tão real que quase receei que me mordessem os tornozelos. Ela instalou-se no sofá mais pequeno com as mãos pousadas sobre o colo, observando-me com atenção.

- O meu irmão não diz nada há mais de duas semanas – comecei – e estamos todos bastante reocupados.

- Um rapaz tão educado – observou ela. – Costumava vê-lo passar pela minha janela de manhã e, por vezes, encontrávamo-nos na entrada. Era sempre muito amável e apanhava-me as cartas. E tão atraente também.

- Mas… lembra-se de o ter visto há pouco tempo?

Ela pôs-se a pensar, olhando para o teto. Passaram-se dez segundos, a seguir, vinte, e a minha perna direita começou a tremer de forma incontrolável.

- Pode ser que sim – acabou por dizer. Contive a respiração e, por fim, ela prosseguiu. – Muitas vezes penso… que se há qualquer coisa a que preciso de responder… tirá-la do pensamento ajuda, antes de a resposta chegar.

A frustração começou a contrair cada tendão do meu corpo e senti que não conseguia manter-me sentada e imóvel. “A paciência é uma virtude, a paciência é uma virtude”, entoei em silêncio, e quase que dava um salto no ar no momento em que o grande relógio da sala ressoou a passagem do quarto de hora.

 - Adorava viver no andar do topo – tagarelava ela -, mas as minhas pernas jamais aguentavam o esforço. Embora seja difícil acreditar, fui bailarina quando era nova. Agora, estou tolhida pela artrite, mas… olhem para mim… não devia estar a deprimi-la com a ideia da velhice.

- Não está a deprimir-me – retorqui, tentando evitar olhar-lhe para as pernas com as veias azuis proeminentes.

Aquilo não me levava a lugar nenhum. Levantei-me e consegui chegar ao pé da porta, só que ela enfiou-se entre o bengaleiro e a mesa da entrada, bloqueando a minha saída. Agora que eu me ia embora, a memória tinha voltado de repente.

 - Vi o Harry, de facto… há uma, há duas semanas talvez. Não posso precisar, mas aquilo que me lembro é que ele estava entusiasmado porque tinha arranjado emprego. Estava demasiado apressado para eu lhe pedir pormenores.

Harry tinha um emprego. Harry estava com pressa para ir para um sítio qualquer trabalhar. Aquilo era completamente inesperado, mas podia justificar o seu comportamento estranho. Ele tinha andado distante e ainda mais reservado do que era costume. Talvez não tivesse querido falar disso à mãe e a mim, por recear não conseguir mantê-lo. Agradeci à senhora idosa e percorri o caminho de volta para o apartamento. Tinha estado ausente vinte e três minutos, mas, pelo menos, dispunha de alguma informação.

Louis estava corado e contente consigo próprio, brandindo uma chave de fendas co ar como se fosse uma arma. Estava a colocar uma corrente de segurança na porta para me fazer uma surpresa e deixar-me mais confiante dentro de casa. Fiquei ligeiramente apreensiva por não ter avisado o senhorio com antecedência, mas disse-lhe que era uma ideia fantástica, fingindo não reparar no enorme penso rápido que ele tinha no polegar. Ele estava igualmente ansioso por me contar que tinha pesquisado todas as referências em latim de Harry no meu computador, e que os resultados consistiam em apenas milhões de textos religiosos.

- Foi um bocado descoroçoante falar coma vizinhança – contei-lhe. – Uma senhora idosa lembra-se de ter visto o Harry há pouco tempo. Parece que ele se gabou de ter arranjado emprego, mas ela não faz a mínima ideia onde seja.

Louis não pareceu impressionado.

- Não me parece que isso seja grande ajuda.

- Bem… não é, mas… podemos delimitar a busca. O Harry não é um empregado modelo, pelo que o trabalho devia ser temporário, com horário flexível, sem precisar de muitas referências…

 - Tu sempre disseste que ele tinha um bom poder de argumentação… Será que arranjou trabalho como vendedor? Estão sempre a abrir vagas nessa área.

- É uma possibilidade – reconheci e peguei na mochila. – Vamos procurar no centro de emprego e no jornal da zona. O Harry não deve ter ido para muito longe; disso tenho a certeza.

Louis soltou um gemido.

- Temos de ir já a correr?

Fitei-o com um olhar reprovador.

 - Tempus fugit, Louis, tempus fugit. 

Não olhes para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora