Capitulo 34

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Harry esboçava um sorriso de orelha a orelha, e eu estava tão chocada de o ver ali que fiquei sem palavras. Ele estava bastante atraente, como não o via há anos, com o semblante luminoso e cheio de cor, e um entusiasmo caloroso na voz. Esperara sentir-me aliviada, mas estava consumida pelo receio. Tremia anda mais e os meus dentes batiam de forma incontrolável. 

- Eu sabia que ias encontrar-me, Jessy. Bom trabalho.

Levei as mãos à cara. 

- Mas onde... quer dizer, como é que passaste por mim?

Harry desviou-se e estendeu a mão, virando a palma para cima, como se me convidasse para dançar num gesto antiquado. Olhei fixamente para a parede, até ele dar um passo em direção a ela e, com um ar endiabrado, dar um passo através dela. Abri a boca de espanto. Era uma ilusão de ótica. Afinal, aquilo que parecia ser terra compacta era um espaço escavado. A irmã Catherine tinha-me dito que os alicerces da igreja se mantinham de pé; eles deviam formar uma sucessão de túneis, talvez de catacumbas. Harry empunhava um archote em chamas para iluminar o nosso caminho. Aquilo era surreal. esfreguei os olhos, não fosse estar de novo com alucinações. 

- Porque é que demoraste tanto tempo? - inquiriu ele. 

O meu irmão agia como se tudo fosse normal, o que me deixava muito mais assustada. 

- As tuas pistas eram tão... bizarras - disse-lhe. - Estava muito preocupada contigo. 

- Mas decifraste-as todas, Jessy... à exceção da cobre. Guardei-a para o fim. 

- Não preciso saber - ripostei, com o terror a entranhar-se dentro de mim. 

- Tens de saber - insistiu ele. - É importante. É disso que tenho estado à espera. 

Tentei despegar os olhos de Harry, mas não consegui. Ele abriu bruscamente a camisa e vi uma cobra vermelha e preta, tatuada na diagonal, entre a cintura e o ombro. Os músculos dele agitaram-se e a cobra pareceu ganhar vida, com o corpo escamoso a ondular através do peito. Era arrepiante. 

- A mãe odeia tatuagens - referi-lhe cautelosamente. - O que te levou a fazer isso?

- Este é o meu novo eu - declarou ele. Nunca desejaste libertar-te e tornares-te na pessoa que sonhavas?

- Eu também mudei nestas últimas semanas...

- Não te deixes ficar para trás - incitou-me ele, seguindo para a  frente a passos largos.

A minha respiração era lenta e pesada.

- Porque me obrigaste a passar por isto, Harry? E por que razão aqui? Na Casa Benedict?

Ele não respondeu. Embora o meu terror não parasse de aumentar, eu ainda me sentia compelida a segui-lo. 

- Harry! Vai mais devagar. Não consigo acompanhar-te a essa velocidade.

Havia outra coisa que me deixava apreensiva; o teto do túnel estava a baixar, obrigando-me a seguir curvada. A minha claustrofobia também se intensificava, aquela sensação familiar de clausura que me sufocava a boca e não me deixava respirar, como se o telhado estivesse a desabar. Ouvi passos por cima de mim, num movimento de idas e vindas, e conclui que a irmã Catherine devia estar por cima de nós na sua marcha interminável. Ao detetar outro som, parei de repente, e o meu coração deu um salto. 

- Tenho de voltar para trás! - bradei. - Ouvia a voz do Liam.

Harry virou-se ligeiramente. Só lhe distinguia uma parte do rosto, mas a chama do archote fazia a pele dele resplandecer num tom de laranja-queimado. 

Não olhes para trásOnde histórias criam vida. Descubra agora