Wei Wuxian

209 47 0
                                    

WUXIAN

DEITO na cama no silêncio purulento do meu apartamento vazio, com as pernas penduradas para o lado, os pés no chão e olho para o teto. As últimas quatro horas não mudaram muito a visão. Ainda a mesma tinta branca cansada. Ainda o mesmo tom claro de metal preto.
Este momento aqui clama por ficar ridiculamente, estupidamente e inconcebivelmente bêbado.
E eu faria.
Ah, eu faria isso, porra. 
Mas não há uma gota de álcool em nenhum lugar do meu apartamento, e já é tão tarde que não consigo nem sair para comprar.
Apenas minha sorte.
Muito lentamente, como se estivesse me aproximando de um animal perigoso, pego meu telefone de onde o deixei cair na cama antes e coloco-o no peito. Está frio contra minha pele nua. Espero mais um momento antes de dar uma olhada na tela. Eu silenciei antes, caso ele ligue ou mande mensagem. Então a única coisa que me resta na agenda de hoje é deletar tudo o que ele enviou e bloqueá-lo.
Não quero suas desculpas.
Não quero suas explicações.
O que eu quero é odiá-lo.
Foda-se ele.
Foda-se ele.
Foda-se ele.
O arrogante, intrometido e filho da puta.
Eu olho para o teto um pouco mais.
Quase caio da cama quando uma batida forte na porta da frente quebra o silêncio.
Sento-me e olho estupidamente para a porta.
Que porra?
Silêncio novamente.
Levanto-me muito devagar e com muito cuidado. Nada. Nenhum som. Então eu ando pelo chão. Ainda lentamente. Com cuidado.
Chego à porta no momento em que começa a próxima rodada de batidas.
Pisco e olho e então, porque aparentemente tenho cinco anos, bato meu punho contra a porta e levanto o queixo.
Bem, você mostrou a ele.
Há outra batida de silêncio.
Então…
— Então você está  aqui — Lan Zhan diz. É uma desculpa de merda de porta, então eu o ouço tão bem que ele poderia muito bem estar na minha frente, sem barreira entre nós dois.
—Vá. Embora. — eu digo.
—Não.
—Então aproveite para dormir aí fora.
Ele solta uma risada sem humor. — Querido, se eu não conseguir dormir, acredite, você também não conseguirá dormir. Vou arrombar essa porta de merda se for preciso.
Parece que meus ossos gelificaram. Como se eles não tivessem mais a força necessária para me manter de pé. Eu caio contra a porta e respiro. Dentro e fora. Dentro e fora.
Há outro baque.
—Abra a porta, Wuxian.
—Vá se foder.
—Prefiro que você faça isso.
Meu pau está fodido o suficiente para endurecer.
Eu me endireito e abro a porta. Ele está encostado no batente da porta com um ombro só, me olhando com calma.
— Achei que deveria lhe dar até de manhã — diz ele — para diminuir minhas chances de levar um soco na cara. Mas então eu percebi,que não. Isso só lhe daria tempo para cozinhar. — Ele rola para fora do batente e se inclina em minha direção, com os braços esticados e os dedos segurando o batente da porta.
— Convide-me para entrar — ele diz, como se estivéssemos revivendo a primeira vez que ele parou na minha porta. Pouco antes de ele me beijar.
Desta vez ele não tem a cortesia de voltar atrás. Ele apenas espera.
Então dou um passo para o lado e deixo ele passar por mim.
Ele para no meio da sala e se vira para mim.
—Sinto muito — diz ele.
Ele parece tão incrivelmente sincero quando diz isso. Porque é assim que ele é.
Foda-se ele.
— Você sabe o que significa a frase ‘me desculpe’? — Eu pergunto.
—Me esclareça.
—Isso significa uma merda.
— Não, tenho certeza que isso significa que sinto muito.
Eu balanço minha cabeça. — Bom para você. Ainda significa merda. São apenas palavras. E elas significam uma merda toda. Não importa o que você diga. A única coisa que importa é o que você faz. E você... —Cerro os dentes.
— Você me machucou.
Não quero admitir, mas as palavras simplesmente explodiram, e agora me sinto vulnerável e pequeno e, de alguma forma, como se ele tivesse me feito admitir isso. Como se ele tivesse arrancado de mim as palavras de maneira tortuosa.
Ele me deixou fraco.
E o que é pior, ele me fez mostrar isso.
Isso só me deixa com mais raiva. Como um animal encurralado. Rolei e mostrei a ele meu ponto fraco, e odeio, odeio, odeio  isso.
Ele simplesmente balança a cabeça. — Eu sei — ele diz rispidamente.
Aperto meus dedos em punhos e os solto repetidamente antes de começar a andar.
Há muitas emoções dentro de mim e não consigo tirá-las, e isso é demais. Não sei o que fazer com esse excesso de raiva.
É por isso que não sou fã emoções.
— Você deveria ir — eu finalmente digo. — Você disse o que veio aqui dizer. Eu te ouvi. Agora você deveria ir.
Ele inclina a cabeça para o lado com algo que só pode ser descrito como uma curiosidade moderada e educada.
—Por que eu faria isso?
— Porque esta é minha casa e eu disse que terminamos, então não quero você aqui.
Ele está do outro lado do chão e na minha frente em um piscar de olhos.
— E eu te disse que não terminamos — ele diz, desafiando os olhos em mim, me desafiando a discutir.
— É assim que um serial killer mantém um namorado. Se eu disser que terminamos mais uma vez, você vai me trancar no porão?
—Tentador. Chamaremos isso de plano B.
Ele levanta a mão e a passa pelo meu pescoço até que seu polegar esteja plantado na cavidade da minha garganta.
Eu levanto minha sobrancelha para ele e aperto minha mandíbula enquanto ignoro meu pau.
—Qual é o plano A?
Ele passa o nariz pela minha bochecha e se aproxima mais. Estou cercado pelo cheiro inebriante dele.
— O Plano A é… implorar por perdão — ele murmura em meu ouvido. Ele se afasta um pouco e, mantendo os olhos em mim o tempo todo, ajoelha-se na minha frente.
— Acho que foi assim que você disse que era feito, não é?
— Você acha que vai foder para conseguir o perdão? — Eu pergunto.
— Não. Acho que você está chateado comigo. Eu sei que  você está machucado, e se eu tivesse que adivinhar, eu diria que isso te deixa ainda mais chateado.
Desvio o olhar e enfio as mãos nos bolsos do moletom.
— Então desconte em mim — diz ele.
— E então conversaremos.

....

APENAS UM GOSTO Onde histórias criam vida. Descubra agora