𝖈𝖆𝖕𝖎́𝖙𝖚𝖑𝖔 24

554 24 10
                                    

Os dedos de Troy estavam entrelaçados aos meus, ele me olhava fixamente nos olhos enquanto gotas de suor escorriam de seu rosto, no meio das minhas pernas ele estocava intensamente ao ponto de me fazer sentir espasmos de tesão, eu gozei exatamente dois minutos antes dele, e depois Troy despencou exausto para o lado dele na cama.. Me levantei, peguei a cartela de cigarros e fui pra varanda.

Fumei o Marlboro ainda nua, encostada no parapeito, sentindo uma melancolia estranha me sondar, a noite estava nublada com uma lua tímida entre as nuvens carregadas... Meu corpo ainda estava dolorido e com hematomas, mas nada era tão incômodo quanto a angústia que me arranhava o peito, soprei a fumaça lentamente e a observei subir em ondas pelo ar, ao mesmo tempo que meu rosto ficava úmido com as lágrimas que escorriam fora do meu controle, meu rosto se contorceu em uma careta de dor e tristeza, eu estava chorando sem saber o motivo específico, talvez fosse tudo ou talvez não fosse nada, era difícil nomear um demônio quando se vivia no inferno.

Tive um sobressalto ao escutar as batidas pesadas as asas de um corvo que pousou ao meu lado, me afastei alguns passos, mas ele se acomodou e ficou me encarando de lado com aqueles olhos profundos como buracos negros, senti calafrios na espinha, especialmente pois aquele andar era muito alto pra que uma ave como aquela subisse, havia algo errado...

Entrei para a cozinha, me enrolei em um roupão e enchi uma taça de vinho, me sentei na ilha da cozinha e acendi outro cigarro, bebei e fumei escutando o som do silêncio, os pequenos estalidos dentro do ouvido, foi a sensação de estar um pouco mais sozinha no mundo, um vazio imensurável... Até que um estrondo me fez dar um gritinho e tapar a boca, o corvo havia quebrado a janela da cozinha e começou a produzir um som assustador, era quase como se estivesse imitando uma voz humana pedindo socorro, uma voz similar a de alguém conhecido, eu então sai correndo pra cozinha, com a garrafa de vinho na mão e me deitei encolhida no sofá, sentindo muito frio e dificuldade pra respirar.

Liguei a TV, estava passando um filme de terror, me enrolei em uma coberta e fiquei bebendo direto do gargalo da garrafa, o filme era tosco e com sangue em exagero, mas serviu pra me distrair um pouco até que meus olhos começassem a pesar, as piscadas ficaram lentas e a visão turva, e então... Peguei no sono.
....

Acordei com o som alto do meu celular tocando na mesinha, ainda sonolenta procurei por ele com as mãos e atendi coçando os olhos, vendo que os primeiros raios de sol começavam a despontar:
-Quem é?!
-Sou eu de novo, Camille - era a voz de Harold.
-O que foi agora?
-Acho que essa é a última vez que eu te ligo.

Senti um nó se formar na garganta, comecei a andar no corredor até a cozinha, e vi aqueles cacos de vidro espalhados pelo chão.
-O que isso quer dizer? - perguntei.

-Perdemos ela Camille - a voz dele embargou do outro lado, senti o desespero - Ela se foi...

Meus joelhos se dobraram e eu cai pra frente, com o celular no ouvido, os olhos vidrados no nada, meu corpo inteiro trêmulo:
-Me diz que é mentira - eu implorei - Fala que é um engano, ou que você está exagerando, me diz que eu vou ter mais uma chance de falar com a minha amiga, de abraçar ela, de dizer o quanto eu a amo - meu coração se desfazia em mil pedaços - Só quero mais uma oportunidade de fazer a coisa certa, eu preciso da Lily...

-Eu sinto muito - Harold chorou de soluçar - Mas acabou, eu não sei o que fazer, pra onde ir, não sei aonde colocar esse sentimento...

Tirei o celular do ouvido e deixei escorregar pro chão, encostei a testa na parede e chorei desesperada, gemi de dor tão alto que Troy acordou e veio me abraçar, mas eu não conseguia vê-lo, estava cega pela dor e desespero, o mundo tinha ficado cinza e silencioso...
....

No velório da Lily, eu descobri o que tinha acontecido, ela havia se suicidado com uma overdose proposital, antes de cometer o ato, tinha escrito algumas cartas para pessoas que ela considerava importante, e uma delas era pra mim, eu estava apavorada com a idéia de ler, mas sabia que teria que ser feito.

Me debrucei sobre seu corpo tão frio e imóvel dentro do caixão, ela parecia um anjo, finalmente em paz e sem expressão no rosto, eu chorei e gritei, arranhei Troy em uma crise de ansiedade, e culpei Harold em mais um surto...
...

Já no apartamento, Troy me preparou um chá de camomila e um baseado, eu me sentei na cama com a carta em mãos, dei um gole no chá e respirei fundo, antes de abrir e começar a ler.

''Querida Camille, eu nunca imaginei que me despediria tão cedo assim de você, mas sinto que é algo necessário visto que eu não aguento mais, mas antes de partir, eu quero que saiba que mesmo que eu não esteja mais aqui pra ver, vou estar torcendo por você do outro lado, eu vou te acompanhar como uma alma penada por onde quer quer vá pois eu torço tanto pra você realizar nossos sonhos, estou ansiosa pra te ver se tornar uma grande estrela, cheia de prêmios e fotógrafos te deixando cega com os flashs, você vai viver por nós duas, porque infelizmente eu sou fraca e estou exausta, esse mundo não é pra pessoas como eu, eu já nasci fadada a esse destino e tudo que acontece me aponta pra isso...

''Na semana passada, eu gravei uma cena para a Facial Abuse, aquela gravadora do Pauly em que você também já trabalhou, eu pensei que seria um dinheiro rápido que eu estava precisando, mas foi tão traumático que eu não consigo superar, não importa o que eu faça, eu fecho os olhos e revivo tudo que passei lá, a humilhação e as dores, aquilo foi um estupro pago... Amiga, eu não quero viver uma vida com essas memórias, eu espero que me perdoe assim como eu também te perdoei...

Brilha aqui na Terra por mim, pois eu estarei brilhando lá de cima por você.
-com amor, Lily.''

𝑷𝑶𝑹𝑵𝑺𝑻𝑨𝑹Onde histórias criam vida. Descubra agora