𝟒𝟔: 𝐓𝐡𝐫𝐞𝐞 𝐓𝐚𝐫𝐠𝐞𝐭𝐬

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Kastiel Kaltain

18 anos atrás...

Tudo ao meu redor estava envolto em cinzas, uma névoa branca impregnada de gás asfixiante que me sufocava lentamente, roubando cada fragmento da minha sanidade, segundo após segundo, nesse maldito lugar.

Cada vez que desejei nunca ter nascido, cada vez que implorei pela morte durante as sessões intermináveis de tortura, cada vez que resisti ao que me destruía — tudo isso ainda está aqui. As cicatrizes ainda queimam na memória.

Hoje é meu aniversário de oito anos, e acabei de sair da sala de treino do meu pai. É claro que saí em desvantagem, pois ele nunca pega leve comigo. Seu objetivo é ensinar, mas o faz através da dor.

Minha semana é meticulosamente planejada por ele, desde os treinos corporais e de tiro até as saídas para boates, onde sou forçado a assistir mulheres despidas. Koby insiste que isso vai me ajudar a desenvolver uma apreciação pelas "fêmeas", mas, na verdade, eu ainda não sinto atração por ninguém.

Ver meu reflexo no espelho faz meu estômago revirar. Estou machucado de novo, como sempre estive, desde que nasci. Meu corpo é uma tela de cicatrizes, e eu nunca consegui escapar delas, nem mesmo quando era um bebê. Koby já me queimou com uma colher quente quando eu tinha apenas dois meses, alegando que essa era a única maneira de manter minha mãe obediente.

Eu também sou punido pelas ações dela, mas sei que ela não é culpada. Ela apenas tentou fugir comigo para bem longe dele.

Eu realmente não consigo entender por que ele faz isso comigo e com a minha mãe. Às vezes, tudo o que desejo é ter uma família normal, especialmente quando vejo como as coisas são diferentes através da janela.

A família do meu vizinho e melhor amigo, Dante, é complicada, mas não tão conturbada quanto a minha. Dante e eu somos vizinhos, e eu observo, através da janela do meu quarto, Mariah, a empregada da casa, cuidando dele como se fosse seu próprio filho, já que ele nunca conheceu sua mãe. Ela brinca com ele, o faz sorrir enquanto estão no quintal, como as famílias normais fazem com seus filhos. Talvez seja assim que uma família de verdade deva ser.

Minha mãe estava fora de seu quarto hoje, mas apenas para cozinhar para Koby, preparando comidas ou chás. Geralmente, ele a soltava apenas para isso, quando precisava que ela servisse como uma empregada. Suponho que estejamos recebendo visitas.

— Kastiel!

Ouvi meu pai gritar dos corredores. Meu corpo instantaneamente enrijeceu ao lado da cama, seus olhos azuis encontraram os meus.

— Estou aqui — respondi, assustado.

Seus olhos percorreram o quarto, avaliando-o como se fosse uma mercadoria. Finalmente, ele voltou a me encarar.

— Tenho visitas novamente. Sabe como se comportar, não sabe? — perguntou com hostilidade.

— Sim, não devo sair do quarto até que você me permita — repeti suas palavras, aquelas que sempre me forçava a lembrar.

Meu pai sempre recebia visitas, fossem elas homens, mulheres, e às vezes até crianças, mas essa era uma criança especial.

Ele recuou, afastando-se da porta do meu quarto, deixando uma leve sensação de alívio em mim.

Será que ela viria novamente?

Com as visitas do meu pai, sempre vinha uma garota. Ela era a garota mais bonita que eu já havia visto em toda a minha vida, mas também muito tímida. Sempre que vinha com seus responsáveis para tratar de negócios com Koby em seu escritório, ela caminhava pelos corredores perto do meu quarto, me lançando olhares disfarçados. Mas nunca falou comigo. Na última vez que tentei me aproximar, ela correu.

𝐃𝐄𝐀𝐑 𝐋𝐔𝐂𝐈𝐅𝐄𝐑Onde histórias criam vida. Descubra agora