As margens do incompreensível

47 7 0
                                    

CARLOS SAINZ

O quarto era um cenário de silêncio, apenas entrecortado pela respiração dela, leve, como se se esforçasse para não deixar nenhum som escapar. A tarde caía lentamente do lado de fora, derramando um tom laranja sobre as paredes, que se misturava ao azul frágil que enfeitava suas unhas, aquelas que ela mordiscava com uma frequência inquietante. O céu de fim de tarde, quase escuro, lançava uma penumbra vaga no quarto, uma dança de sombras e luzes refletidas que parecia tentar nos envolver, enquanto ela se concentrava no celular em suas mãos, como se as palavras que lia contivessem um segredo impossível.

Não trocamos uma única palavra desde que chegamos ali, e mesmo sem nos falarmos, a tensão no ar parecia densa, como se algo não dito pairasse entre nós. Os olhos dela se prendiam a cada linha na tela do celular, mas o brilho fugaz no fundo daqueles olhos não escondia a inquietude. Ela parecia absorta, perdida em algo que eu desconhecia — talvez não quisesse que eu soubesse, talvez nem soubesse ela mesma.

Finalmente, ela levantou-se. Fez isso com uma leveza que contrastava com o peso invisível que parecia carregar. As mãos ainda tremiam levemente, enquanto sua respiração entrecortada mal escondia a intensidade de algo que borbulhava dentro dela.

— Preciso tomar um ar — murmurou ela, quase para si mesma, e já caminhava em direção à porta, como se estivesse decidida a sair antes que eu pudesse responder.

— Claro — respondi instintivamente, levantando-me. Ela parou ao chegar à porta, como se a atmosfera densa do quarto tivesse amarrado seus pés ao chão, e voltou-se para me encarar com uma expressão indecifrável.

Ela aproximou-se de mim de novo, cruzando os braços como se estivesse preparando uma armadura. Os olhos fixos nos, como se estivesse se perguntando se havia algo escondido atrás da minha quietude.

— Antes de qualquer coisa, não pude deixar de notar... — começou ela, sua voz agora mais firme, mas carregada de algo que parecia raiva reprimida. — Você passou esse tempo inteiro me tratando mal, disse que queria conversar, que tínhamos coisas para resolver. Falei a mesma coisa. Mas, agora que finalmente estamos aqui, depois de tudo, você não diz uma palavra. Apenas conta uma história esfarrapada pro seu pai, e bom, fica por isso.

O silêncio tomou conta novamente. Eu não sabia o que responder; as palavras travavam em minha garganta. Ela ficou ali, em frente a mim, me encarando, esperando algo. Esperando uma resposta. Algo que justificasse aquilo que nem eu mesmo sabia se era justificável.

— Pra começar, quando foi que chegamos até aqui? — O tom dela carregava uma urgência desesperada. — Me explica, Carlos. Eu realmente preciso entender se devemos ou não por um fim nisso. Eu não te vejo dessa forma, isso tá saindo do controle.

Ela continuava a me fitar, os olhos agora mais frios, como se tentasse me decifrar e, ao mesmo tempo, proteger algo que a machucava. Uma linha tênue entre mágoa e algo que parecia expectativa frustrada se desenhava em cada traço de seu rosto.

— Eu que te pergunto, a culpa é sua e do seu irmão por ter me metido nisso, nos dois concordamos que saiu do controle, e eu compreendo e não vejo mais necessidade alguma de continuar nessa brincadeira.— Perguntei, tentando manter o tom de voz neutro, mas sentindo a dureza da pergunta me pesar.

Ela respirou fundo, talvez em busca de uma calma que eu sabia que não estava lá, e voltou a se sentar na poltrona, jogando o celular ao lado com desinteresse. A postura que ela assumiu parecia rígida, como se cada gesto fosse medido e precisasse se manter sob controle.

— Eu só... — ela começou, e a voz saiu em um fio, antes de se firmar. — Apenas vamos ser sinceros, eu entendo que é culpa minha, até porque faço de tudo por Liam, mas essa situação já está acabando comigo, e então devemos tomar a última decisão.—
Sem me dar conta, cruzei os braços, espelhando a postura dela.

At Hing Speed- Carlos SainzOnde histórias criam vida. Descubra agora