Thaila Garcia
São PauloMe lembro bem de quando era mais nova e as pessoas me diziam que ter pais separados não era tão ruim assim. "Você vai ter tudo em dobro", falavam. Duas casas, dois quartos, e até dois países. No começo, eu até acreditava nisso. Realmente, não era tão ruim. Mas quando fiz 18 anos e decidi não ir sempre para a Colômbia ver meu pai, a coisa ficou mais complicada. "Por que, Thaila?" perguntavam. A verdade é que eu não me sentia mais próxima do meu próprio pai, aquele que eu tanto admirava. Hoje, nossas ligações são quase uma tortura, e enquanto eu me maquiava para as fotos, eu respondia Jorge sem a menor animação.
— ¿Cómo estás, hija? — a voz do outro lado da linha me trazia um misto de nostalgia e desconforto.
(Como tá, filha?)
— Bien, papá. — respondi, enquanto aplicava a base no rosto, apressada.(bem, papai)Ele começou a perguntar sobre minha carreira de modelo, como estava indo e se eu tinha conseguido novos trabalhos.
— ¿Y qué tal tu carrera de modelo? ¿Te va bien?
(E como foi sua carreira de modelo? Você está bem?)Revirei os olhos, já sabendo que ele perguntaria isso.
— Sí, va bien... — disse, sem entusiasmo, mexendo no delineador. (Sim, vai bem)
— ¿Has tenido muchas fotos esta semana? — ele insistia, tentando puxar mais conversa. (Tem tido muitas fotos essa semana?)
— Sí, papá, muchas... — respondi, apressada, tentando encurtar a ligação. (Sim, pai, muitas)
Ele ainda continuava falando sobre como era importante que eu me dedicasse à minha carreira e como ele se preocupava com isso, mas minha mente já estava em outro lugar.
— Mira, papá, tengo que terminar de maquillarme, ¿vale? — interrompi, tentando ser educada, mas deixando claro que não queria mais continuar a conversa.
(Olha, pai, tenho que terminar de me maquiar, ok?)— Ah, bueno... solo quería saber cómo estabas... — ele disse, num tom de voz um pouco mais baixo, talvez percebendo minha falta de interesse. (Ah, bom só queria saber como estava)
— Estoy bien, papá. Te llamo luego, ¿vale? — menti, sabendo que essa ligação só aconteceria de novo no próximo mês, se ele insistisse. (Estou bem, pai. Te ligo logo ok?)
Desliguei o telefone e soltei um suspiro. Não era que eu não gostasse do meu pai, mas cada conversa parecia cada vez mais forçada, como se estivéssemos nos tornando dois estranhos.
Enquanto eu terminava de aplicar o batom, ouvi a porta do quarto bater devagar e vi Ísis entrando, toda animada, com uma maleta de maquiagem na mão.
— Amiga, cheguei pra me maquiar com você! — disse ela, já pegando uma cadeira e se ajeitando ao meu lado no espelho.
Dei um sorriso, tentando me livrar da sensação estranha que ainda me rondava depois da ligação com meu pai. Era sempre assim, aquela mistura de alívio por desligar e uma pontinha de culpa por não conseguir manter uma conversa decente com ele.
— E então, depois daquele jantar lá na casa da Milena e do Murilo, você e o Maurício ficaram mais próximos? — Ísis perguntou do nada, me pegando desprevenida. Fazia uma semana desde aquele jantar e, claro, o que veio à minha mente não foi Maurício, mas o que aconteceu depois... Richard saindo escondido da minha casa, os dois revivendo o passado com as cartas e lembranças. Sorri, meio que automaticamente, ao lembrar de como ele tinha me feito rir e esquecer o mundo por algumas horas.
Mas logo voltei à realidade. O que Ísis tinha perguntado mesmo? Ah, Maurício.
— Não, não tô muito pra relacionamento agora. — respondi, voltando a atenção para a maquiagem e fugindo de mais perguntas.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Entre nós- RICHARD RIOS
FanficQuando seus caminhos se cruzaram novamente, a cidade grande e suas complexidades apenas acentuavam as tensões e as mudanças que ambos carregavam.