🍁CAPÍTULO 35🍁

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🍁Luiz

O sol já estava alto quando o dia finalmente tomou seu ritmo rotineiro na fazenda. Leo saiu para cuidar das coisas de sempre, passando pelo gado, conferindo as instalações da fábrica de açúcar e o processamento do café. Já eu segui para os canaviais e cafezais, observando o trabalho dos homens e mulheres que agora estavam sob nosso cuidado, mas, ao contrário de outros tempos, não mais como escravos.

Caminhei entre as fileiras de cana-de-açúcar, ouvindo o farfalhar das folhas ao vento e vendo o esforço das mãos que colhiam a cana com habilidade. Eles não estavam mais acorrentados a uma vida de sofrimento. A cada passo que eu dava entre eles, sentia o peso da responsabilidade que carregávamos: devolver a dignidade que lhes foi roubada.

Leo e eu tínhamos feito uma promessa: nenhum trabalhador viveria como eu vivi um dia. As condições que eles enfrentavam antes eram impensáveis para nós agora. O calor escaldante, as jornadas intermináveis, e os ferimentos constantes faziam parte de uma realidade que queríamos deixar para trás.

Enquanto inspecionava o campo, encontrei Joaquim, um dos trabalhadores mais velhos, com o rosto marcado pelas décadas de serviço duro. Ele sorriu ao me ver, enxugando o suor da testa com o lenço surrado que sempre carregava no bolso.

— Bom dia, patrão Luiz. O senhor veio ver o andamento da colheita? — disse ele, com um brilho de respeito nos olhos.

— Sim, Joaquim. Está tudo indo bem? — perguntei, me abaixando para pegar um punhado de terra, sentindo sua textura seca e dura.

— Está sim, graças a Deus e ao senhor e ao patrão Leo, que tão cuidando da gente. Nunca imaginei viver para ver esse dia.

Senti um nó na garganta, uma mistura de orgulho e tristeza por tudo que aquele homem já havia enfrentado antes de chegarmos até aqui. Eu sabia o que ele queria dizer sem precisar de muitas palavras. A liberdade que agora experimentavam era algo que ele sonhara por toda a vida, mas que acreditava nunca ser capaz de alcançar.

— A liberdade é o direito de vocês, Joaquim. — falei, tentando manter a firmeza na voz. — Não se trata de bondade da nossa parte, é o certo. E logo todos vão receber suas cartas de alforria, como prometemos.

O rosto de Joaquim se iluminou com a menção da alforria, e eu senti o impacto disso em meu coração. A sensação de estar fazendo a coisa certa, de devolver a eles aquilo que sempre foi de direito.

Continuei a caminhar pelos campos, cumprimentando outros trabalhadores e ouvindo suas histórias. A cada passo, sentia que a fazenda, antes marcada pela dor e pela exploração, estava se transformando num símbolo de esperança e renovação.

Quando o sol começou a se pôr, encontrei Leo novamente no caminho de volta para casa. Ele estava suado, com a camisa parcialmente aberta, visivelmente cansado, mas com um sorriso satisfeito no rosto.

— Como foi o dia? — perguntou ele, se aproximando e me dando um beijo suave na testa.

— Produtivo. Joaquim me disse que está orgulhoso do que estamos fazendo. Acho que nunca vou me acostumar com essa sensação... — confessei, olhando para o horizonte dourado à nossa frente.

Leo me abraçou pelos ombros, puxando-me para mais perto enquanto caminhávamos em direção à nossa casa.

— Estamos mudando o mundo, Luiz. De pouquinho em pouquinho, estamos fazendo a nossa parte. — Ele disse, a voz firme mas suave, como se quisesse que aquelas palavras fossem gravadas na minha alma.

O peso de tudo o que conquistamos juntos, de como nossas vidas estavam tão diferentes do que um dia foram, era algo que eu não podia ignorar. Havia dias em que me pegava olhando para o céu, grato por ainda estar vivo, grato por ter encontrado Leo, e por termos transformado a fazenda num lugar de justiça.

VENDIDO AO ALFA [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora