🍁Luiz
O sol da tarde caía forte quando Leonardo e eu finalmente chegamos à cidade. A movimentação era intensa, as ruas estavam agitadas de um jeito diferente, como se um peso enorme estivesse pairando sobre todos. Não demorou muito para que percebêssemos o motivo: a abolição da escravatura era o único assunto em todas as rodas de conversa. Homens de terno, fazendeiros e até mesmo gente que nem dependia diretamente do trabalho escravo, todos estavam em alvoroço, discutindo o impacto da nova lei.
Enquanto Leo e eu caminhávamos pelas ruas de paralelepípedo, pude notar a inquietação nos olhares das pessoas. Alguns nos encaravam de forma estranha, como se soubessem que nosso posicionamento era diferente do deles. Ao contrário de muitos senhores de terras, Leonardo havia mudado, sua visão de mundo era outra, e o dinheiro não era mais sua prioridade. Mesmo assim, o ambiente tenso era palpável.
— Não se afaste de mim hoje, — Leonardo murmurou, segurando meu braço de forma protetora. — Os ânimos estão exaltados. É melhor ficarmos juntos.
Assenti, entendendo o que ele queria dizer. Havia uma energia volátil no ar, e qualquer deslize poderia ser perigoso. Seguimos juntos em direção ao tribunal, onde Leonardo precisava despachar com o juiz para garantir que a implementação da Lei Áurea fosse oficializada na nossa fazenda. Ele queria fazer tudo certo, entregar os documentos que dariam a liberdade plena aos trabalhadores.
Quando chegamos ao prédio do tribunal, ele me lançou um olhar sério.
— Fique aqui no saguão, Luiz. Não vai demorar. — Leo entrou na sala, desaparecendo pelas portas de madeira maciça, e eu fiquei parado no hall, cercado por outros homens que pareciam também estar ali para resolver negócios relacionados à abolição.
O tempo foi passando, e eu comecei a me sentir inquieto. Leonardo demorava muito. Não sabia se era a quantidade de papéis ou o trâmite complicado, mas algo me dizia que não seria tão rápido quanto ele imaginava. Olhei ao redor, os ânimos estavam acalorados, e, embora ninguém estivesse em conflito aberto, o peso das discussões ecoava pelas paredes do tribunal.
Decidi sair para tomar um ar. A cidade estava quente e abafada, e eu precisava respirar um pouco fora daquele ambiente tenso. Quando pisei novamente nas ruas, o barulho e a agitação da cidade me envolveram imediatamente. Meus olhos vagaram pelo centro, e foi então que vi um sorveteiro parado, com sua pequena carroça de metal, vendendo sorvetes.
Sorri ao ver aquilo. Fazia tempo que eu não tomava sorvete. Fui até ele, empurrando os pensamentos sobre a abolição para longe por um momento, e pedi um sorvete simples de creme. O homem me serviu rapidamente, e, por alguns instantes, tudo pareceu mais leve. O sorvete gelado derretendo em minha boca trouxe uma pequena pausa no turbilhão de emoções que eu estava sentindo.
Enquanto lambia o sorvete, observei o movimento ao meu redor. As pessoas continuavam discutindo, algumas exaltadas, outras pareciam estar em negação sobre a realidade que se impunha. No entanto, de onde eu estava, me senti seguro, sabendo que, ao lado de Leonardo, estávamos fazendo o que era certo.
O tempo parecia se esticar, e comecei a me perguntar quanto mais Leonardo demoraria no tribunal. Terminei o sorvete e dei uma última olhada na praça antes de decidir voltar para o saguão. Senti um calafrio ao passar novamente pelas rodas de conversa acaloradas sobre o fim da escravidão, mas me mantive firme. A liberdade era inevitável, e o que quer que acontecesse, estávamos prontos para enfrentar.
Quando voltei para o tribunal, ainda pude sentir o mesmo peso no ar. Sentei-me em uma das cadeiras e esperei Leonardo finalmente sair, já me preparando para compartilhar com ele a tranquilidade daquele breve momento, enquanto tomava o sorvete que, de algum modo, me lembrou da simplicidade da vida, mesmo em meio a grandes mudanças.
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VENDIDO AO ALFA [CONCLUÍDO]
FanficEm um Brasil escravocrata, onde a liberdade é um sonho distante, Luiz Fernando, um jovem órfão e marcado pela brutalidade da vida, descobre que seu destino foi selado sem sua permissão. Vendido como propriedade, ele agora pertence a Leonardo de Andr...