Sai da viatura calada, envergonhada, porém, de cabeça erguida.
Sim, estava com vergonha do meu tio, mas não, não estava com vergonha do que havia feito.
Skylert mereceu aquela surra, ela procurou aquilo, não pude evitar, nunca fui de levar desaforo pra casa, ela com toda aquela metidez não iriam mudar meus conceitos.
- Vá para seu quarto, já subo com sua tia. – tio Rogério falou severo, sua voz áspera como uma lixa.
Não baixei a cabeça. Orgulhosa de mais. Cabeça dura de mais.
Tudo bem que meus atos estavam errados, eu concordo, briga nunca acaba em nada, é só um entretenimento para os outros, no fim, a raiva entre os que brigavam fica ainda maior. Meus pais me ensinaram isso.
Mas o que meu tio havia feito comigo, ficaria sempre gravado. A cena dele me arrastando no meio da multidão não ficaria só nas memorias de quem estava na festa, ficaria pro resto da vida pra quem quisesse ver. Tinham câmeras apontadas pra minha cara enquanto era arrastada até a viatura por toda parte. No outro dia de manhã, no máximo, todos os sites poderiam ver minha vergonha.
A menininha que sabe brigar, e o tio policial.
Senti raiva. Vergonha. E medo.
Mais medo ainda quando meu tio entrou sem bater no meu quarto seguido por tia Loren.
- Pode nos explicar o que foi aquilo Paige?
- Hum, uma festa...
- Não se faça de tola Paige! Você espancou aquelas três meninas Paige. Três!
- O quê? Ta brincando, aquilo não chegou nem perto de um espancamento.
- E o que foi então Paige? Elas ficaram inconscientes! – ele jogou na minha cara como-se fosse me afetar o fato de eu ter apagado três mimadas.
- Eu não as espanquei! – falei irritada
- Espancou sim Paige, e eu duvido que os pais delas não batam nessa porta amanhã. Eu sou chefe de policia Paige, sabe o problema que isso vai me causar? – ele falava alto. Irritado.
- Aquilo não foi um espancamento. – repeti.
- Então o que foi? – ele gritou tão alto que tia Loren saltou.
- Uma briga inútil. Que só aconteceu por que elas me provocaram! Aquilo não foi um espancamento! Um espancamento é o que fizeram com meu pai! Ele sim foi espancado. Elas não foram espancadas, elas apenas levaram uma surra que precisavam levar para encontrarem os seus devidos lugares no mundo! – gritei tão alto quanto ele, com lagrimas a ponto de cair.
Tia Loren chorava, com as mãos na boca tentava abafar seus soluços.
- Você perdeu seu pai para alguém com raiva Paige. A mesma raiva que você sentia. – ele me assombrou com palavras frias e calmas.
- NÃO! – gritei chorando – Eu não sou uma psicopata como aquele monstro, eu não sou assassina!
- Eu sei que não é Paige. Só não deixe que os outros pensem o contrário. – ele falou frio como gelo.
Não acreditava que ele estava me dizendo aquilo. Dizendo que eu era como aquele homem cruel. Aquele homem horrível que tirou meu pai de mim. Chorei baixo. Era orgulhosa de mais pra permitir que visse minha tristeza.
- Está de castigo por tempo indeterminado – ele proclamou – Me dê seu celular. Está confiscado. - ordenou estendendo a mão.
Larguei o celular na mão dele.
- Sem festas. Sem visitas. Sem sair pra lugar algum. De casa pra escola e da escola pra casa.
Tia Loren que permanecia calada me olhou. Seus olhos transmitiam pena. Pena de mim. Ela sabia que tio Rogério estava sendo severo, que suas palavras eram severas de mais. Mas não podia intervir. Quem fazia as regras não era ela.
Permaneci calada. Olhando pra seus sapatos. Ele ainda estava com sua farda.
- Você nos decepcionou Paige. Seus pais nunca te deram essa educação. Nem eu e sua tia. Nem seus avos. Ninguém nunca te ensinou que brigar resolve alguma coisa. Eu juro que esperava essa atitude de qualquer um. Menos de você. – ele disse, me olhou por alguns instantes e saiu do quarto seguido por minha tia.
Pressionei o travesseiro contra meu rosto e gritei até minha garganta arder.
Nada disso estaria acontecendo se meus pais não estivessem mortos. Eu não estaria nessa cidade idiota. Não teria nem botado os pés naquela festa estupida. Nada teria acontecido. E eu ainda seria feliz. Feliz com meus pais, com meus amigos, meus vizinhos, ainda teria o Coody, meu cachorro que teve que ser largado no canil quando minha mãe ficou doente. Não teria conhecido Pilar ou Carlos. Estaria tudo bem. E eu ainda seria feliz.
Tomei todos os comprimidos que Dra Agatha havia passado de uma vez. Logo uma súbita tontura apossou o meu corpo. Minha cabeça estava girando. Meus olhos piscavam lentos, quase se fechando. E quando finalmente permiti que eles se fechassem, nenhum dos remédios fizeram efeito.
E eu sonhei.
- Devemos adorar a Deus querida. – minha mãe dizia sorrindo.
- Adorar mamãe? – eu perguntava com um olhar cheio de curiosidade.
- Sim minha princesa.
- Mas por que?
- Por que ele nos fez meu amor, nos deu tudo o que temos, nos deu a capacidade de respirar, falar. Nos deu amor minha filha.
- Como ele deu amor mãe?
- Ele mandou seu filho, o único filho, para morrer por nós, para ser humilhado e espancado, para que nós pudéssemos viver.
Eu coloquei as mãos na boca espantada. Cada vez mais curiosa.
- Você faria isso por alguém mãe? – Perguntei com medo da resposta .– Me daria para ser humilhada e espancada por outras pessoas?
- Jamais minha filha. – Ela disse e me abraçou apertado.
- Mas por que não mãe? Se Deus deu o filho dele por nós, você não deveria dar a sua por ele?
Ela riu um pouco para depois responder:
- Esse foi um sacrifício que só Deus consegue fazer meu amor. Deus é perfeito de mais. Nós não somos perfeitos como ele. Na verdade, somos pecadoras, ingratos e egoístas. E é por isso que devemos adora–ló, por que ele nos ama muito. E nós faz feliz a cada dia mais e mais. Por que cuida de nós. Tem misericórdia de nos mesmo com nossos pecados.
Eu fiquei radiante. Não acreditava que podia existir alguém tão maravilhoso assim. E naquele momento, mesmo tão pequena e vulnerável, eu senti o amor de Deus.
- Eu quero adora–ló mamãe! – Eu gritei. – Pra sempre mamãe, quero adora–ló pra sempre!
E então acabou. Tão de repente como surgiu, o sonho sumiu. Dessa vez não houve gritos nem agonia.
Apenas lagrimas de saudade. Saudade de quando ainda era feliz.
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Lutando pelo amor
SpiritualPaige West de 17 anos depois de perder os pais se muda para NYC para morar com os tios. Lá conhece a arte do boxe, e também a Cristo. Os dois tomam um grande espaço no coração de Paige. Mas ela ainda terá que encarar muitas coisas na descoberta dess...