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(Eva)

Algumas, muitas bolhas de luz compõe minha visão. Apenas frascos. Ainda tenho a visão embaçada, mas quando me pego lúcida sinto um braço masculino envolver-me a cintura, abraçando-me por trás, num afago gentil e carinhoso. Retiro a máscara, para assim enxergar melhor. Por mais que a noite anterior tenha sido confusa, ainda sim, lembro-me o quanto foi prazerosa. Quase não me lembro de sua face, apenas sei que ele é muito bonito.

Fito o seu braço peludo e repleto de pintinhas, penso em despertá-lo, mas ele faz isso por si só. Nós levantamos juntos, enquanto coçamos nossos olhos para o embaçado de nossas visões sumir.

No fim do bocejo, ele olha para mim. O homem espantado pula para trás, mais aparecendo estar em um pesadelo.

- O que houve? - Franzo o cenho, tentando entender o motivo dos olhos arregalados e músculos tensos do homem.

Ele rapidamente retira inúmeras notas de cem de sua carteira e estende em minha direção. Aflito o suficiente para fingir que o que houve ontem não significou nada.

- Vá embora. - Ele é seco ao andar para trás e tão pouco possui coragem de encarar-me.

Olho para as minhas vestimentas e noto que estou de calcinha e o seu blusão. - Olha, o que eu te fiz? - Ando um passo para frente, mas ele recua.

- Você é um fantasma do meu passado, isso não é possível... - Desesperado, o homem balança freneticamente sua cabeça negativamente.

- Mas que merda que você está falando? - Ando rápido em sua direção, afim de sacudi-lo, mas ele vira de costas para mim.

Fulmino a enorme tatuagem de caveira que encontro nas costas do homem. Eu a conheço muito bem.

- Não... - Levanto o indicador, encarando minha descoberta com choque. - Você não pode ser ele... - Rio de nervoso.

- Não, eu não quem você pensa quem é. - Ele aponta suas mãos em minha direção, tentando redimir-se, mas eu o acometo com diversos tapas em seu peitoral.

- Seu desgraçado! - Ele cai em cima da cama, tentando proteger-se com um de seus braços, mas logo o pego de tapa lá mesmo, tentando de todas as formas bater em sua cara, mas por justamente ser mais forte, ele me taca para baixo dele, prendendo meus braços.

- Eu te odeio!!!!! Eu te odeio!!!!!!! - Berro estericamente, tentando de todas as formas soltar-me.

- Para. Para. Para! - Ele tenta segurar toda a minha pressão, até que perde a paciência e me esbofeteia a cara. - Mas que porra! - Ele grita.

- Eu não te estuprei e muito menos matei o seu pai- Bufando, ele pragueja toda a verdade na minha cara.

Ele sai de cima da cama, levando suas mãos à cabeça, claramente perplexo e arrasado. - Eu não fui homem, tive medo. Não pude impedir.

Sento-me na cama, amparando com minha mão esquerda o lugar ferido do meu rosto. Permaneço calada enquanto ouço cada palavra.

- Eu fui no hospital visitar você... - Seus ditos são carregados de euforia, junto com seus olhos que transbordam lágrimas. - Minha vida estava começando a guiar-se num caminho certo, eu não podia me encrencar, por mais que eu soubesse que o que estava acontecendo é errado eu não podia fazer nada para evitar. Ele me mataria, assassinaria meus filhos...

Levanto da cama e pego meu sobretudo do chão, o vestindo com brutalidade. Minha cara está amarrada e meu ódio claramente exposto. Quando estou à caminho da porta, ele me segura o braço.

- Foi o seu pai, ele está vivo. Forjou a própria morte para culpar-me por tudo... - O homem tenta decifrar-me de todas as formas, mas eu apenas livro-me de suas garras.

- O meu pai? Ele está morto, pois você o matou e eu vi! E depois estuprou-me! Vi essa maldita tatuagem, é a única coisa que me lembro!!! Ah, tem mais. Sabe o nosso filho? O fruto da sua canalhice? Então... Ele está morto!!!! - Minha garganta arranha com o volume em que berro, maior que isso, só o impacto de meu soco que deposito no rosto dele.

Saio apressada do quarto, percorrendo o corredor quase caindo, choro com tanta força, que sinto que vou sangrar. Por sorte, encontro um táxi na porta e logo o adentro.

O motorista percebe minha aflição e pisa fundo. Eu quero gritar, mas sei que ninguém poderá me ouvir, envolvo meu braço ao meu redor e choro até minha barriga doer, meus braços ficarem fracos e minha vontade de viver for diminuindo. A situação encontra-se tão grave, que não sou capaz de controlar os inúmeros soluços que me tomam, junto com minha cara vermelha e nariz escorrido.

Talvez minha mãe estivesse certa todo esse tempo.

Não há começos, meios e muito menos finais felizes para garotas como eu.


Ego FlamejanteOnde histórias criam vida. Descubra agora