Cap. 04 - Percepções

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A sala grande e luxuosa, de cores claras e suaves, bem arejada e iluminada pela luz natural que provinha da enorme janela de acesso à sacada, possuía uma decoração leve e feminina, adornada por belos quadros de jovens camponesas, tecidos florais nos estofamentos, cortinas de seda, arranjos fartos de flores, móveis e piso em cerejeira.

Era uma sala destinada ao chá e às visitas.

Victor Bogarim, um rapaz de dezoito anos, de cabelos encaracolados até os ombros e olhos acobreados, aguardava pacientemente por Moisés, seu irmãozinho de sete anos, para levá-lo de carona à escola em seu caminho para a faculdade.

Sentado na poltrona de estofado generoso, de frente à janela que mostrava as árvores do extenso jardim, detinha-se centrado em um arranjo de Acácias brancas e rosadas que estava sobre a mesinha redonda, suportando o vaso com as flores e um livro de arte.

Dedilhava suavemente as pétalas de algumas das flores quando algo pesado pula por sobre o espaldar da poltrona, caindo em seu colo e deslizando até o chão em uma cambalhota.

Embora pego de surpresa, Victor sabia que esse "ataque" vinha de seu irmão.

O garotinho não conseguia conter sua risada infantil de alegria.

– HA HA HA! Consegui! Consegui! Te peguei se surpresa! Te pegue-eei!

A primeira impressão é a de que Victor fosse brigar com o irmão, mas após a surpresa, ele sorri complacente.

– Eeeh! Você tá ficando bom nisso, pirralho! Desta vez você me pegou de verdade!

Moisés põe-se em pé, encarando desconfiado o irmão.

– Isso tá muito estranho! Você sempre percebe tudo! Foi de verdade ou você tá fingindo só pra me enganar?!

– Não estou fingindo e nem enganando! Respeite seu irmãozão, pirralho! É sério! Você me pegou de surpresa desta vez, pra valer!

O garotinho arregalou seus enormes olhos castanhos.

Em sua pureza infantil ainda havia a sensibilidade e a percepção que os adultos perderam.

– Pra valer mesmo, é? Vitu, então você tá com algum problema?!

Victor riu.

– Problema? Claro que não! Apenas estava distraído... –

Involuntariamente, Victor se voltou para o arranjo de Acácias.

Moisés, sendo o garotinho esperto que era, acaba por ligar um fato ao outro.

– Você gostou das flores novas da mamãe? É isso que te distraiu?

– Você é bastante esperto, pirralho... e intrometido também.

– São da loja do Seu Virgílio, que mamãe e eu descobrimos um outro dia, quando a gente voltava da minha escola... ela gostou de lá e agora compra as flores dele! Lá é legal!

– É... ele sabe trabalhar com as flores... mesmo cortadas, elas ainda têm vida! Mas, vamos deixar essa bobagem de lado, senão nos atrasaremos!

O garotinho estapeou a testa, fazendo um sonoro estalo.

– Iih! Esqueci a minha mochila no quarto! 'Peraí que vou lá buscar! –

E saiu correndo, batendo os calcanhares no traseiro.

Victor ri e meneia a cabeça, levantando-se e jogando a própria mochila no ombro.

Voltou-se novamente para o arranjo de Acácias.

Hybrida - Asas NegrasOnde histórias criam vida. Descubra agora