Cap. 29 - Decisão

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Apesar de já ser meados de junho, o dia estava ensolarado e até mesmo quente, como se estivesse prestes a entrar na Primavera e não no Inverno.

Yashalom caminhava pela alameda que levava à Floricultura Blodeuwedd.

Em seus passos longos de pisadas leves, a saia longa indiana flamulava. Ia cabisbaixa, irritada demais consigo própria, por seus arroubos de impensada sinceridade, por sua mente traiçoeira que, não conseguindo assimilar um fato tal qual era, ficava fantasiando absurdos.

–– Definitivamente aquilo foi um sonho! – Resmungava, olhando cegamente os pés e a calçada. –– Eu sou mesmo uma idiota cheia de imaginação! Essa cabeça estúpida fica me pregando peças, me confundindo toda! O pior é que ainda perco tempo pensando nessas coisas idiotas que sonho, imagino ou sei lá! Ah, Deus! Acho que devo contar logo a minha mãe dessas alucinações que venho tendo! Talvez, assim como nas outras doenças, quanto antes se tratar, mais chances se tem de ficar bom!
Parou, escondendo o rosto nas mãos.

Ela estava envergonhada e arrependida de tudo: das coisas que ela imaginou que tivessem acontecido ontem no assalto; o raro e efêmero momento terno passado com Wojtyla; até o fora mais recente que dera nele e, que desta vez, parecia tê-lo magoado para valer!

Depois de tudo o que ele já lhe provou – o coleguismo em não delatar seus atrasos à sua mãe; ele ter se preocupado em trazê-la para casa na noite anterior, depois do assalto; e até tê-la defendido mais cedo no colégio – ela ainda, em uma única frase infeliz, o tratou como lixo!

Como poderia ficar rancorosa com ele, mesmo que ele tenha voltado a tratá-la de forma fria e mecânica?

Não, não poderia. Ela não tinha esse direito!

–– Já que arrependimento não mata, poderia ao menos me fazer sumir!

E permaneceria em suas reflexões por mais tempo não fosse por uma voz alegre e aguda a lhe chamar.

Mas foi preciso que o menino lhe chamasse algumas vezes mais e estar perto dela para que ela o ouvisse, pois estava momentaneamente desprovida dos seus sentidos básicos, tão atordoada se sentia.

–– Yaaashaaa! Tá surda!? Tô te chamando um tempão! – Moisés reclamou bravo, chegando a fazer bico.

Yashalom gelou quando sentiu o magnetismo de um determinado olhar em si, e olhou por sobre o ombro, vacilante.

Victor vinha logo atrás, pois decerto que ele não acompanharia a corrida desenfreada de Moisés para se encontrar com a garota, embora, muito no fundo, quisesse.

–– Estamos matando aula, Ya-ya! – Confessou o sorridente Moisés, puxando insistente a mão da garota. Somente assim para ela dar a devida atenção a ele.

–– Culpado! – Victor falou com a sua típica dissimulação de sentimentos. Mostrava-se extrovertido, com um sorriso que derreteria qualquer moça... menos a em questão.

Yashalom sorriu com afetação, comentando sarcástica e amargamente.

–– Isso não é nada! Vocês podem fazer o que quiserem! Afinal, o mundo está aos pés de vocês, mesmo!

–– Parece que estamos de mau humor hoje...

–– Me desculpe... – Yashalom desviou o rosto, sem graça.

Victor tocou o rosto dela, deslizando a mão pelo contorno, suspendendo o queixo para que ela o encarasse.

–– Já lhe falei para não se desculpar? Assuma os seus atos e suas consequências, mas nunca se desculpe...

–– Isso não seria prepotência demais? Além de ser mal-educado...

–– Depende do ponto de vista. As pessoas respeitam apenas aqueles que se mostram seguros.

Hybrida - Asas NegrasOnde histórias criam vida. Descubra agora