Cap. 03 - Espinhos

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O alarme escandaloso da Escola Federal Darcy Ribeiro tocou, anunciando o horário do intervalo da manhã.

Nem bem terminou o eco, os alunos já arrastavam cadeiras e mesas, saindo apressados das salas num tropel.

Yashalom apenas olhou triste, por uns instantes, para os seus colegas que saíam da sala em algazarra.

Voltou-se imediatamente para os seus cadernos, aonde copiava as matérias perdidas.

Raquel, de longos cabelos encaracolados e grandes olhos castanhos escuros, pára ao lado da mesa, chamando a atenção da amiga.

– Yasha! Vai perder o intervalo de novo?!

A garota sentiu uma pontada de aborrecimento e chegou a olhar feio para a outra, mas abrandou ao reconhecer preocupação no rosto da amiga.

– É o jeito! Estou com muita coisa atrasada para pôr em dia. Pra variar, as copiadoras não estão funcionando! Estamos em maio e este mês há muito o que se fazer na floricultura, e por causa disso estou chegando tarde em casa e não tenho como fazer mais nada, morta de cansaço!

– Aposto que nem tem jantado!

– Sempre dá pra preparar um miojo...

Percebendo que Yashalom não queria prolongar a conversa, Rachel apenas concordou.

– Tá bom, então! Você é quem sabe!

Yashalom voltou aos seus cadernos, escrevendo o mais rápido que conseguia, deixando um rastro de garranchos.

Estava tão concentrada que não percebeu alguém a observando da porta, e nem se deu conta de que tal pessoa se aproximou dela, parando ao seu lado.

Só segundos depois ela notou o vulto, sentindo um gelo inexplicável subir por sua coluna.

Receosa, subiu o olhar até encontrar os olhos esverdeados de Wojtyla, que a observava em silêncio, calmamente.

– Droga! É você?! Por que você tá parado quieto aí?! – Com raiva, a garota jogou a caneta sobre o caderno, que bate com a ponta e solta a tinta, manchando seus garranchos. – Aaah! Olha só o que você me fez fazer!! – Desesperada, passou a mão por sobre a tinta ainda fresca, obtendo um resultado muito pior. Wojtyla interferiu.

– Ah, por Deus! Deixe isso comigo, você só está piorando a situação! – O garoto toma o caderno da mão suja de tinta de Yashalom, que o olha boquiaberta e sem reação. Em troca, ele lhe entrega um pequeno embrulho contendo algo quente e de cheiro bom. – Vá lanchar enquanto eu ajudo com essas cópias. Você não deveria ficar tanto tempo sem se alimentar!

Aquela situação inesperada tirou mais uma vez a reação de Yashalom, mas por pouco tempo.

Orgulhosa, ela quis protestar. Se já era um grande mal ser obrigada a aturar alguém pegando no seu pé, seria ainda pior ter que lhe dever favores!

Não era bem isso que ela entendia por Tutela Estudantil.

Ou preferia não entender...

– Não e não! O que você faz aqui, afinal? Deveria estar aproveitando o intervalo como todo mundo!

– Nem todo mundo está aproveitando o intervalo como deveria, por isso estou aqui...

– Pois... pois não devia! E não devia levar tão a sério essa conversa do Prof. Rubens! Tenho certeza de que você não precisa desses puxa-saquismos pra terminar o Ensino Médio! E fique com isso, eu não quero! – Yashalom estendeu o saquinho de cheiro apetitoso, ignorando completamente sua necessidade urgente de se alimentar.

Hybrida - Asas NegrasOnde histórias criam vida. Descubra agora