8

1.2K 140 3
                                    

Manhattan, NY, 08 de agosto

Querida mãe,

Noite passada me lembrei de uma conversa que tivemos quando eu tinha cinco anos. Estávamos sentados no sofá da sala assistindo ao segundo filme de Harry Potter quando eu me virei para você e perguntei:

- Mamãe, o que é respeito?

Você me olhou com profundos olhos verdes e sorriu.

- Quer a resposta completa ou a concreta?

Eu já estava familiarizado com suas palavras psicanalíticas. Como era orientadora em escolas e hospitais, você sempre fazia de uma simples conversa um diálogo produtivo. Mas, como uma criança, eu apenas franzi a testa. Você sorriu novamente.

- Filho, existem dois tipos de respeito: aquele que se merece e aquele que se impõe. Por exemplo, veja Dumbledore. Muitas pessoas do mundo bruxo o respeitam. Por que você acha que isso se dá?

- Porque ele impõe respeito?

- Sim. Ele é um dos maiores bruxos da história. Mas você não acha que, levando em conta tudo o que ele fez, suas conquistas e o título de maior diretor de Hogwarts, ele merece esse respeito?

Eu assenti, olhando para a televisão. Você continuou.

- Filho, não há nada mais bonito do que ser respeitado pelas coisas que você faz. Desde que siga seus próprios ideais. Você vai descobrir que o mundo não gira como a gente quer. A vida é um jogo complexo e você precisa de ajuda para passar algumas fases. Amigos, família... Isso tudo é importante. Porém, ter o respeito de todas as pessoas ao seu redor, deixa tudo mais fácil.

- Mas, mãe... Impor respeito também não é bom?

- Claro! Ser uma pessoa poderosa lhe dá muitos adeptos. Mas é preciso conquistar este poder através das critérios corretos, é preciso ser indulgente. E existem pessoas que vão contra esses critérios, filho. O mundo está cheio deles.

- Os babacas - Eu disse categórico.

Normalmente, você me daria uma bronca por usar este tipo de palavreado. Mas apenas sorriu.

- Harry, daqui um tempo você vai precisar escolher entre o que é certo e o que você quer. A sociedade irá lhe engolir aos poucos, ninguém está livre disso. Ser uma boa pessoa, ajudar quem necessita de ajuda. Essas coisas te colocam no seu próprio caminho de virtudes. Faz de você merecedor de respeito. Mesmo que não seja aquilo que seu coração mais deseja, no fim, ficará feliz.

Eu fiquei calado por um tempo. Então, novamente, perguntei:

- Mas, mamãe... Existem pessoas que são merecedores sem fazer nada?

Você me encarou por algum tempo, confusa. Então ergueu as sobrancelhas.

- Eu não tinha pensado nisso mas, sim. Às vezes simplesmente respeitamos alguém. Acho que isso acontece quando a pessoa é ela mesma. Não se deixa levar pela alienação, ou pelo contrato social que a sociedade nos obriga assinar quando nascemos.

Me lembro de você olhando pensativa para a TV. Então, de repente, me aconchegou em seus braços.

- Pois é, filho - Sua voz parecia ter uma pitada de orgulho - Você conseguiu me fazer pensar de uma maneira diferente. E, acho que é uma lição que você e eu devemos adicionar às palavras que eu disse antes: Seja quem você é e as pessoas te respeitarão.

Quando o silêncio era quebrado apenas pelo áudio do filme e eu estava quase dormindo em seu colo, você murmurou meio que para si mesma.

- O mundo gira diferente para cada pessoa.

Naquele tempo, eu não tinha ideia do que seria o "caminho de virtudes" ou o que era o tal contrato social. Mas hoje eu entendi o que realmente significa ser merecedor de respeito.

Na festa que fui semana passada, eu me envolvi numa briga. Não uma briga de verdade, eu meio que me salvei de uma surra. Porém não foi isso que me intrigou. Depois disso, durante a semana, quase todos na escola falaram comigo. Não chegaram a conversar, apenas me cumprimentaram. Parece que de algum modo eu ganhei o respeito de todos. E o pior é que eu não entendo o porquê. Era para eu ser o fracote zoado que quase apanhou de um valentão. Mas, ao invés disso, fiquei conhecido apenas por encarar alguém que ninguém tinha coragem de encarar.

Só que ele não é um valentão daqueles que batem por prazer. Eu descobri depois o porque de seu comportamento fechado. Descobri sua história. Descobri que ele havia mudado quem era apenas para agradar outra pessoa. Ele aderiu ao contrato social que lhe foi imposto, mesmo depois de já ter crescido.

Mas, mesmo assim, eu o respeito. O respeito porque ele impõe respeito. O respeito pela atitude de querer me bater quando eu o incomodei, já que isso é seu ideal. O respeito pela forma condescendente com que ele deixou de ser o que era para agradar o pai. O respeito mesmo sem ele ter feito nada para eu o respeitar. Mesmo sabendo que ele não seguiu o próprio caminho de virtudes.

Também me aproximei do garoto depressivo de quem lhe falei. Acabou que ele não é depressivo. É apenas calado, como ele mesmo disse. Além disso, ele também tem uma vida difícil, porém, parece que ele continua traçando seu caminho. E isso faz com que eu o respeite também. Assim como respeito a decisão de seus pais ao seguir os ideais, mesmo que não seja a minha ideia de critério correto.

Enfim... Eu não posso negar que gosto de ser respeitado. Devo dizer que a sensação é ótima. Mas não é algo bonito. Eu não demonstrei meus verdadeiros ideais, não fui indulgente. E sei que daqui um tempo isso irá esfriar, quando alguém quase apanhar em uma nova festa, sei lá. Mas pretendo ganhar o real respeito de todos a minha volta. Não sei se amanhã, ou daqui dez anos. Mas vou aprender a jogar esse jogo chamado vida.

Espero que esteja bem. Dê um abraço no papai.

Com amor,

Harry.

Ps: Parece que realmente fiz novos amigos. Vou confirmar isso com o tempo.

***

Na Flor da JuventudeOnde histórias criam vida. Descubra agora