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Manhattan, NY, 03 de outubro

Querida mãe,

A mente humana é um enigma impossível de decifrar.

Acho que é por isso que simplesmente nos acostumamos com as pessoas ao invés de tentar entendê-las.

Minha alma sempre foi extremamente sensata ao ponto de eu não conseguir entender a injustiça.
E mesmo sabendo que é do feitio do ser humano decepcionar e ser decepcionado, eu não pude deixar de me levar pela ambição de achar que uma garota bonita é mais do que uma pessoa. Porque não é.

Agora são 3 da manhã e acabei de chegar de um encontro. Não foi bem um encontro, mas até que teve seus frutos. Posso dizer apenas que se foi uma tentativa de arranjar uma namorada para Matt, ela teve êxito.

Quando Hellen nos deixou na porta da casa de Ariane - que por sinal, é aqui perto -, eu esperava ter uma noção maior da garota que eu conheci há pouco mais de dois meses. Mas, ao invés disso, descobri que tudo o que eu sabia dela era praticamente nada. Eu sabia sua banda favorita, seu livro, seu filme, mas sua história não passava de uma interrogação em minha mente.

Saber que seu pai é Igor Hoffmann foi um tremendo susto. Isso mesmo! Ela é filha do autor daquele livro que você estava louca para ler, lembra? Mas ninguém sabe disso. E ela planeja que continue assim.

Descobri que sua mãe a deixou. O motivo? O pai não querer ser famoso. Pelo visto, ele não é do tipo que quer aparecer no programa da Oprah ou em qualquer outro lugar. Quer apenas viver e fazer o que ele faz de melhor, sem ninguém lhe enchendo a paciência.

Às vezes eu penso assim também. Não é, tipo, um bloqueio social, sabe? Mas apenas ficar em paz. Curtir a vida sem ter que se preocupar se sua imagem está ou não agradando o mundo. Esse é o problema das pessoas, eu acho. Moldar a própria imagem de acordo com os critérios da sociedade. É o tal contrato social que você me falou. E isso torna as pessoas imparciais, faz com que sejam injustas.

Mas a injustiça é uma constante em nossa vida, assim como o respeito. E eu sei que disse há pouco tempo que aprendi a respeitar as escolhas das pessoas, mas esta noite vi que estava enganado. Eu não posso respeitar o que não entendo. O que eu não concordo, sim, pois cada um tem o direito de fazer escolhas. Mas quando essas escolhas se tornam inexoráveis e até inescrupulosas, eu não posso ser imprudente ao ponto de dizer que as respeito. Mas, quem sou eu para julgar, não é? As escolhas, às vezes, são perigosas. Principalmente as inconscientes. Elas são as que me assustam agora. Eu levei um soco por causa delas.

Sim... Eu briguei. Mas não me dê um sermão está bem? Já basta o peso de não saber até hoje o porque eu fiz aquilo. Não sei se foi instinto de super-herói, como Matt disse após eu sair da sala do diretor, ou se foi pura idiotice. Quando dei por mim, já estava salvando um garoto que eu nunca troquei uma só palavra.

Enfim, John ficou preocupado ao saber, foi até a escola e conversou com o pai do garoto. Ele não me deu um sermão, não me perguntou o porquê, nem falou sobre o assunto depois que chegou em casa. Foi a primeira vez que fiz isso, então eu esperava no mínimo uma discussão. No fim, seu silêncio me incomodou mais do que um castigo.

Meu primeiro bimestre na nova escola passou inesperadamente rápido e tranquilo, mesmo com suas exceções. As amizades que eu achava ter feito se reduziram a três. E isso sinceramente não é ruim. Eu almoço com Matt e Anne todos os dias e de vez em quando Law aparece para conversar. Jonah não é muito de grupo, mas sempre se disponibiliza a dar sua opinião sobre algum assunto quando é chamado. Mas é como dizem, não é? O importante não é a quantidade de amigos, mas sim os que te fazem bem.

Estou morrendo de sono. Meus olhos estão quase se fechando enquanto escrevo. Mas eu não podia deixar de te contar sobre meu primeiro jantar chique. Se você estivesse aqui, ficaríamos horas falando sobre o assunto. Não só sobre isso, mas também sobre a história de Ariane. É incrível como a garota inefável e astuta, capaz de bolar um plano tão requintado somente para ajudar um amigo a arrumar uma namorada, podia ter uma história ao mesmo tempo fantástica e triste.

Mas nada dessa noite conseguiu ofuscar a beleza estonteante e angelical que a garota de cabelos dourados e olhos cinzentos irradiava. E, por não conseguir parar de olhá-la um só minuto, acho que acabei decorando cada detalhe de seu rosto, desde que toquei sua campainha às 20hs até o momento que a deixei segura em casa às duas da manhã.

- Essa é a hora que um jovem de verdade deve ir dormir - Ela disse sorrindo, me fazendo andar os dois quarteirões que separam nossas casas tendo a certeza de que o que sinto é algo bem maior do que paixão.

Mas pensei demais nisso por hoje. Vou me deitar agora.

Espero que esteja bem, mãe. Dê um abraço no papai.

Com amor,

Harry

***

Na Flor da JuventudeOnde histórias criam vida. Descubra agora