Ana tomou mais alguns cafés antes de resolver ir até seu apartamento. Tinha conversado por muito tempo com Marisa e estava decidida a não contar para Marcelo o que tinha acontecido. Por falta de coragem e também por medo de ele não a querer mais como mulher.
Tinha pegado uma roupa emprestada de Marisa e tratou-se de criar uma história um tanto diferente. Sua versão era que Luiz a emboscará na rua e realmente a havia levado até seu apartamento, mas Ana tinha conseguido sair a tempo. O resto Marisa o hipnotizaria para não enche-la tanto de perguntas aos quais ela não queria responder. Chegaram à noite e Ana precisou de alguns minutos na porta de seu apartamento antes de entrar de vez. Marcelo quando viu ela, começou a andar de passos rápidos até um abraço, abraço que Ana não recebeu muito bem, não estava preparada para o toque de outro homem naquele momento, mesmo que esse homem seja Marcelo.
– Meu deus, onde você estava?
– Com Luiz, é uma longa história, o importante é que agora estou aqui.
– Como assim? – Ele analisou sua expressão. – Ana, o que houve?
– Nada, Marcelo. Ele me deixou no apartamento dele, mas eu consegui sair.
Marcelo fitou Marisa e os olhos dela não conseguiram mentir por Ana.
Ele tinha entendido o que tinha acontecido.
Afastou-se um pouco de Ana para analisar seu rosto que segurava as lágrimas que insistiam em cair, percebeu diversos roxos e marcas pelo pescoço da feiticeira.
Aquilo não podia estar acontecendo.
– Por favor, Marcelo, agora não. – Marisa suspirou pesadamente ao falar com ele. – A deixe descansar. Vocês podem conversar amanhã.
Marcelo ainda estava perplexo quando Ana passou por ele e foi para o seu quarto, onde se deitou na cama, local que chorou até dormir.
– Ele não fez isso com ela... – Sentou-se no sofá e colocou as duas mãos sob seu cabelo. – Ele não fez isso com ela, né? – Indagou incrédulo para Marisa. –
– Fez, sua namorada precisa do seu apoio agora.
– Não... Não! Isso não aconteceu.
Ele não queria acreditar naquilo.
– Marcelo, me escute bem. – Ela se sentou ao lado do professor de história. – Você sabe como isso funciona, se lembra daquela aluna do primeiro ano que era abusada pelo pai? – Marcelo assentiu. – Ela ficou frágil, terrivelmente quebrada, lembra? Então, Ana precisa do seu apoio agora, de mais nada, assim como aquela menina precisou de ti quando resolveu contar isso pra você. Cabe a você e somente você ser a base que ela precisa agora.
– Não sei se eu posso fazer isso. – Algumas lágrimas relutantes caíram pela face do rapaz. – Isso não podia ter acontecido com a minha Ana, não podia.
– Isso não deveria acontecer com ninguém. – Marisa suspirou. – Ela virou estatística assim como milhares de mulheres. Você pode fazer isso sim.
Marcelo a olhou inconsolável.
– Ela vai ficar bem. Você também vai. Vão superar isso juntos.
Marisa foi embora e levou com ela Mariana que dormia em seus braços. Quando Marcelo finalmente decidiu ir até o quarto deles, encontrou a mesma dormindo na cama. Sua feição era triste e seu rosto estava inchado. Tal cena cortou o coração do rapaz.
Naquela noite não conseguiu dormir, passou a noite velando pelo sono da garota e culpou-se por ter a deixado sair sozinha justamente naquela noite. Observou que Ana dormia com uma das mãos no ventre e ficou pensando no que ela faria, tudo tinha ido duma vez só. Se nem ele conseguia deglutir toda aquela jorrada de informações ruins, imagina Ana, que estava vivendo tudo aquilo.
Acabou não indo trabalhar no dia seguinte.
Quando era por volta das nove da manhã, Ana acordou um pouco mais leve ao perceber que estava na sua cama e não na de Luiz, ao lembrar-se disso suspirou tristemente. Viu também no quarto Marcelo cochilando sentado no chão. Seus pensamentos logo vieram num misto de tristeza com injuria. Será que ele não havia deitado na cama por estar com nojo de mim? Era tudo Ana pensava ao ver aquela cena e a ideia de Marcelo não a querer mais a tirou do sério. Não tinha percebido que ele já havia acordado e fitava Ana com um sorriso vacilante.
– Bom dia, amor. – Ele bocejou e Ana sorriu. –
– Oi celo. – Disse fracamente. – Não vai trabalhar hoje?
– Não, pensei em ficar aqui em casa contigo. Te incomoda?
Então você não me odeia, pensou Ana.
– Claro, eu adoraria na verdade.
Ana levantou-se e foi tomar um banho, se sentia muito dolorida, principalmente sua intimidade, que ainda não havia parado de sangrar da noite anterior, provavelmente resultante de um corte interno. No banho colocou a mãos delicadamente em seu ventre.
– Ai possível ser humano que está aí, me de uma ajuda no que fazer.
Sentiu-se idiota por ter falado com o nada e riu sozinha. Era um alívio imenso pensar que havia alguém ali e que não estava ao todo sozinha. Enquanto a água do chuveiro caia em suas costas, pensou em seus pais. Eles matariam Luiz sem sombra de dúvidas, mas Marisa tratou de dar um castigo ainda maior para ele.
Nem saberia como encarar Marcelo quando saísse do banho, contudo sabia que uma hora ela tinha que sair. Tomou coragem e quando saiu enrolada na toalha, notou que ele já não estava mais no quarto, suspirou aliviada e ficou feliz por ele ter respeitado a privacidade dela. Tirou a toalha que estava enrolada em seu corpo e se olhou no espelho. Sentia-se horrorosa, estava cheia de hematomas num tom roxo escuro, sem falar nas olheiras que a seguiam por debaixo dos olhos. Lamentou-se ainda e olhou para sua barriga, esperando ver alguma diferença notória em seu corpo, mas não viu nada. Estava vestindo apenas uma calcinha de renda junto com um sutiã quando Marcelo abriu a porta com uma bandeja cheia de comida.
– Oh, Marcelo! – Ela se cobriu rapidamente com a toalha, seu rosto queimava de vergonha. Parecia que ele nunca havia visto nua. – Ora, desculpe.
Ela sentou na cama ainda corada e não teve coragem de encará-lo de volta.
– Ana, queria que tu soubesses que to aqui contigo. Contigo e com nosso filho.
A feiticeira se surpreendeu com as palavras de Marcelo e prontamente o abraçou, deixando derramar mais algumas lágrimas. Ele recebeu seu abraço com gentileza e tentou não chorar junto com a mesma.
– Não me abandona, por favor.
– Eu jamais irei te abandonar, guria.
– É que eu achei que... Bem... Você não ia me querer mais.
– Não diga bobagens, Franco. Sou teu namorado, namorado que mora junto, lembra? – Ele brincou com ela, que riu entre as lágrimas. – Estou aqui com você.
Eles se abraçaram por muito tempo, até Marcelo a forçar comer já que agora alimentava por dois. A respeito da gravidez de Ana nada foi comentado, ele não iria fazer nenhuma pergunta que pudesse a machucar e tentava ao máximo escolher as palavras com ela.
No mais, passaram o dia vendo filmes e comendo besteiras, como se nada tivesse acontecido.
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A Feiticeira
RomanceAna Lucia Franco é uma feiticeira de 22 anos que vive mudando de lugar cada vez que espalha sua magia demasiadamente. Aventureira por si só, fala mais de 15 idiomas e sabe mais sobre cultura do que si mesma. Aos quatorze anos, como é de costume na b...