Capítulo 13

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Estela

Depois de ouvi-lo chorando no banheiro, resolvi não incomodar o Leonardo. Porque mesmo não mencionando nada, era óbvio que ele não queria falar e ouvir sobre a mãe ou o pai. Deixei as coisas acontecerem no tempo dele, o que, a meu ver, seria bom para nós dois.

Naquela noite, ele jantou, assistiu, voltou a ler e passou horas folheando o mesmo livro da capa laranja. Deitada na cama, eu o vi apoiando o pé no chão para gerar impulso e balançar a rede vermelha em que estava deitado. Enquanto isso acontecia, pensei em falar qualquer coisa, perguntar quando era seu aniversário, o que queria ser da vida, de quem gostava ou quem não suportava. Contudo, além de me sentir invasiva, percebi que ele estava concentrado demais na leitura para me dar atenção.

Levantei-me para ligar o ventilador e colocá-lo para girar. Ao voltar para a cama, arrumei o travesseiro, puxei o lençol e me cobri. Em poucos minutos, com o rosto voltado para a parede, cochilei. Mas não demorou muito para que eu despertasse com a voz do Leonardo me chamando.

— O que foi agora? — perguntei, virando-me para o lado contrário.

— Desculpe, achei que tu ainda não tivesse dormindo — disse ele, animado. — É que eu cheguei numa cena do livro e lembrei de ti! Juro que não é por maldade, mas posso te perguntar uma coisa bem pequenininha assim? — gesticulou com os dedos.

— Lá vem ele de novo! Vai... pode mandar. O que vai ser desta bendita vez? — aos bocejos, apoiei o cotovelo sobre o colchão.

— É que assim... quando tu anda na rua, tu meio que fecha a cara pra todo mundo. Preste atenção no meu rosto, tu fica mais ou menos desse jeito, ôh — franziu a testa e manteve os olhos entreabertos —, é como se tu quisesse espantar as pessoas; né, não? Por que faz isso?

— O quê?! — sentei sobre a cama e encolhi as pernas. — Por acaso tá me chamando de rabugenta ou de duas caras? Acha que eu não tenho coragem de te dar uns beliscões, é?

— Nem vem com essa, porque eu não falei desse jeito aí. Tô tentando dizer é que, aqui na casa, tu é muito engraçada, fala umas coisas assim que me faz ter vontade de rir sem parar. Mas quando tu sai parece que esse teu lado some do nada.

— Sério que essa é a tua análise depois de passar um dia inteiro comigo? Fui de rabugenta à palhaça em questão de segundos — estalei os dedos. — Muito bem, senhor Leonardo.

— Ficou chateada? Perdão, é que...

— Eu tô brincando, menino! — interrompi-o. — Tu não é a primeira pessoa que me diz isso. E talvez não seja a última, assim espero.

— Ainda bem, porque achei mesmo que eu ia levar uns beliscões.

— Olha, se eu fosse tu, não contava isso como vantagem, não. Deixa chegar o começo do outro mês pra tu ver como eu fico histérica.

— É, posso até imaginar. E é por isso que vou calar a minha boca e ir dormir.

Naquele instante, ele se levantou da rede, colocou o livro sobre a cômoda e, em seguida, deslocou-se em direção ao interruptor para desligar a luz do quarto. Assim que o apertou e tudo escureceu, eu disse:

— Acende de novo! Pode deixar acesa.

Ao acendeu a luz, ele se encostou na parede e retrucou:

— Eu nem acredito que tu ainda tem medo do escuro!

— Não é bem isso — comentei, respirando fundo e olhando para o teto. — É que desde que voltei sem a minha mãe, eu me acostumei a deixar a luz acesa pra não me sentir tão sozinha. Preciso abandonar esse hábito aos poucos, porque não dá pra mudar do dia pra noite.

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