Capítulo 21

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Estela

Faltavam poucos dias para o dia das mães. Como o esperado, o movimento na floricultura havia crescido. E, graças aos céus, estávamos dando conta de atender os numerosos pedidos. Devido à correria daquela semana, fiz uma cópia da chave de casa e entreguei ao Leonardo, para que não precisasse me esperar quando saísse da escola, já que eu não tinha horário fixo para chegar.

Numa das noites em que voltei depois das sete, vi o chihuahua do meu vizinho do lado de fora. E por mais que quisesse ignorá-lo, não consegui, porque no instante em que subi com a moto na calçada, ele se aproximou de mim e, rodeando-me, encostou seu focinho gelado na minha perna — o que me paralisou durante alguns segundos

Embora não tenha latido comigo, temi que ele me mordesse. Porém, o chihuahua se afastou, olhou para mim, e, abanando o rabo, correu em direção ao gato rajado que estava na calçada do outro lado da rua.

Aliviada, abri a porta e, de repente, fiquei desacreditada com o que vi na sala de estar. Melhor dizendo, com o que não vi. Procurei a bagunça que sempre prometia arrumar, e não a encontrei.

Assim que Leonardo surgiu no corredor, perguntei-lhe:

— Cadê todas aqueles trecos que tavam aqui?

— Pedi algumas caixas lá no supermercado e separei as coisas que tavam espalhadas... Mas não se preocupa, tá? Não joguei nada fora, eu juro. Só deixei aí a estante com os livros. Então, assim, caso tu não tenha gostado, posso recolocar tudo como tava e...

— Não, não. Nem precisava se preocupar. Faz um tempão que pretendia retirar aqueles bagulhos daqui. Só tenho que te agradecer por ter feito isso por mim.

— Ah, nem foi nada. Sei que tu chega muito cansada todos os dias.

— Olha só isso — caminhei pela sala de braços abertos, rodeando o local onde a bagunça costumava ficar. — Eu nem lembrava que isso aqui era tão espaçoso.

— Podemos até fazer uma festa aqui.

Naquele instante, segui rumo ao meu irmão, parei a alguns passos de distância dele e voltei a falar:

— Eu até poderia te dar uma abraço, agora, mas tu tá banhado, todo penteadinho, e eu tô podre... Não tenho nem como negar, tu é a melhor coisa que me aconteceu nos últimos tempos.

De um jeito tímido, Leonardo veio até mim e me abraçou tão forte que caminhei para trás.

— É, acho que isso é uma boa resposta — comentei.

Mais tarde, durante o jantar, ele me contou que Janete o havia procurado, e que tinham conversado na saída da escola. Curiosa para saber o resultado do reencontro deles, eu perguntei:

— E como foi? O que ela disse pra ti?

— Falou que tá com saudades, mas aí, do nada, ela começou a lamentar que se sente abandonada, porque o pai ameaçou ir embora de novo. Ela me disse que ele não aparece em casa há uns três dias, e ainda me perguntou se eu não sei de alguma coisa. Como é que eu vou saber?

— Desculpa, mas tenho que ser sincera contigo. Não consigo definir se isso é bom ou ruim. Não pela tua mãe, mas pela ausência dele. Quem sabe assim ela perceba que ele não é o ser mais maravilhoso do universo.

— A pior parte é que eu também não consigo definir isso. E, de certa forma, eu me sinto culpado por isso porque não queria vê-la desse jeito tão descuidada e dependente. Na real, acho bem triste.

— E tu falou com ela sobre a apresentação na sexta?

— Aham — abaixou a cabeça e bateu os dedos contra a mesa —, ela recebeu o ingresso, mas não me garantiu que iria, porque não é o tipo de coisa que ela quer que eu faça.

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